sábado, 31 de outubro de 2015

O DRAMA DA INDIVIDUAÇÃO

Tornar-se livre é individuar-se. Mas quanto mais nos fazemos conscientes da pluralidade de coisas que somos, menos nos interessamos por aquilo que para os outros goza de importância no acontecer coletivo da condição humana.

Conquistar a si mesmo e viver dilacerado pela própria consciência, perceber o não significado das coisas, a opacidade  e banalidade dos valores e tradições que inspiram o  rebanho humano, nos custa  a ilusão da felicidade vindoura. Diante de nós o desafio da vertigem, da avalanche e do abismo esclarecem o incerto caminho do indivíduo.


Pois, para o pleno indivíduo, o agir torna-se um fardo. Ele não é inspirado por nenhuma grande paixão ou convicção.  O horror diante dos olhos é sua única e insensata motivação. Isso o torna impróprio para ação, para o acontecer em um mundo que já perdeu todas as suas justificativas, toda razão de ser. Cabe-lhe a sina do herói trágico.

quarta-feira, 28 de outubro de 2015

DESENCANTAMENTO

A vida acontece no  avesso
Da cotidiana existência
Individualmente sonhada
Nos desvãos e devassidões  do acontecer coletivo.
Ela é a vertigem do pensamento cego
Que se perde no labirinto dos afetos,
Das pulsões,
Como irracional necessidade
De  escrever na carne  a marca do rosto,
A urgência dos objetos
No vazio do sujeito.
Fomos condenados a nós mesmos,
A avalanche  das paixões  transfiguradas
Em fantasias infantis de sociedade.

Nos tornamos mais pesados que o céu...

segunda-feira, 26 de outubro de 2015

NÃO SOU RESPONSÁVEL

Não sou responsável pelo mundo em que vivo.
Não sou responsável se quer pelo meu pensamento,
pois ele me acontece expontaneamente
tanto quanto o bater  do meu coração.
Por isso não vivo de erros ou de culpas.
Sou apenas o resultado de um complexo conjunto de fatos.
Não passo de um enigma sem solução.
Nada tenho a dizer de mim mesmo
que não seja o dizer de um outro no espelho.
Aprendi a viver sem rumo
desconstruindo mundos,
desdizendo a mim mesmo.
Não sou responsável  por nada.
os da morte


como senhora do tempo.

quinta-feira, 22 de outubro de 2015

STAR TREK

A terra não tem quatro cantos,
é plena esfera
que  nos inventa
na alternância dos dias e noites.

É um grão de areia
perdido no universo.
Qualquer quase nada
onde nos cabe tudo.

A terra talvez
um dia
se faça nosso passado
no navegar o universo
na aventura das estrelas.

SOBRE A COINCIDÊNCIA DO PENSAMENTO COM O CORPO

Não é raro ficar dias tentando escrever sobre alguma coisa da exata maneira que acredito que ela deveria ser escrita. Entretanto, não faço a mínima ideia, nestas ocasiões do que isso exatamente significa.

É como se houvesse na palavra um limite para personificar certas ideias e experiências realçadas por tonalidades afetivas e emocionais. Por isso costumo dizer que as coisas mais importantes não cabem em palavras, estão condenadas ao silêncio e só podem ser percebidas no superficial dos gestos e expressões corporais.

Quando pensamos com o corpo, quando sentimos profundamente determinadas ideias como imagens, não conseguimos satisfatoriamente converte-las em palavras, pois elas se tornam concretas, físicas e irracionais.   



A CONDIÇÃO HUMANA DA REALIDADE

A realidade  existe apenas enquanto representação de nossa própria condição humana. Como não podemos perceber o mundo de fora de nossas possibilidades cognitivas, então a realidade, que é a dialética do eu e do mundo, é apenas aquilo que nos é sensualmente e intelectualmente  legível.

A realidade não está condicionada a nossa vontade, mas a nossa própria vontade é parte dela. Mesmo quando nossa engenhosa imaginação elabora imagens e fantasias irracionais e que parecem distantes da realidade, ela ainda é a matéria prima de tais fantasias.

A realidade não existe em si ou para si, mas através de nossa percepção. Ela só é na medida em que existimos e a tornamos  real. Desta forma, tudo aquilo que sabemos e potencialmente podemos saber já está prefigurado por nossas possibilidades cognitivas. Assim, o humano é, de certa forma, a medida de tudo aquilo que pode ser conhecido ou criado.

