terça-feira, 27 de dezembro de 2016

A MISÉRIA DA NORMATIZAÇÃO



A normatização da conduta é inerente a qualquer sistema de crenças, seja fechado (dogmático) ou aberto (critico/relativista).  Quando aderimos a uma opinião ou visão de mundo assimilamos determinados padrões de comportamento. Perdemos espontaneidade e passamos a nos comportar de acordo com as expectativas estabelecidas por nossas próprias idealizações do que é ou não é conveniente.

Aderir a qualquer sistema de crenças ou visão de mundo é um ato relacional. Como tal é uma busca por inserção, aceitação e dialogo entre aqueles que reproduzem o mesmo discurso ou conduta. Abdicamos de nos mesmos para viver socialmente uma certeza que personifica um “nós” que nos supre. Trata-se, entretanto, de uma perda de autonomia individual frente ao coletivo.


A adesão a sistemas de crenças inibi a criatividade individual , visto que se baseia em opiniões pré moldadas  e estabelece as conclusões a  que cada um pode chegar. Onde impera a norma não há liberdade de pensamento. Por isso é sempre saudável desconfiar de nossas convicções .  

segunda-feira, 26 de dezembro de 2016

UM POUCO SOBRE A VIDA DOS ENUNCIADOS

O significado de determinado enunciado é tão importante quanto o contexto em que foi construído. Pois não basta a uma narrativa ser pertinente. É preciso que seja interessante às circunstancias e adequada a gramatica imperante em um dado momento. A verdade é um consenso e todo o conhecimento sujeito a ignorância e ao silencio que define qualquer positiva afirmação sobre as coisas. A ignorância sempre nos obrigará a prudência e a conveniência de adequar os rumos da retorica ao gosto dos ouvidos dos outros. É a única forma de não sermos ignorados.

Não importa quão pertinente seja um enunciado. Mais importante é que ele conquiste o publico ou desperte suficiente oposição para ganhar a atenção.  Escritos vivem de leitores e discursos de ouvintes. É sempre destinada ao outro a tarefa de por as ideias em movimento e nutri-las  de emoção até que despertem paixões ou morram de desnutrição.

Esqueçam toda aquela conversa metafisica sobre verdade e as referencias a autoridade dos clássicos. As ideias pensam através de nossas palavras e tentam  sempre a replicação sem limites. Ninguém tem controle sobre isso. Por isso alguns autores se espantam com a recepção de seus livros quando ultrapassados por eles.  Não há nada pior do que ser  tornar um prisioneiro de suas próprias palavras.

domingo, 25 de dezembro de 2016

SOBRE O INACABAMENTO COMO PREMISSA DE NOSSA CONDIÇÃO HUMANA

O inacabamento é a essência da finitude e o trágico destino da existência... Tal constatação me remete a uma passagem muito curiosa do medievalista  Paul Zumthor em seu último livro que , muito apropriadamente, permaneceu inacabado em seu leito de morte....

"Um amigo biólogo afirmava na minha presença que o estatuto do homem é o de um feto extra- uterino. Donde a fragilidade e a extensão da infância; donde a sua indeterminação psíquica e o fato de,  globalmente falando, se tratar de um ser inacabado. E isso é válido, continuava o amigo,  não só para o indivíduo, mas também para a espécie. Do ponto de vista biológico, haverá adultos? A cultura , ia eu pensando no meu íntimo,  ao mesmo tempo que participa deste caráter geral,  tira daí a sua necessidade, pois substitui no ser que nós somos,  a natureza cujo fundamento e limites não são fixos nem estáveis. Na perspectiva semântica, tal como na geométrica,  o sentido do ser- humano ( do facto de ser humano) não é dado. De que modo triunfar deste inacabamento ontológico, quando afinal ele se comunica, como uma infecção, a tudo que nossas mãos moldam, tudo o que nossa inteligência concebe?"

Paul Zumthor in Babel e o Inacabamento: Uma reflexão sobre o mito de Babel. Lisboa: Editora Bizancio, 1998;  p.220

terça-feira, 20 de dezembro de 2016

SUPERANDO A DIALÉTICA

O mundo, em sua definição mais pragmática, não é um sinônimo de realidade, de objetividade, Ele personifica toda sorte de representação e fantasia que nos acontece no plano da percepção imediata dos fenômenos. Ele é uma constelação de fatos brutos ainda indomados pela interpretação.

Cada momento vivido,  em sua constelação de múltiplas ocorrências internas e externas, é imanência e iminência  de algo que não pode ser antecipado, previsto em suas diversas possibilidades, pois não possui qualquer racionalidade ou propósito.

Isso define a vida cotidiana em sua forma mais crua, em sua vertigem...

O particular despido de universalidade  contradiz a totalidade na coincidência dos opostos.

sexta-feira, 16 de dezembro de 2016

REALIDADE E CONHECIMENTO



Entre os fluxos de expressão e os fluxos de conteúdos, através dos signos codificamos a realidade em vários ritmos, modos de sensibilidade e estratégias narrativas. A consciência não é em si mesma, mas na forma como percebemos as coisas.

