sexta-feira, 16 de junho de 2017

FILOSOFIA DO NÃO SER

Desde Platão somos assombrados pela metafísica da verdade e atormentados pelo fantasma do bem e do justo. Somos obcecados pelo significado, pelo imperativo do Ser. Resistimos ao não sentido, a consciência da nadificação, do paradoxo da simples indeterminação de nosso estar presente no aqui e agora, quando somos apenas silêncio. Nenhum ideal ausente sustenta nossa ilusão presente. Apenas não somos através de tudo aquilo nos afirma a existência e sentimento de mundo.

quarta-feira, 14 de junho de 2017

SOBRE A COMPLEXIDADE DO TEMPO PRESENTE

O conceito de tempo presente sempre me pareceu uma questão complexa. Afinal, ele comporta a coincidência (simultaneidade) de formatações e referências culturais diversas, camadas de  significações e referências que extrapolam o imediatismo do agora e o tornam contemporâneo de conteúdos simbólicos e psicológicos  que atualizam passados e, em alguns casos, insinuam futuros. Há uma sincronicidade de tempos e vivencias no mero acontecer do presente que transcende a linearidade cronológica. Fato que não deve surpreender ninguém dada a pluralidade de condições culturais que coabitam em uma mesma época.

Essencialmente, o tempo presente é devir e movimento de consciência. Como tal ele é ação e não um atributo abstrato dos fatos . Ele não  se identifica com um conjunto de formatações culturais  efêmeras e “presentistas” que em hipótese definiriam a contemporaneidade como ethos de uma determinada época. Afinal, ele também atualiza e dialoga com o passado.

Na medida em que as tecnologias digitais engendram uma nova experiência de mundo e sensibilidades a própria contemporaneidade passou a envelhecer constantemente e freneticamente apontar para versões mais complexas de si mesma.  O contemporâneo tornou-se indeterminado, praticamente um estar em movimento, deslocando de modo agudo nossos enraizamento em identidades e padrões de experiência cotidiana de mundo e existência.  

segunda-feira, 12 de junho de 2017

DESLOCAMENTO EXISTENCIAL

Sonhava com a transparência imanente de um eterno presente,
Apostava no ato perpétuo de se saber através do espelho
Contra todos os limites da realidade.
Queria confundir-se com seu próprio reflexo
Até não saber mais de si mesmo com precisão.
Precisava esvaziar-se de suas certezas e pensamentos,
Adentrar o escuro de suas duvidas
E o abismo de seus limites.
Vivia a perplexidade de saber muito pouco sobre si mesmo
E se afogava na ansiedade de não se reconhecer
Nas paisagens de sua própria vida.
Não queria mais não ser naquele rosto  que demasiadamente era.

     

DISCIPLINA E UTOPIA

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A  norma como princípio de uma sociedade disciplinar  estabelece a normalidade e a ordem como meta de instituição de psiquismos. Busca a indiferença a qualquer autonomia comportamental, a qualquer vestígio de individuação  ou vontade de potencia.

Gostamos de enunciados em forma de slogans, de meta narrativas totalizantes  e apostas vazias em qualquer forma ideal de existência projetada em algum futuro hipotético. Recusamos a todo custo o reconhecimento das contradições estruturais do nosso modo de construir a realidade a partir de imperativos morais e fundamentalismos ideológicos.


Aceitamos um mundo no qual não nos reconhecemos  por que nos tornamos sua própria sombra.

JAQUES DERRIDA E A PRESENÇA DO PRESENTE

Em uma entrevista intitulada “Outrem é secreto porque é outro”, concedida a Antoine Spire, publicada em  2000 por  Le Monde de L’ education e reunida a coletânea Papel Maquina, Jaques Derrida fala sobre a influencia de Hussel em seu pensamento e nos oferece uma reflexão bastante interessante sobre o tempo:

“ Os grandes textos de Husserl sobre o tempo atribuem uma forma absolutamente privilegiada  ao que se chama de ‘presente vivo’. Este é o sentido, o bom senso mesmo no que aparentemente tem de mais irrefutável : a forma original da experiência é a apresentação do presente; não deixamos nunca o presente, que nunca se deixa,  que nunca deixa nada de vivo. A ciência fenomenológica absoluta,  a autoridade inegável do agora no presente vivo, é justamente aquilo que tematizaram, com estilos e segundo estratégias diferentes, todos os grandes questionamentos  deste tempo, particularmente o de Heidegger ou o de Lévinas.
Num gesto diferente, com outra visada, o que procurei elaborar como nome de rastro {trace}( a saber, uma experiência da diferença temporal de um passado sem presente passado ou de um por-vir que não seja um futuro presente)é também uma desconstrução sem crítica, da evidência absoluta e simples do presente vivo, da consciência como presente vivo, da forma originária (Urform) do tempo que se chama de presente vivo ( lebendige Gegenwart) ou de tudo que pressupõe a presença do presente.”

