segunda-feira, 27 de novembro de 2017

A LIBERDADE DAS PALAVRAS

A impecável defesa de uma tese qualquer recheada de referencias, comentários eruditos e citações diversas, estrutura enunciados pré definidos pela prisão de um discurso impessoal, de uma disciplina. Desde o inicio  ela define o que pode ser dito, faz-se limite entre o verdadeiro e o falso, entre o sustentável e o absurdo de uma narrativa.


Tudo que vai além disso é literatura. Não a literatura livresca e normatizada dos romances. Mas a literatura que inventa o estrangeiro, o continente selvagem da linguagem, onde o dizer não corresponde a qualquer coisa. A incerteza do significado, o paradoxo, é onde a linguagem ainda pode ser experimentada em liberdade.

O SER DA LINGUAGEM

O dizer nunca esgota a folha em branco,
Não se conforma a letra
Que não ultrapassa a margem da folha
Ou vence de vez o silêncio das vozes escritas.

O Ser da linguagem está na brancura
Da pagina solta,
Frequenta a utopia de uma gramática aberta.
Procura sempre o outro do texto
Que morre como livro.




sexta-feira, 24 de novembro de 2017

SOBRE FALAR E ESCREVER

Há algo de teatral no ato de falar e escrever. Comunicar-se é mais um exercício de expressão do que propriamente um intercâmbio entre o “eu” e o “tu”. È um ato solitário de linguagem onde nos relacionamos mais com os enunciados de um dado discurso que apresentamos do que propriamente com o receptor.


Nesta perspectiva, comunicar-se é solitário e pode ser considerado a variante, mesmo contraditória, do monologo. Afinal, a leitura e a escuta muito frequentemente apenas precariamente ecoam o objeto.  O diálogo é um luxo entre os seres humanos. 

sexta-feira, 17 de novembro de 2017

SOBRE O VAZIO DA IDENTIDADE



Procedemos diariamente à encenação de nós mesmos como um rito de identidade (s). Mas são os outros quem nos define a persona, a trama e o próprio destino. Se a vida social é um teatro, um simulacro, nele não temos direito se quer a definição de nós mesmos.  Mas se fosse possível tal prerrogativa, seriamos capazes de nos  auto impor algum rosto que não fosse o simples esboço de nossas imprecisões?  


segunda-feira, 13 de novembro de 2017

O JOGO DOS OPOSTOS DE NOSSA CONSCIÊNCIA DO MUNDO

Duas tendências opostas nos condicionam a existência: por um lado a vocação para nos conformar ao mundo como exterioridade, como norma coletiva. Em contrapartida, sofremos a tendência para experimenta-lo como um outro de si mesmo, enquanto interioridade subjetivada. Nosso bem estar depende de um equilíbrio entre estas duas tendências do movimento introjetivo da consciência das coisas.

O conformismo é a submissão natural ao bom uso do impessoal da linguagem como forma de inscrição no jogo social, o cultivo da individualidade é, de modo complementar, a codificação aleatória e subjetiva de todo material e experiência simbólica, a vocação para estabelecer arranjos próprios dentro do horizonte de uma perspectiva ou visão de mundo. Uma tendência tende a conformar-se a outra através do perigoso caminho do cultivo da verdade. Mas a única verdade que nos é realmente possível é o devir, a perenidade de todas as coisas. É neste ponto que as duas tendências devem coincidir.



SUBJETIVAÇÃO

Sou filho dos meus gritos
E sobra dos meus silêncios.
Metade de mim é imperfeita,
Outra metade é desejo.
Sou por inteiro
Feito de inacabamentos.
Parte de mim já se foi,
Outra nunca acontecerá.
Existo de modo impreciso
Entre a vontade e a representação
De um eu sempre em construção.


NOTA SOBRE INSPIRAÇÃO E CRIATIVIDADE


ROSTO

O que melhor define o corpo
É o rosto.
A paisagem da carne viva
No gosto das coisas,
no sentimento do outro
Que é o mundo
que através do olhar
Nos faz tudo
Entre ver e ser visto
Mediante o sentimento
E sentido da paisagem,
Como se fosse um quadro de carne.

sexta-feira, 10 de novembro de 2017

RETÓRICA

Entre quem escuta e quem fala existe a regra,
O pré-dito no silêncio que antecede a fala.

Existe mais do que nós ...
O SENTIDO,
O vazio, o acaso
E a memória.
 Talvez haja, inclusive,
um "Isto".

Mas o corpo não existe.
Ele simplesmente é,
Contra o ilegível
Que dorme dentro
De qualquer palavra.


CÉU AZUL

Este céu azul
não é o mesmo 
Da minha infância.
Mas ainda me serve
Como matéria de sonhos
E a evasão
Que me reinventa criança
Contra todas as certezas do mundo.