Não existe uma meta consciência fora da percepção humana capaz de eclipsar sua apreensão do mundo, um absoluto cognitivo que ofereça uma alternativa a percepção humana, da mesma forma as coisas não existem em si mesmas, não apresentam uma “natureza”.


Somos aquilo que concebemos e pensamos, e a realidade é um ato humano que acontece através da linguagem.

quarta-feira, 21 de outubro de 2015

EXISTÊNCIA E DEVIR

Não sou mais o mesmo de antigamente.
Mesmo sem nunca  ter sido  quem eu era
nos atos e pensamentos  incertos
que me definem em cada  momento.

Sou indeterminado, uma abstração,
que se reinventa ao sabor dos fatos.

Não me prendam a identidades,
sentimentos ou escolhas.

Sou aquele que nunca se sabe
entre as náufragas certezas
da simples existência.


Não estou aberto a diálogos.

BREVE DIVERTIMENTO FILOSÓFICO SOBRE O TEMA DA AUTO CONSCIÊNCIA

As pessoas são sempre o centro de suas próprias vidas na medida em que a realidade só existe enquanto consciência de algo fora de nós. Em contrapartida, não é obvio o que significaria o oposto “dentro de nós”. Pois o que somos é pura abstração. A auto consciência é um dado, mais do que um conceito. Não há como julga-la de fora dela mesma. Logo, somos em nossa consciência e ela é a medida de todas as coisas concebidas.

Pode-se dizer, entretanto, que a própria autoconsciência, em suas atuais configurações,  é formatada pelo mundo exterior através da cultura. Logo, a própria auto consciência é uma construção social.  Tal hipótese não exclui a primeira. Apenas a complementa. Pois a auto consciência é, paradoxalmente, as duas coisas. A auto consciência se define como consciência de alguma coisa estabelecida na dialética com o mundo. Ela é auto representação que se forma como consciência de alguma coisa que ela não é, que a transcende e, ao mesmo tempo, engendra.

Assim, se tradicionalmente, a questão da auto consciência remete a ideia de identidade e de Ser, hoje tais grandezas já não exercem grande importância na definição da questão. Pois o Ser e sua metafísica já não são entidades do pensamento, não dizem quem somos enquanto abstração coletiva.


terça-feira, 20 de outubro de 2015

NOSTALGIA DA CASA ANTIGA


Nunca mais voltei a casa em que cresci.
Sei que hoje ela abriga outras vidas.
Já não é a mesma
E não exibe as marcas dos meus dias de pequeno infante.
A casa em que cresci  mora apenas  na memória.
Não sinto  seu teto, suas paredes ou fundações.
Tudo que dela restou foi o vazio de uma opaca lembrança.
É como se nunca tivesse existido,
Como se tudo aquilo que um dia foi tão vivo
Não tivesse mais realidade do que  um sonho bom que se desfaz com a aurora.
Queria poder deitar de novo em meu velho quarto,
Guardar a vida em um abraço e voltar nos anos.
Fingir que o tempo não importa

E ser novamente eu nos jardins da casa antiga.

AS VIRTUDES DA SOLIDÃO

“Não fui, na infância, como os outros
e nunca vi como os outros viam.
Minhas paixões eu não podia
tirar das fontes igual à deles;
e era outro o canto, que acordava
o coração de alegria
Tudo o que amei, amei sozinho.”


A solidão aconteceu em mim como um estado de descontínuos íntimos e subjetivos. Foi como me tornar para mim mesmo um outro quando já não sabia de mais ninguém. Através dela a vida se tornou só minha, um desentender dos sentidos e dos pensamentos, onde pouco me importava o resto do mundo.

Há grande alegria em viver sem a opinião dos outros, sem diferenças e discordâncias.

A solidão é o único caminho possível para a embriaguez da paz com sentimento das coisas vividas.

Aconselho a todos o bom remédio da solidão contra as inevitáveis dores do mundo.


NOTA SOBRE A NOSSA CONDIÇÃO PÓS MODERNA

A condição pós moderna ( ou o tempo de agora) é definido pelo desencanto e falência das grandes narrativas, pelo esgotamento do próprio real e pelo  advento da hiper-realidade. A mentira e a verdade se abraçam agora em franca promiscuidade, enquanto enterramos de vez a ilusão da subjetividade na orgia dos objetos.

