quinta-feira, 25 de julho de 2019

SOBRE OS LIMITES DO HUMANISMO


Já não nos reconhecemos confortavelmente naquela abstração antropológica que separou o animal do homem. Mas disso não se deduz qualquer fantasia primitivista de um retorno a natureza. Pelo contrario, é com o vazio do humano que somos confrontados. Não sabemos lidar com nossa animalidade e essa inadaptação a nossa inalienável condição animal se tornou um fardo com a civilização, com os artifícios de sobrevivência e reinvenção da vida que a cultura significou ao longo de séculos de adaptação do homem ao mundo em seus próprios termos.
O que nos tornamos já não é visto como um ganho, mas como um fado do qual parecemos incapazes de nos livrar.

A forma-homem já não é mais vista inequivocadamente como a medida de todas as coias humanas. A natureza retorna como um imperativo necessário a nossa própria sobrevivência diante das disfunções da civilização pós industrial. Nos encaminhamos para o limite do pensável diante de toda a tradição humanista.  


segunda-feira, 22 de julho de 2019

ÉTICA E LINGUAGEM


O que busco pelo discurso é uma transparência impessoal da vida.  

Procuro um efeito de verdade que  abrigue o desejo,
Que me faça criativo,
Que me permita existir além de toda identidade.

Não procuro respostas, nem sonho revoluções.
Sei que jamais esgotaremos todas as possibilidades da realidade.

Busco  o livre modo de uma nova ética,
A plena realização do meu corpo
em intensa existência.

Mas o que quer meu corpo?


O EU, OS OUTROS E O NÓS


Entre o meu inicio e o meu fim há o absoluto do meu existir em todas as direções da vida. Sou essencialmente exterioridade. Algo que dura e perdura contra o tempo através do desejo.
Mesmo que provisoriamente eu existo, ínsito em mim mesmo, descobrindo e redescobrindo o mundo.

Existir é um ato de criação permanente onde me surpreendo criador e criatura de um mundo comum a todos. Dentro de mim existem os outros e juntos inventamos um nós que virá.

domingo, 21 de julho de 2019

DENTRO DE MIM


Todos os dias são  iguais.
A vida é  sempre o mesmo esforço,

que se desdobra do lado de fora de mim.

Mas amanhã posso acordar outro
por influência dos outros,
Mesmo que tudo continue igual
dentro de mim.

Tudo é uma questão de adaptação
E inautenticidade
dentro de mim...

sexta-feira, 19 de julho de 2019

A LETRA E A VIDA




"Escrever é retirar-se. Não para a sua tenda para escrever, mas da sua própria escritura. Cair longe da linguagem, emancipá-la ou desampará-la, deixá-la caminhar sozinha e desmunida. 
Abandonar a palavra." (Derrida, Edmond Jabès e a Questão do Livro, 1973.)

 A escrita não é uma representação da linguagem oral e muito menos a descrição ou a apropriação abstrata de um real percebido como exterioridade. Ela é um ato de invenção, de definição de um eu que serve de ponto de passagem entre um interior e exterior que como dado empírico é uma construção da linguagem. É a linguagem e não o mundo que habitamos. Isso nos difere dos animais, nos torna mais complicados ou absurdos do ponto de vista da natureza. Observando que o próprio conceito de natureza é uma abstração humana, demasiadamente humana.

Não podemos saber o mundo sem construir um modelo de mundo. Desconhecemos a experiência nua do vivente. Mas somos compostos pelo vivente. Somos um arranjo entre o orgânico e inorgânico que produziu uma anomalia. Nosso modo de pensamento por associações e analogias, é uma anomalia que desemboca no artificio da representação.

Tudo o que fazemos é dizer um mundo circunscrito a um dado território gramatical. O que nos torna humanos é o dizer das coisas. Para nós a linguagem é a medida da realidade. Nos últimos séculos, marcados pela definição do letramento como condição de cultura, a escrita passou a se confundir com o experimentável e o socialmente comunicável. Ela se converteu em um poder estruturante da experiência social. Existimos para e através da linguagem. A palavra se  fez  alma do copro.

quarta-feira, 17 de julho de 2019

REEXISTÊNCIA




Aquilo que em nós persiste
Como natureza,
Na contramão de toda contingência
E configuração cultural,
É o que nos faz ser
Sempre de outra forma
No tempo.

É algo que transcende o humano,
a extensão e o pensamento
através da multiplicidade.

É o que nos faz viventes e plurais.

terça-feira, 16 de julho de 2019

EFEITO VERBAL


A palavra tem o efeito de uma nota musical quando se dobra a qualquer imagem primordial, quando afeta o pensamento e deixa um gosto nos olhos, no corpo. A experiência do dito já não se esgota no significado. Transcende o escrito e faz a consciência experimentar qualquer coisa diferente que no ilegível do ser diz a vida em sua vazia profundidade.   


segunda-feira, 15 de julho de 2019

A ARTE DE VIVER




Na arte de viver é quase uma regra buscar o extremo. Pois é através dele que acessamos o inesperado, o imprevisível de qualquer novidade. A extremidade é sempre a margem, o ponto de fuga, de algum lugar que nos acomoda. Só progredimos onde há fuga. Que outro sentido pode ter a experiência do devir, do além do agora, como um campo múltiplo definido pela potencia do virtual? Não há conhecimento do viver que não afirme instabilidade e incerteza. Aquele que se conforma a qualquer variação de si mesmo, que se fixa em um dado agora, escapa a sua própria vocação como vivente, perde qualquer possibilidade de experimentar-se como um corpo em constante estado de mutação.   

O DRAMA DO ESCRITOR



Todo escritor pressupõe no ato da escrita um abstrato leitor universal, um fantasma ao qual sua narrativa é destinada. É esta entidade virtual que confere valor ao seu enunciado. Ao mesmo tempo, todo escritor é leitor de si mesmo, pois idealiza, inventa-se como persona, convertendo-se em parte de sua ficção,  do seu exercício narrativo.

Com o advento do modernismo, a  escrita tornou-se  uma cartografia de si, uma apresentação do existir que se faz a margem das normativas cognitivas e epistemes de uma época. A linguagem apresenta-se como exercício selvagem de alienação do eu de si mesmo e do que nos é convencionalmente imposto como regra, como princípio de realidade.

A liberdade de escrever é um encontro sempre frustrado com o ser da linguagem, com sua incerteza, que tem como signo de experiência o vazio da folha em branco. é contra a biblioteca, a livraria e a própria infinitude dos livros possíveis, que o exercício da escrita se insurge sempre de novo, a margem de todo saber formal. 

Escrever é um ato selvagem que transcende o corpo do texto. A própria linguagem é sua matéria prima. É o desespero de escapar a armadilha do previsível das palavras que move o punho, que inventa o dizer sempre a deriva, sempre em busca, de qualquer experiência sem nome e sem palavra.


domingo, 14 de julho de 2019

ESPECULAÇÃO SOBRE O CORPO E O MUNDO

Qualquer experiência do corpo pressupõe  uma identidade sem sujeito com o ambiente. É  assim que uma imagem mundo se torna experiência , apresentação e presença ou, simplesmente, participação, encontro de um dentro e de um fora que nunca se consuma inteiramente. 

Existir é  ser preenchido pelo que nos falta e ultrapassa. Viver é  indeterminação, ausência de ser através  das coisas. O corpo sempre carrega a intuição  do caos  em seu apetite de mundo. O corpo é  um estado de falta extra uterina onde não  há fronteira clara entre o orgânico e o inorgânico,  entre o vivo e o morto.