Tendemos a reduzir tudo a uma logica binaria, a um jogo de oposições onde a síntese ou a conclusão nos escapa. É como se o verdadeiro sentido nos escapasse na medida em que não somos capazes de produzir uma coincidência dos opostos, uma transcendência das categorias formais de nossas premissas epistemológicas. Dai a necessidade de subverter a linguagem, de ir além das próprias premissas do entendimento.

O entendimento esta condicionado a um agenciamento pelo próprio desejo de conhecer. Construímos uma relação afetiva com o conhecimento. Nos enamoramos dos objetos que inventamos e, como prova de amor, reduzimos a realidade a seus conteúdos. Tentamos a eles reduzir o fluir do pensamento, Como se ele não fosse instável e provisório em um delírio de interpretação do próprio real.



RESPOSTAS

Perdi muito tempo com respostas fáceis e cômodas,
Me distrai com muitos enganos
Antes de chegar à perplexidade
Como premissa de todo questionamento.

Nossos enganos produzem realidades
No agenciamento de nossos desejos
Mais ingênuos.
Pois o falso e o verdadeiro
Dizem a mesma certeza,
Não passam de uma mesma categoria de consciência.

Perdi muito tempo encontrando respostas
para as perguntas erradas.


INACABAMENTO

Como definir o infinito em uma linha de realidade?
A imaginação não tem limites,
Cria em anarquia as possibilidades do pensamento.
O futuro se desenha como projeto,
Como potencia que desafia o dado
Nas releituras do fato concreto.
Não existem conclusões definitivas.
Tudo que é humano existe sob o signo

Do inacabamento.

quinta-feira, 15 de dezembro de 2016

NOTA SOBRE A TRANSCENDÊNCIA DO SOCIAL

A possibilidade de representação racional do mundo social no plano epistemológico  torna-se cada vez mais duvidosa. Afinal, o social já não dá mais conta de uma vida coletiva  cada vez mais plural e dinâmica, irredutível a racionalidade instrumental e funcionalista.  Estratégias  comunitárias de construção de identidades e vínculos deram lugar a codificações mais abstratas e fluidas. Nestas o comportamento coletivo é cada vez mais formatado pelo fluxo de imagens e estímulos produzidos pelas novas mídias. Decorre dai uma autonomia maior do individuo nas estratégias de construção de sua identidade e estabelecimento de vínculos societários. Ao mesmo tempo, dar-se no entanto um deslocamento do sujeito e dispersão da identidade. Não mais nos adequamos a nossas personas sociais, mas nos reinventamos constantemente em um exercício de adaptação ao fluxo de experiências efêmeras que compõe o mais imediato dia a dia. Um amalgama de discursos, praticas e usos da realidade estabelecem agora os protocolos da realidade onde nos inventamos como personas de nos mesmos no palco do coletivo. Assim, o próprio coletivo já não é um espaço orgânico racionalmente estruturado a partir de um consenso legitimador de determinadas praticas e representações sociais. Ele se apresenta, ao contrario, como um plano indeterminado onde todos nós co-habitamos dispersos entre signos e conjunturas culturais e simbólicas justapostas. Carecemos hoje em dia de um mapeamento cognitivo de nosso cenário vivencial, das representações de mundo que compartilhamos diariamente. Nenhuma visão de mundo é suficientemente abrangente para reduzir a realidade a uma totalidade dotada de sentido e teleologia. Entre o universo dos significados e o mundo material, agora se impõe o virtual, o ambíguo e o contraditório. O que nos redime de qualquer sentido intencional balizador de nossas ações ou reflexões.

quarta-feira, 14 de dezembro de 2016

O HORIZONTE DO ALÉM DO HUMANO

Eu vos ensino o super-homem. O homem é algo que deve ser superado. Que fizestes para superá-lo?” – Nietzsche, Assim Falou Zaratustra, p. 13

Aprendemos com Nietzsche sobre a impossibilidade da morte de deus sem a superação da forma homem. Este estranho campo de batalha entre apetites diversos que agora se desfaz vitima da violência de seu próprio devir.

Superar ideias fechadas, os conceitos-prisões que definem os humanismos e o orgulho das conquistas da civilização. O pensar racional e conformista é feito de enunciados abstratos que estabelecem a ilusão de domínio sobre a realidade. Tudo que é compreensível e explicável é domesticado. Reduzimos a complexidade dos fenômenos a formulas simples e, assim, tomamos por resolvido o problema que é o mundo. Triste ilusão. Pois nos escapa a própria vertigem e absurdo de nossa condição humana e apenas inventamos uma realidade antropomórfica.

Mas o que nos espera além de toda consciência legada pela civilização? Talvez a reinvenção do corpo e dos sentido sem o peso do pensar metafisico baseado na  verdade objetiva que nos divorcia da concretude de nossa existência  finita em nome da ideia, dos conceitos, do contra-natural. É preciso que nossa ideia de realidade seja de algum modo mortalmente abalada para que este animal malfeito que é homem seja finalmente transcendido.

Sabemos que o humanismo é um conceito recente e demasiadamente moderno e, portanto, perecível.

segunda-feira, 12 de dezembro de 2016

DEBATE

Como último recurso
Tentei responder a todas as suas perguntas
Calando minhas próprias dúvidas.
Desesperadamente busquei lhe explicar o nada.
Mas fomos envolvidos pela vertigem de nossas ocas palavras
E encontramos em um tumultuado silêncio
A melhor solução.