Quem e o que ainda é digno de confiança atualmente? 

domingo, 18 de outubro de 2015

OBJETIVIDADE

Vivemos hoje de alguns passados,
De alguns erros e poucas esperanças.
Não continuamos o sonho
Do velho prometeu.
Ficamos pelo caminho
Observando desejos quebrados no chão.
Muito cedo desistimos das sedutoras ilusões
De formulas simples de felicidade.
Temos o suficiente para viver
E isto era tudo que imporá agora.


sábado, 17 de outubro de 2015

ESCREVA

Quanto  custa o delicado exercício de alguns versos?
Quantos silêncios devem ser escritos,
Quantos impasses e quimeras devem ser rasgadas
em  palavras?

Escreva sob os abismos dos dias
E sobre as maravilhas do absurdo.
Traga uma bebida.
Não de ouvido aos lugares comuns
Do simples dia a dia.

Escreva como se fosse seu último suspiro.
Prenda neste instante todas as abstrações de eternidade
No branco da folha...

Escreva versos livres e sujos como se não houvesse amanhã.



sexta-feira, 16 de outubro de 2015

O PENSADOR SOLITÁRIO

Pensar é uma atividade solitária e ingrata.
Mas que prazer em ser só
Abraçado as brumas densas da imaginação criativa!
Enquanto os outros apenas sofrem o mundo
Sem maiores preocupações,
Você o reinventa como gramática.

Deixe que os outros sigam juntos.
Contempla teu universo intimo
Na combinação infinita de palavras
No corpo dos textos

Que te inspiram o mais radical da vida.
Jamais espere estar entre iguais.

quinta-feira, 15 de outubro de 2015

CONTRA A TEORIA LIQUIDA DE BAUMANN

O sucesso social ou o reconhecimento do individuo pela irracionalidade do coletivo, pressupõe sua conversão em símbolo, em imagem transpessoal que se consagra como na ilusão do "grande indivíduo", da figura do lider. Hegel nada sabia sobre isso em seu idealismo vazio e aposta na realização da História como vitória ilustrada de uma racionalidade abstrata e absoluta.

Mas estamos aqui falando de algo bem simples: A personalidade é uma mascara, nos tornamos aquilo que somos nos posicionando contra e através dos outros. Os laços e vínculos societários se enfraquecem na exata medida em que tornar-se um individuo é mau visto e, ao mesmo tempo, a única meta do existir diferenciado que nos define enquanto representantes desta triste espécie animal que auto proclama humana.


Pessoalmente estou farto de humanidades e dos lugares comuns de mim mesmo> Na mesma medida em que repudio tudo que é liquido, tenho aversão aos crédulos do coletivismo e do social como compartilhamento de um mundo comum que já não mais existe.

O AUTOR, O LEITOR E O LIVRO

De repente me dei conta de que o  autor que estou lendo já esta morto  a mais de um século. Aquele livro é apenas a sombra de alguém que nunca conheci, que nunca bebeu comigo, mas está ali, dentro dos meus pensamentos e enfeitando a minha vida miserável.
Aquele livro...
Aquele autor....
Ou, simplesmente, o cara morto que nunca me imaginou como leitor.
Ao qual não posso dar nada, nem dizer nada.
É estranho como uma pessoa pode ser reduzida a experiência de alguns livros legados ao vento do tempo que nos ultrapassa. Esta é a única eternidade possível.... A eternidade não é lá mesmo grande coisa.
Eu ainda podia falar, comer, beber e reclamar daquele livro com alguém, falar do seu autor como se tivesse bebido com ele ontem  durante a madrugada. Mas aquele autor morto, mesmo assim, estava mais vivo do que eu do ponto de vista da humanidade. E isso não ffazia mais qualquer diferença para ele, pois, afinal, estava morto.

