“Um romance precisa de um herói,
e aqui foram reunidos intencionalmente todos os traços para anti-herói,e, o que é mais importante, tudo
isso vai produzir uma impressão muito desagradável, porque nós todos nos desacostumamos da vida, uns mais, outros menos, e nos
desacostumamos ao ponto de sentirmos às
vezes uma certa repugnância pela verdadeira “vida-viva”, e por isso não podemos
suportar que nos façam lembrar dela. Pois chegamos ao ponto de achar que a
verdadeira “vida viva” é um trabalho,quase um emprego, e todos nó no intimo
pensamos que nos livros é melhor. E porque às vezes ficamos inquietos,
inventamos caprichos? E o que pedimos? Nós mesmos não sabemos. Nós mesmos nos
sentiremos pior se nossos pedidos delirantes forem atendidos..”
DOSTOIÉVSKI in NOTAS DO SUBSOLO
A psicologia de Dostoiévski nos
defronta com a decadência do indivíduo na modernidade e a própria morte da
cultura. Talvez seja este o grande impasse que se apresenta ao “paradoxista” ,
o protagonista narrador de Notas do Subsolo. Sua angustia é a constatação da
falência de um mundo onde nenhum indivíduo encontra seu lugar e a sociedade nos impõe seus piores defeitos
como regra e moral do existir coletivo.
É diante desta opacidade de um
real que se decompõe que o paradoxista mergulha em si mesmo em atitude hostil a
tudo aquilo que o cerca. A vida encontra-se danificada, mas as pessoas
continuam vivendo ignorando o naufrágio da civilização.
Ainda somos contemporâneos deste
dilema. Fato que sustenta a atualidade desta novela espetacular do ponto de
vista narrativo e psicológico. Mas ela não nos oferece respostas ou soluções as
questões que apresenta. Apenas nos faz consciente da desastrosa avalanche
cultural que nos carrega tragicamente em direção ao abismo.