terça-feira, 12 de março de 2019

A VIDA COMO ESPETÁCULO

Sei que a obra viva  da minha existência desafia minha própria consciência. Sou o ator, o autor , o espetáculo e o espectador do teatro da minha existência. Mas não há enredo que defina meus atos, nem espontaneidade em meus improvisos. Tudo é um acontecimento sem sentido, um espetáculo sem qualquer brilho que, surpreendentemente, transcende o grande espanto que define o sublime.

O DESAFIO DAS PALAVRAS


O encanto das palavras está no seu potencial para significar a  vida. Não a vida cotidiana e imediata que silenciosamente nos define concretamente no espaço e no tempo de uma época. Mas a vida que inventamos, que adivinhamos através do pensamento.

As palavras são como um jogo. Não basta apenas conhecer suas regras. É preciso criatividade para jogar com elas, para fazer dizer justamente aquilo que nos deixa mudos. 

Eis o desafio das palavras: fazer a vida ir além do vivido, comunicar aquilo que nos faz ausentes do mais elementar acontecer de nossos corpos.

As palavras inventam a vida para que o nosso viver  se torne suportável.

domingo, 10 de março de 2019

A ANTI FILOSOFIA DO SIMPLES AQUI E AGORA

Não há nada mais complexo do que o simples estar aqui e agora acontecendo como um corpo vivo. Não é possível separar a condição sensitiva, intelectual e vegetativa que nos define como parte de um dado ambiente, como algo que se move e realiza coisas. Somos a soma de vários processos que em sua totalidade escapam ao significado, a armadilha do intelecto.   Se quer temos controle sobre isso. Viver é o acontecer do corpo e , para o corpo, o pensamento e a consciência não passam de um detalhe. Ele existe para locomoção e interações ambientes que visam unicamente sua reprodução. O pensamento procedeu um desvio, uma curva,  que nos inventou "o humano" como um artifício contra natural. Mas, apesar disso, toda a nossa existência ainda gira em torno da imediaticidade do simples aqui e agora.

quinta-feira, 7 de março de 2019

DESCAMINHOS

Todas as noites afundado na bagunça dos meus cacos, faço um inventario das minhas perdas e ganhos ao longo dos anos.

Constato sempre de novo o absurdo da sucessão de cotidianos, épocas, fases e rostos. Não compreendo como cheguei ao aqui e agora. 

Não me reconheço em nada daquilo que me define agora.

ESTESIA: A UNIDADE DO AFETO E DO PENSAMENTO


Estesia é um sinônimo de sensibilidade, remete a nossa capacidade de apreender através de sensações e sentimentos. Podemos pensar a produção de qualquer saber, de qualquer experiência de conhecer, como possuindo um componente estésico. Razão e sensibilidade confluem na compreensão da realidade. De muitas maneiras, todo saber é sensível, pois pressupõem uma experiência sensorial (impressão) traduzível em alguma forma de linguagem (expressão). A tradição logocêntrica da cultura ocidental, tende a afirmar a dicotomia entre corpo e pensamento, desqualificando o corpo e a dimensão sensória em beneficio de uma idealização do intelecto, de uma mitificação da razão.  Na pratica, entretanto, somos produtos de nossas afetações, da intensidade de nossas impressões. Não há como separar sentimento (escolha/eleição) da atividade de pensar, daquilo que é produzido pela mente  como pensamento.  


LINGUAGEM, INDIVIDUO E PREDICADO


O individuo humano se define por seus predicados. Ele não possui substancia em si mesmo como unidade isolada ou fato empírico. É preciso que se faça através da linguagem, dos símbolos e signos que articula na ação de dizer a si mesmo e o mundo. Mas seu dizer não se realiza através de um esforço descritivo e de reconhecimento do que existe, ele se dá mediante a criação de um sentido próprio inerente ao próprio exercício de dizer. Expressão e interpretação coincidem no ato criativo  de dizer.

O mundo acontece na medida em que é interpretado e naturalizado através de códigos socialmente estabelecidos. O individuo acontece como função inerente ao ato do discurso, ele acontece quando faz deste discurso uma singularidade. Deste modo, aquilo que tenho a dizer não pode ser dito da mesma maneira por qualquer outro e, entretanto, comporta o dizer de todos os outros como possibilidade infinita do discurso.  O modo próprio do dizer de alguém é seu mais autêntico predicado.


SOBRE O MUNDO

Andei nos últimos tempos indiferente às pessoas e as paisagens da cidade. O que eu mais queria era estar em mim mesmo, saber tudo o que há para saber sobre o que fui e serei, sobre quem é aquele que me definiu como um eu. 

Mas não demorou muito para perceber que isso de ser eu não existe, que não sou nem na primeira ou na terceira pessoa do singular, que só persiste o mundo, que segue indiferente a mim e aos outros, sem saber se quer que é mundo, que é mudo, e existe sendo tudo que há na consciência e sentimento das coisas.Não existe nada em mim que já não diga este mundo, que já não me ultrapasse como possibilidade e realidade.

quarta-feira, 27 de fevereiro de 2019

A VIRTUDE DA INDIFERENÇA

A indiferença revela-se uma virtude quando nos torna insensíveis à pessoas e fatos cotidianos. Desta forma ela nos permite uma dedicação integral à experiência de nós mesmos como singular  acontecer do mundo, como corpo que povoa a paisagem da vida comum.


A indiferença não exclui relação e interação com  o outro e com as coisas. Ela apenas impede a formação de vínculos e identidades que estabelecem hábitos que nos alienam do vazio que constitui nossa íntima existência.

Dito de outra forma, a indiferença nos permite viver sem que o outro seja um condicionante do rumo de nossas  vidas.

quinta-feira, 21 de fevereiro de 2019

FUGA E ESTRANHAMENTO




Na intimidade do vazio cotidiano
O familiar me hostiliza.

Estou em franca dissonância
Em relação a tudo aquilo que me habita.

Quantos de mim cabem na paisagem?
Quais permanecem?

Tudo esta sempre fugindo,
Sinto que neste exato momento
Estou desaparecendo.

Sou um corpo estranho na paisagem,
Um estrangeiro,
Nas intensidade de errâncias.

A cada instante
Tudo fica mais distante...