Não. Isso não me incomoda. Talvez fosse melhor ser aquele  autor morto do que este leitor vivo.

quarta-feira, 14 de outubro de 2015

NATALÍCIO

Neste dia dedicado ao passar dos anos
contemplo o passado espalhado
sobre os vazios agora preenchidos
por saudades e  lembranças.
É no ontem onde existo
contra o futuro.
 Nele resisto ao presente
que me prende ao perder-se
das coisas
consumindo minha queda.
Sou os lugares onde cresci,
as pessoas que vivi
e todos os sonhos que  se perderam
ainda moços no vento.
Neste dia dedicado ao passar dos anos,
O tempo é um acoite
e apenas aguardo o silencio

e a noite.

terça-feira, 13 de outubro de 2015

ESCREVER É UM ABUSO

Sei que o que vou dizer já foi dito , de diversas outras maneiras, por escritores melhores do que eu, mas não custa nada repetir esta premissa obvia da arte de escrevinhar:

Quando for rabiscar alguma coisa, deixe de lado suas emoções. Ninguém escreve nada de bom inspirado por dilemas existenciais, bons sentimentos ou certezas eleitas. Escreva como se fosse um outro a observar a si mesmo  reinventando sua própria vida através da imaginação.

Escrever é uma arte estranha. Exige sim um certo domínio da gramática, mas acima de tudo, o que importa é ter uma imaginação que transborda, uma necessidade de não ser e se refazer  através  da palavra, em simples exercício de individuação e isolamento.

Não é aquilo que você diz que importa, mas como você diz e se faz no extraterritorial da gramática viva e subversiva da sua solidão em movimento.  No abstrato corpo de uma prosa ou de um verso você inventa um deslocamento, um metaespelho de abstrações do cotidiano.

Escrever é fugir de si mesmo através de imagens que te comunicam ao outro.


Escrever não é um discurso, é um abuso.

DESCONSTRUINDO A SI MESMO

Ainda estamos em busca de nós mesmos.
Passamos a vida toda esperando 
pela realização deste encontro.

Apenas tarde demais percebemos
o desacordo
entre quem nos tornamos
e o que somos.

O Ser não existe.
De todas as maneiras,
não somos.


segunda-feira, 12 de outubro de 2015

SEJA CURIOSO

Encontre  vida em  sua perene  existência
Onde sopram mais fortes
Os ventos da sua vontade.

Não se detenha frente aos lugares comuns
Do seu tempo ou da sociedade.
Não deixe que lhe imponham os Hades.

Desafie o improvável,  as desrazões dos fatos.
Invente sempre!

Seja criativo,
Criança sombria e faminta

A desbravar escuridões e desfazer metafísicas.

A VONTADE DE SABER

Nunca foi um problema para mim estar errado sobre alguma coisa. Na verdade na maior parte das vezes eu lamentava estar certo.  Um pouco de ilusão faz falta para que a vida seja mais suportável.

Não sou movido unicamente pelos desejos e pelas vontades que me possuem no nível mais imediato e sensual da existência. O que mais me inspira é a doentia necessidade de lucidez, de saber mesmo aquilo tudo que  sempre irá escapar ao meu conhecimento.


O conhecido será sempre muito pouco pra mim. O desejo de saber consome quase toda  minha vontade. É através dela que existo.

O JOGO DO CONHECIMENTO

A verdade não é uma construção dada, não se apresenta como algo imediatamente evidende, mas pressupõe a analise cuidada dos detalhes. E isso se aplica aos discursos e realidades humanas , antes de tudo.

Não de seve tomar como aceitável qualquer discurso, qualquer precipitado arranjo do pensamento que sempre esconde intencionalidades que em muitos casos oscilam entre a ingenuidade e a manipulação pura e simples.

As pessoas nunca são sinceras. Daí a necessidade de bem analisar deus discursos e desvendar suas intencionalidades.


O conhecimento é um jogo, não uma virtude.

EM NOME DA LIBERDADE

Fui apenas um cara solitário
Que por anos a fio
Marchou em zigue zague
Em busca de qualquer sonho
Requentado de liberdade.
Fui destes que nunca cresceram o suficiente
Para perder a esperança.
Hoje ainda persigo, mesmo vencido,
O antigo delírio de um dia de infância.
Seria mais do que um rosto
E menos do que os outros.
Seria eu mesmo.
Até hoje não sei direito
O significado disso.
Mas foi o que me levou a este vazio
Onde agora habito.


domingo, 11 de outubro de 2015

BALZAC E O CÓDIGO DOS HOMENS HONESTOS: UMA BREVE INTRODUÇÃO AO EGOÍSMO

O Código dos Homens Honestos ou a arte de não se deixar enganar pelos larápios é uma obra de juventude de Balzac escrita  em 1825.
Trata-se aqui de um manual de sobrevivência para a França oitocentista e frente a industriosidade da extorsão que define o cotidiano e as relações humanas em uma sociedade em que o bolso se torna a medida de todas as coisas.
Uma determinada passagem desta obra me parece essencial a sua apresentação:

