Em uma entrevista intitulada
“Outrem é secreto porque é outro”, concedida a Antoine Spire, publicada em 2000 por
Le Monde de L’ education e reunida a coletânea Papel Maquina, Jaques
Derrida fala sobre a influencia de Hussel em seu pensamento e nos oferece uma
reflexão bastante interessante sobre o tempo:
“ Os grandes textos de Husserl sobre o tempo atribuem uma forma
absolutamente privilegiada ao que se
chama de ‘presente vivo’. Este é o sentido, o bom senso mesmo no que
aparentemente tem de mais irrefutável : a forma original da experiência é a
apresentação do presente; não deixamos nunca o presente, que nunca se
deixa, que nunca deixa nada de vivo. A
ciência fenomenológica absoluta, a
autoridade inegável do agora no presente vivo, é justamente aquilo que
tematizaram, com estilos e segundo estratégias diferentes, todos os grandes
questionamentos deste tempo,
particularmente o de Heidegger ou o de Lévinas.
Num gesto diferente, com outra visada, o que procurei elaborar como
nome de rastro {trace}( a saber, uma experiência da diferença temporal de um
passado sem presente passado ou de um por-vir que não seja um futuro presente)é
também uma desconstrução sem crítica, da evidência absoluta e simples do
presente vivo, da consciência como presente vivo, da forma originária (Urform)
do tempo que se chama de presente vivo ( lebendige Gegenwart) ou de tudo que
pressupõe a presença do presente.”
Jaques Derrida. Papel Maquina.
SP: Estação Liberdade, 2004, p. 338-339
O primado de um tempo do agora
que é pura imanência e devir é o que nos define a vida. Não o passado e o
futuro como momentos distintos de um tempo virtual multifacetado e aberto as urgências do
presente. Este agora, entretanto, não é dado, não é o imediato em seu estado
bruto, mas é uma imersão da consciência em seu próprio acontecer. Assim, o
presente vivo, me servindo desta intuição
de Derrida, se inventa nesta tensão
entre passado e futuro na consciência do
agora.
A leitura que Derrida faz da herança de Husserl é bastante peculiar. Não me
ocuparei dela aqui. Mas é provocante a sua proposta de uma “presença do
presente” de inspiração fenomenológica. Afinal, o que é vivo através do
presente? Quais os limites do próprio presente?
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