Todo escritor
pressupõe no ato da escrita um abstrato leitor universal, um fantasma ao qual
sua narrativa é destinada. É esta entidade virtual que confere valor ao seu
enunciado. Ao mesmo tempo, todo escritor é leitor de si mesmo, pois idealiza,
inventa-se como persona, convertendo-se em parte de sua ficção, do seu exercício narrativo.
Com o advento
do modernismo, a escrita tornou-se uma cartografia de si, uma apresentação do
existir que se faz a margem das normativas cognitivas e epistemes de uma época.
A linguagem apresenta-se como exercício selvagem de alienação do eu de si mesmo
e do que nos é convencionalmente imposto como regra, como princípio de
realidade.
A liberdade de
escrever é um encontro sempre frustrado com o ser da linguagem, com sua
incerteza, que tem como signo de experiência o vazio da folha em branco. é
contra a biblioteca, a livraria e a própria infinitude dos livros possíveis,
que o exercício da escrita se insurge sempre de novo, a margem de todo saber formal.
Escrever é um
ato selvagem que transcende o corpo do texto. A própria linguagem é sua matéria
prima. É o desespero de escapar a armadilha do previsível das palavras que move
o punho, que inventa o dizer sempre a deriva, sempre em busca, de qualquer
experiência sem nome e sem palavra.