“Um homem honesto deve estar sempre atento e em guarda, pois os camaleões, cujas cores e formas tentaremos captar, apresentam-se sob seu melhor aspecto. São amigos, parente e até-  o que é sagrado em París-conhecidos. Atores deste pequeno drama, golpeiam diariamente no coração, comovem a sensibilidade, os sentidos, deixam o amor próprio imerso em cruel perplexidade, e sempre acabam por vencer as mais heroicas resoluções.
Para proteger-se desta chuva de pedidos legítimos , lembre-se sempre de que o egoísmo tornou-se uma paixão, uma virtude nos homens; que poucas almas dele estão isentas, e que pode apostar cem contra um que vocês são vítimas, vocês e seus bolsos, dessas belas invenções, dessas efusões de generosidade, desses complôs honestos a que somos inclinados a pagar tributo.
Lembre-se sempre desta frase incisiva de um pensador:’ Meu amigo, não há amigos’”

 Honore de Balzac. Código dos Homens Honestos ou a arte de não se deixar enganar por larápios. Tradução: Lea Novaes 1º Ed. RJ: Nova Fronteira, 2005, p. 80-81

A sociedade institucionaliza o roubo de forma sutil através da micro economia de nossas relações pessoais e com instituições que ao oferecer qualquer serviço nos leva um pouco mais do que o devido pelo mero prazer do lucro fácil.
Este manual de Balzac ainda diz muito sobre a nossa sociedade e  a modernidade tardia em seu cotidiano mais sutil. Por isso é preciso ao indivíduo ocupar-se sempre do exercício do seu egoísmo.


sábado, 10 de outubro de 2015

PENSANDO O VIVIDO


O fluxo do vivido me conduz em pensamentos
Ao acontecer das coisas.
Minha consciência é a abstrata fronteira
Onde tudo se encontra
E a realidade nasce
Da articulação da simultaneidade
Das coisas.
Tudo é um grande mosaico,
Um labirinto
Que me embriaga os sentidos.
Existir é como um estado instável

De constante agonia.

quinta-feira, 8 de outubro de 2015

O INTEIRAMENTE OUTRO DE MIM

Enterrado em mim mesmo
Sonhei a vida que seria
Caso eu fosse aquele
Acho que sou
No virtual dos meus silêncios.
Fora do teatro dos atos cotidianos
Sou um outro qualquer
Que a existência deixou de lado.
Acredite:
Não sou eu quem escreve estas linhas.
Estou em outra parte dos pensamentos
Que me definem,
Respiro em palavras que nunca foram escritas
Ou ditas,
Em coisas que ainda não vivi ou tive.
Não se deixem enganar.

Eu sou outro....

terça-feira, 6 de outubro de 2015

A MISÉRIA DOS DICIONÁRIOS

Algumas pessoas são tão ingênuas que acham que o significado das palavras esgotam-se nos verbetes de um dicionário. Carecem de critica e imaginação e acham que o nome coincide com as coisas. Mas é atualmente impossível  hoje em dia confiar inteiramente em qualquer definição das coisas. Definir tornou-se um ato arbitrário  que muitas  vezes esconde a imprecisão e pluralidade de significações possíveis.

As palavras enganam e muitas vezes uma coisa só pode ser entendida por aquilo que ela não é. Podemos dizer que sabemos muito bem o que é uma cidade. Mas pode-se entender uma cidade sem também entender o que são pessoas, sociedades,  e que a palavra cidade em determinados contextos históricos tinha outros significados e vivencias que se perderam para nós?  Além disso, uma metrópole ainda é uma cidade? Cidade é mais do que um território político administrativo, embora tal definição nos pareça demasiadamente aceitável. 

O MAR


Fiquei ali sozinho
Contemplando o mar
Por um longo tempo.
As ondas me diziam agonia
E me apavorava aquela imensidão
Que definia o horizonte.
Me sentia apenas um grão de areia.
Não sou capitão de navio.
Sou destes que lutam sem armas.
Para mim o mar era feio.
Apenas isso...

segunda-feira, 5 de outubro de 2015

SOBRE O FUTURO DA ARTE DE ESCREVER

As vezes fico me questionando se ainda cabe escrever. Quem escreve quer comunicar qualquer coisa. Mas eu só escrevo por necessidade, para me sentir alguma coisa e ainda sentir alguma coisa.  Não escrevo para agradar ninguém. Não espero que as pessoas me entendam. Escrevo apenas porque é muito chato falar sozinho.  Mas tenho medo de não ser o único. Talvez venha por ai uma geração inteira de novos escritores vazios escrevendo a ermo por mera questão de sobrevivência. Escrever pode  estar se tornando uma forma de se suportar a existência. Escrever pode ser a única coisa que ainda nos resta. Não há no mundo leitores suficientes para aguentar ou saber de tantos escritores. Então desista de qualquer sucesso e apenas escreva.... antes que seja tarde.

