sexta-feira, 29 de junho de 2018

SOBRE O DIZÍVEL E O VISÍVEL


Cores e cheiros me fazem lembrar antigos lugares.
Posso quase sentir atmosferas afetivas,
Abrigos de pensamento,
Códigos vivos de banal existência....
Deleuze, em seu curso de 1985 sobre Foucault,
Nos lembra a diferença entre o descrever e o enunicar.
Afinal, dizer não é ver e isso não é um cachimbo.
Os  espaços definem visibilidades,
Mas nenhum enunciado diz estes espaços.
As dizibilidades acontecem nos lugares
Capturando o visível.


SOBRE O VER E O DIZER


O ver e o dizer se articulam e transcendem a percepção. Remetem ao nosso modo de agir ou fazer a vida acontecer através de seus ritos coletivos. Nosso comportamento não tem nada de natural. É, ao contrário, um mero artifício.

Mas, ao mesmo tempo, ver e dizer, é também um ato de criação, uma forma de adquirir substancia através da experiência de uma discursividade que cria sentido. É isso que nos define, sempre provisoriamente, entre os outros e através de todos.

terça-feira, 26 de junho de 2018

PLANO DE IMANÊNCIA E PENSAMENTO NÔMADE



"O plano de imanência é, entre outras coisas, uma espécie de solo intuitivo, cujos "movimentos infinitos" são fixados pelas "coordenadas" construídas pelo movimento finito do conceito. O plano de imanência, despovoado de conceito, é cego (no limite é puro Caos); o conceito, extraído de seu "elemento" intuitivo (no sentido de atmosfera) é vazio. Acrescentaria, ainda, que, assim como Kant atribui à imaginação transcendental a função de mediação, que permite a subsunção da intuição ao conceito, Deleuze introduz a instância intermédia dos "personagens conceituais", na passagem dos "traços diagramáticos" do plano às "coordenadas intensivas" do conceito."


Bento Prado Jr in A IDEIA DE  PLANO DE IMANÊNCIA

Segundo Deleuze & Guattari, um plano de imanência é sempre um horizonte de acontecimentos, onde os problemas se colocam e os conceitos habitam contra o caos. Através deles a filosofia torna-se um trabalho para cartógrafos. Pois os conceitos acoplam-se uns aos outros, reinventam-se na medida em que se relacionam entre eles  compondo, assim, o próprio plano. O pensar é movimento, fluxo. Estabelece-se através de pontos, coordenadas, campos de força.

A imanência não remete a algo exterior. Ela exclui toda transcendência na medida em que é movimento, velocidade. Não há tempo para se fixar em nada, para qualquer versão de eternidade ou de transcendência.  

UM GOLE DE FOUCAULT CONTRA A EMBRIAGUEZ DO PODER



Trata-se (…) de captar o poder em suas extremidades, em suas últimas ramificações (…) captar o poder nas suas formas e instituições mais regionais e locais, principalmente no ponto em que ultrapassando as regras de direito que o organizam e delimitam (…) Em outras palavras, captar o poder na extremidade cada vez menos jurídica de seu exercício.” (FOUCAULT, Michel in Microfísica do Poder, p.182).

O poder é mais um efeito do que propriamente uma instituição ou uma ideologia. Ele é uma forma de subjetivar as pessoas, conforma-las a um modo de ação e a uma identificação. Foucault ocupou-se de forma realmente fecundo desta dimensão molecular que define o poder como um saber articulado a práticas, a um jogo simbólico, poderíamos dizer, entre um modo de codificar o real e de agir em função de tal codificação. O poder não acontece de forma vertical, ele acontece em todas as perspectivas, pois é um fluxo, algo indeterminado.

A norma é uma exterioridade internizada, ela  organiza nossa espacialidade social exatamente na medida em que nos comportamos como coordenadas dentro de um campo que nos reconhece como tal e no qual nos reconhecemos.
O que poderíamos dizer de forma sarcástica é que o poder é tão concreto, tão imediato, que ele não existe de tão naturalizado.
Quando alguém  se  opõe a um poder ironicamente tende a inventar um contra poder, a produzir sua luta contra o poder como um poder. Fomos condicionados a não pensar fora do poder, mesmo quando o negamos.

Ultrapassar as praticas e jogos de poder que perpassam todas as nossas formas de existência nos parece possível apenas através do lúdico. Tanto no sentido do jogo quanto da sátira, de um riso niilista, anárquico, que põe em xeque a própria significação das coisas.





ALICE NOS LABIRINTOS DO JARDIM


sábado, 23 de junho de 2018

O QUE É O TEMPO PRESENTE?


O tempo presente é movimento, indeterminação. Ele contém em si o passado e o futuro. Por isso é um acontecer definido  pelo virtual do já ocorrido e do que estar por vir. 

Por isso não é preciso dizer que o tempo presente possua uma substância. Ele é a intercessão de todas as possibilidades e como tal não é nada.

O tempo presente não é definido pela ação, como tão comumente  o representamos. Mas pelas circunstâncias, pelas premissas da própria possibilidade da ação. São as condições, a determinação espacial de um agora, que o caracterizam. O perecível do circunstancial é o que define o tempo presente como movimento.

sexta-feira, 22 de junho de 2018

A LINGUAGEM COMO GEOGRAFIA




Habito um hábito,
Na palavra como geografia de signos e símbolos.
Mas não me abrigo no significado,
Procuro o campo aberto dos paradoxos,
Das intensidades e experiências
De um dizer imanente
Onde a linguagem se confunde com o corpo,
E os atos, abstratos e concretos,
se transformam em enunciados.

quinta-feira, 21 de junho de 2018

O EU DENTRO DO MUNDO



Existe um ponto hipotético onde não é mais possível separar o eu do mundo. 

É quando o dizer se faz fazer e o significado apresenta-se como movimento incerto entre o corpo e as coisas.
Tal plenitude do sentido anula qualquer ilusão subjetiva. É quando o devir domina o tempo e inventa lugares dentro da experiencia.  

A intuição do indeterminado redimensiona todos os atos. Somos, então, meras testemunhas de nossos próprios pensamentos.

segunda-feira, 18 de junho de 2018

SOBRE INTERCESSORES E A CRIAÇÃO DA REALIDADE



Para Deleuze, a verdade não é algo pré existente. É algo que a falseia ideias pré concebidas. A potência do falso produz o verdadeiro. A verdade, enquanto uma construção social,  pressupõe a ação de intercessores,

“O essencial são os intercessores. A criação  são os intercessores. Sem eles não há obra. Podem ser pessoas- para um filosofo, artistas ou cientistas; para um cientista, filósofos ou artistas- mas também coisas, plantas, até animais, como em Castaneda. Fictícios ou reais, animados ou inanimados, é preciso fabricar seus próprios intercessores. É uma série. Se não formamos uma série, mesmo que completamente imaginária, estamos perdidos. Eu preciso de meus intercessores para me exprimir, e eles  jamais se exprimiriam sem mim: sempre se trabalha em vários, mesmo quando isso não se vê. E mais ainda quando é visível: Felix Guattari e eu somos intercessores um do outro.” (Guilles Deleuze. Conversações 1972-1990. RJ: Editora 34, 1992, p.156)

Os intercessores nos permitem dizer, exprimir, fabular, criar. São essenciais a prática discursiva e aos fluxos de pensamento. Jamais estamos sozinhos no fragrante delito de fabular, de criar o real. Não há verdade que não pressuponha um sistema simbólico e um esforço inventivo.