Jaques Derrida. Papel Maquina. SP: Estação Liberdade, 2004, p. 338-339

O primado de um tempo do agora que é pura imanência e devir é o que nos define a vida. Não o passado e o futuro como momentos distintos de um tempo virtual  multifacetado e aberto as urgências do presente. Este agora, entretanto, não é dado, não é o imediato em seu estado bruto, mas é uma imersão da consciência em seu próprio acontecer. Assim, o presente vivo, me servindo   desta intuição de Derrida,  se inventa nesta tensão entre passado e futuro  na consciência do agora.

A leitura que Derrida faz da  herança  de Husserl é bastante peculiar. Não me ocuparei dela aqui. Mas é provocante a sua proposta de uma “presença do presente” de inspiração fenomenológica. Afinal, o que é vivo através do presente? Quais os limites do próprio presente?   


A CRISE DA IMAGINAÇÃO

Há hoje em dia um estreitamento do espaço do pensável é uma atrofia do dizivel. Pode-se mesmo diagnosticar uma crise da imaginação.

Somos incapazes de restituir o sentido de nossas representações coletivas e meta narrativas. Ao mesmo tempo, entretanto, aqueles enunciados que buscam uma transmutação de valores, não dão conta da consideração cuidadosa do imediato, do efêmero cotidiano em devir, matriz de qualquer ressemantizacao possível do existir.

Para a maioria, a ideia de uma subjetividade desarticulada, de uma filosofia da vertigem, é inadmissível, pois ainda se iludem com o controle e domesticação de nossa economia simbólica, ainda se prendem a norma como princípio do significado. Felizmente, apesar de tudo, ainda escutamos os ecos desconstrucionista do dadaismo através das últimas décadas....

quarta-feira, 7 de junho de 2017

POEMA ANTI PARNASIANO

Jamais faria um soneto parnasiano para dizer minha vida,
A arte pela arte não diz a poesia,
Não sabe a vida convulsa da palavra embriagada
Que se recusa como retorica.

Palavras explodem o sentido
E acordam imagens que ofuscam o sol
E inauguram o onírico e a escuridão.


A poesia é o dizer do indizível.

PANACÉIA VIRTUAL

 Na atual sociedade de consumo somos induzidos a  buscar uma felicidade quase publicitaria definida pelos mimos das novas tecnologias digitais. Tudo se converte em acontecer simbólico, imagético, através da tele-vida oferecida pelos  celulares, jogos eletrônicos e  outros paraísos artificias que nos transportam ao acontecer virtual ao qual fomos iniciados pela tela do computador. Mas já não se trata mais de estar conectado, mas de viver a conectividade como um modo de existência , como uma extensão  de nosso acontecer no mundo. É cada vez mais difícil pensar, sentir e se expressar longe de uma tela.

Pode ser que logo chegue um tempo em que o próprio conceito de humano nos pareça demasiadamente antiguado para a persona virtual  que cada vez mais nos serve de duplo e tranborda. 

Pode ser que a simulação substitua um dia o mundo tal como conhecemos impondo o virtual como um novo e complementar referencial de realidade. 


SOBRE A VIRTUALIZAÇÃO DA ESCRITA


A virtualização da escrita é, em grande medida, uma luta contra o papel, contra  a concretude das coisas e sua materialidade. A palavra já não busca dizer a realidade.  Ela é inesgotável a qualquer discurso ou enunciado possível.  Deste modo,  sua existência é praticamente uma abstração.  A escrita virtual assume sua condição de discurso, de codificação de mundo que se fecha sobre si mesma através da trama do sentido.

Em outro plano, a virtualização da escrita implica na sua  dessacralização como representação de autoridade e verdade legitimada por uma série de instâncias sociais que permitiam sua seleta publicidade. O virtual democratiza a persona autoral e torna universal sua visibilidade. Pois desloca o escrito do suporte material do livro. Suporte este consagrado ao monopólio de uma elite letrada  articulada em ordens de discursos diversos  e institucionalizados em disciplinas técnicas  que formatam a  abstrata entidade que é a literatura ficcional  ou não.


A escrita virtual é acessível a qualquer um, bem como sua publicidade através do cyber espaço. Ela não possui numen, não expressa nenhum poder. É basicamente um ato de individuação, de construção de um avatar linguístico que resgata o lúdico de escrever, de inventar-se através de enunciados livres do peso de qualquer verdade oficial. Volta-se, ao contrário, contra todas as verdades sagradas.
O texto torna-se a própria assinatura, uma forma única de dizer , de dar vida a um avatar.

OS LIMITES DO LIVRO

O saber circular e pedagógico personificado pelo  livro é cada vez menos sedutor . Os discursos já o transcendem  como  meio ou artifício em tempos de digitalização da própria percepção. Pois o livro não comporta a fragmentação, a simultaneidade caleidoscópica do virtual como nova plataforma de construção e circulação do conhecimento de forma anti sistemática e constantemente aberta. Na medida em que reinventamos o olhar através da tela os enunciados não cabem na monotonia e concretude do impresso.