PARA COMPREENDER A NOVA BARBÁRIE

Um dos feitos culturais mais impactantes da modernidade sob o cotidiano pós revolução industrial, foi tornar as pessoas cada vez mais invisíveis umas as outras. Já não nos percebemos como parte das vivencias coletivas acumuladas e compartilhadas através daqueles que convivemos. Pouco sabemos, por exemplo, sobre o conjunto de experiências e realidades que configuraram ao menos duas gerações  das famílias as quais pertencemos. E não digo isso vislumbrando o resgate de qualquer ideal caduco de comunidade ou pertencimento de mundo fundado pela vivencias de tradições abstratas. Trata-se de outra coisa.  Falo de termos plena consciência do quanto a contemporaneidade nos distancia cada vez mais vertiginosamente do passado, o quanto a experiência de poucas décadas põe a perder hábitos e protocolos de existência. O mundo se tornou um acumular  de ruínas que se multiplicam mais rapidamente do que nossa capacidade de apreender a realidade.

Do mesmo modo, as ruas e os lugares que frequentamos já não detém vestígios ou referências realmente instáveis. Tudo se perde, inclusive as marcas que deixamos em nos objetos, em nossas casas.  O individuo liberta-se do peso do processo histórico e da própria ideia teleológica de que “tudo faz sentido”.  Ao mesmo tempo já não conta mais com a promessa oitocentista  da construção de um universo privado, consagrado a sua subjetividade e longe do olhar dos outros.


Vivemos, para ser breve e nada conclusivo, tempos de decadência de toda consciência diferenciada do coletivo.  Apenas seguimos com a avalanche. 

INDIVIDUALIDADE E ESTÉTICA


A felicidade é um veneno ao qual sou imune.

Isso me garante aptidão para buscar sempre a realidade e não cair na armadilha de nenhuma ilusão. Tenho por objetivo alguma concepção estética de vida onde sejam transpostas as fronteiras entre arte e existência no mínimo cotidiano do acontecer do meu eu.

Não me importo muito com o destino do mundo. Minha matéria prima é o raso da realidade e as possibilidades afetivas  dos atos mais pragmáticos.

Através dos artificialismos da cultura estamos sempre buscando nos evadir de nossa pequena condição humana, acrescentar significados ao raso acontecer concreto que possam tornar nossas vidas individuais  relativamente significativas.

Estou cada vez mais convencido de que é apenas isso que importa.

domingo, 4 de outubro de 2015

AS AVENTURAS DO PENSAMENTO

Era senhor de minhas dúvidas
E vítima de minhas certezas.
Tentava fugir
A qualquer armadilha da fé.
Não tinha tempo para conformismos,
Seguranças   ou fáceis caminhos
Que não me levariam a nada além
Do comodismo de qualquer convicção.
Estava disposto a estar sempre perdido
Em meus labirintos.
O que eu buscava ainda não tinha nome

Nem havia sido inventado.

sexta-feira, 2 de outubro de 2015

A LITERATURA E A DESCONTRUÇÃO DO REAL


Uma das virtudes da literatura contemporânea  é a possibilidade de escrever contra a realidade, a partir justamente daquilo que nos incomoda nela.  Tendemos a ser hoje em dia antirrealistas e levar as ultimas consequências a ideia de  ficção.

Já não se trata apenas de inventar histórias e personagens. Nossa matéria prima mais desafiadora é o próprio real enquanto conceito.  Trata-se de perseguir uma intuição: Há algo de muito errado no jeito como o mundo e as pessoas se comportam e socialmente inventamos  a realidade. Interpretações possíveis a parte, o fato é que a fronteira entre o real e a fantasia tornam-se duvidosas.


Talvez o mundo só exista como representação e a realidade seja apenas uma modalidade defeituosa de ficção.