O CORPO NA ALMA

O corpo preso à alma das coisas
Inventa a realidade compartilhada
Na prisão da verdade.

Nada é absoluto quando o absoluto
É relativo à carne que pensa,
Que sente e sofre significados
Gritando o absurdo de tudo.

                                           

quinta-feira, 9 de novembro de 2017

ARQUEOLOGIA DO SABER

Minha essência é ausência,
Uma falta de ser,
Que me define como um fantasma
Dentro de um espelho.

Digo apenas o que pode ser dito
E penso apenas o que pode ser pensado
A margem do ser da linguagem.
Sou o original e a cópia
De um discurso fechado.
Para mim quem é por que
Na arqueologia de Foucault

quarta-feira, 8 de novembro de 2017

MATURIDADE INTELECTUAL

As molduras do meus pensamentos estão gastas. Nem mesmo sei dizer se ainda penso, no sentido de qualquer reflexão nômade, ou se apenas insisto em repetir velhas receitas pseudo acadêmicas que já não me definem, que não dão mais conta de minhas tantas inquietações.
                    
Hoje sofro o peso do tanto que ignorei, do pouco que considerei, e lamento a impertinente tendência a me considerar alto suficiente, senhor dos meus próprios enunciados, quando apenas me fartava de cultura livresca e requentada.
O tempo passa indiferente aos  quadros de pensamentos que decoram nossas praticas cotidianas. Não é por acaso que a grande maioria não se ocupa dos jogos do pensamento, não os pendura nas paredes da alma.


A verdade não nos leva a nada além do inútil vicio da verdade. Mas aquilo que nos faz livres são as dúvidas e inquietações que não se intimidam com a autoridade de qualquer livro, que ignoram as molduras do pensamento, mas buscam a sua essência na folha em branco.

segunda-feira, 6 de novembro de 2017

VIDA E EXPERIENCIA DO REAL



O vivido é o ponto de chegada da experiência e não o seu ponto de partida. Pois aquilo que é vivenciado só ganha forma e significado na medida em que é representado. Antes disso o vivido é puro e cego reflexo do exterior, mero automatismo.


O vivido é um campo complexo da consciência do real que não remete propriamente a ação e a sua experiência, mas aquilo que lhe atribuímos posteriormente como significado. Posso simplesmente atravessar uma rua visando chegar a algum lugar. Isso é diferente de atravessar determinada rua, em determinado dia e ocasião. A valoração da experiência é o que lhe define como tal no jogo simbólico da representação dos nossos próprios atos. 

O QUE É UM ACONTECIMENTO?


Um acontecimento não se reduz a sua materialização como evento concreto. Pode-se dizer que é um processo em grande parte virtual. Mesmo que não definido por qualquer causalidade, mas pela simultaneidade de determinados eventos.
Como, afinal, poderia uma coisa acontecer fora da simultaneidade de tantos outros acontecimentos? A multiplicidade é sua característica mais elementar. Por isso pouco entendemos um acontecimento, pois geralmente não estabelecemos sua rede de relações, não percebemos que um acontecimento só é pleno na medida em que estabelece uma descontinuidade dentro de uma cadeia de eventos, criando uma situação inédita. Assim, um fato não é necessariamente um acontecimento, mas a continuidade de uma cadeia de eventos.
Um acontecimento não tem sujeito, é devir que liga um passado e um presente saltando para o futuro. Ele é uma singularidade que personifica o desdobramento da própria vida como movimento que nos ultrapassa, como algo que não se curva a nossa previsibilidade e muito menos a nossas apostas e certezas teleológicas. Fatos criam continuidades, acontecimentos inventam o inédito através da acausalidade.







DEVIR E AGENCIAMENTO

Busco a palavra que me faça
Um devir água, 
Um devir folha, 
Um devir animal ou inseto,
Que me ponha novamente
Em movimento
contra as inercias deste vazio
de ser gente.

DO TEMPO AO TEMPO

Tudo que precisava era de tempo.
Tempo para trabalhar,
Para viver, viajar,
Amar, sofrer e gritar.
Precisava de tempo
Para dormir mais um pouco
E até para esquecer o tempo.
O tempo nunca era suficiente.
E, apesar de toda perda de tempo,
Sempre reclamava da falta de tempo.

SOBRE ESCREVER


Escrever depende da nossa capacidade de escutar silêncios no âmago do cotidiano. Não se trata de usar as palavras para dizer qualquer coisa da qual a fala não dá conta entre o signo e o simbolo.

É preciso calar a si mesmo para escrever, contemplar imprudente vazios e absurdos dentro da gente até que as palavras alcancem o limite do significado.

Escrever é uma situação extrema, uma vertigem que ameaça nossa própria existência. São muito raras as pessoas que sabem escrever.