sexta-feira, 11 de abril de 2008

LITERATURA INGLESA XXV


Charles John Huffam Dickens (1812-1870) pode ser considerado o mais popular e influente dentre os romancistas ingleses e britânicos da chamada era Vitoriana. A vitalidade sua obra é atestada por sua sobrevivência nos dias de hoje por intermédio de inúmeras adaptações cinematográficas e de animações.
Definitivamente, Dickens é um clássico britânico e principalmente anglófico.
Vale à pena observar que boa parte de seus romances e contos foram escritos em episódios regularmente publicados em jornais, o que proporcionava uma interação curiosa e única entre o autor e seus leitores que, mediante o maior ou menor numero de vendas dos exemplares, influenciava os rumos da narrativa; mas sem diminuir a qualidade do texto...
Embora um tanto quanto melodramático, os romances de Dickens são em grande parte obras de critica social, embora mais voltadas para o enterterimento do que para qualquer modalidade de “realismo”.
Grandes Esperanças ( Great Expectations) e o quase auto biográfico David Corpperfeld são considerados seus mais perfeitos romances. Mesmo assim sendo, emntretanto, vale a pena destacar, dentro do conjunto de sua produção, o romance histórico “ Um Conto de duas cidades” sobre a Revolução Francesa e a Revolução Industrial Inglesa.
Seu conto “Canção de Natal” é, entretanto, o mais conhecido e popular dentre seus escritos.

JEAN BAUDRILLARD: UMA CURIOSA LEITURA EUROPEIA DA AMERICA


Dentre as mitologias laicas que definiram a modernidade ocidental ao longo do século XIX e XX, o mito da América e da emigração européia, privilegiadamente representada pela america anglo-saxã, constitui uma das principais heranças de nossa contemporaneidade ocidental.
Um livro que muito bem ilustra essa “revolução permanente” chamada Estados Unidos é o relato de viagem, ocorrida durante a era Reagan, produzido pelo filosofo francês Jean Baudrilard entitulado AMERICA.
Sirvo-me aqui de uma passagem muito interessante sobre o significado cultural dos Estados Unidos para as configurações de mundo em que vivemos a partir das trocas simbólicas entre o velho mundo europeu e o novo mundo americano.
Pode-se dizer, em poucas palavras, que os Estados Unidos, enquanto imagem coletiva externa e interna da experiência de uma pluralidade de indivíduos, realizou o ideário do progresso oitocentista ao fundar a primeira e única verdadeira sociedade moderna não europeia.

“A América corresponde para o europeu, ainda hoje, a uma forma subjacente do exílio, a um fantasma de emigração e de exílio, e, portanto, a uma forma de interiorização de sua própria cultura. Ao mesmo tempo, ela corresponde a uma extroversão violenta e, por conseguinte, ao grau zero dessa mesma cultura. Nenhum outro país encarna a esse ponto essa função de desencarnação e, em conjunto, de exacerbação, de radicalização, dos dados de nossas culturas européias... Foi por um golpe de força, ou um golpe teatral, o do exílio, o do exílio geográfico redobrando, nos pais fundadores do século XVII, o exílio voluntário do homem em sua própria consciência que o que substituiria na Europa de esoterismo critico e religioso transforma-se no Continente Novo em exoterismo pragmático. Toda a fundação americana responde a esse duplo movimento de um aprofundamento da lei moral nas consciências, de uma radicalização da exigência utópica que sempre foi a das seitas, e da materialização imediata dessa utopia no trabalho, nos costumes e no modo de vida. Aterrissar na América é, ainda hoje, nessa “religião” do modo de vida de que falava Tocquanville. O exílio e a emigração cristalizaram essa utopia material do modo de vida, do êxito e da ação como ilustração profunda da lei moral, e transformaram-na, de certo modo, em cena primitiva. Nós, na Europa, foi a revolução de 1789 que marcou, mas não com o mesmo caráter: com o selo da História, do Estado e da Ideologia. A política e a história continuam sendo a nossa cena primitiva, não a esfera utópica e moral. E se essa revolução “transcendente” à européia já não esta muito assegurada, hoje em dia, de seus fins nem de seus meios, o mesmo não poderia ser dito da, imanente, do modo de vida americano, dessa asserção e pragmática que constitui, hoje como ontem, o patético do novo mundo.
A América é a versão original da modernidade; nós somos a versão dublada ou com legendas. A América exorciza a questão da origem, não cultiva a origem ou a autenticidade mítica, não tem passado nem verdade fundadora. Por não ter conhecido uma acumulação primitiva do tempo, vive numa atualidade perpetua. Por não ter conhecido uma acumulação lenta e secular do principio de verdade, vive na simulação perpetua, na atualidade perpétua dos sinais. Não tem território ancestral, o dos índios esta hoje circunscrito às reservas que são os equivalentes dos museus onde amarzena os Rembrandt e os Renoir. Mas isso é sem importância – a América não tem problemas de identidade. Ora, a potência futura é dedicada aos povos em futuro, sem autenticidade, e que saberão explorar essa situação ate o fim. Vejam o Japão, que numa certa medida, realiza essa tarefa melhor do que os próprios Estados Unidos, conseguindo, num paradoxo para nós iminteligível, transformar a potência de territoriedade e da feudalidade na territorialidade e da imponderabilidade. O Japã já é um satélite do Planeta Terra. Mas a América já foi, em seu tempo, um satélite do planeta Europa. Queiramos ou não, o futuro deslocou-se para os satélites artificiais.”

( Jean Baudrillard. América. / Tradução de Álvaro Cabral. RJ: Rocco, 1986; p. 65 e 66.)

quinta-feira, 10 de abril de 2008

MUSICA E SÉCULO XX: O JAZZ ENQUANTO FENÔMENO JUVENIL


A música no século XX tornou-se um fenômeno social e psicológico sem procedentes. Basta para ilustrar tal conclusão citar o papel desempenhado pelo Rock’ n’ Roll no Pós II Grande Guerra e ao longo dos anos sessenta e setenta, a verdadeira revolução de valores que sacudiu parte da Europa e os Estados Unidos e que podemos considerar mais do que um fenômeno de juventude, uma verdadeira ruptura com o ethos moderno que balizava até então a cultura ocidental. A transformação da musica e do hábito de ouvi-la, sua conversão em uma gigantesca indústria e referencial identidário coletivo, ancorada nas inovações tecnológicas que permitiam sua reprodutividade em qualquer hora ou lugar através de um aparelho doméstico, representam uma inovação psico-historica das mais relevantes. Se a musica foi, ao lado do cinema, uma das principais linguagens definidoras do espírito do último século, o Jazz pode ser considerado, no contexto norte americano de Pós- recessão de 29, o inicio de tudo aquilo que o Rock posteriormente representaria como linguagem.
François Billard, em uma passagem de seu divertido livro NO MUNDO DO JAZZ, da Coleção A VIDA COTIDIANA, entre nós publicada pela Companhia das Letras, nos ajuda a pensar o lugar do Jazz no século XX enquanto fenômeno psico- histórico e juvenil:

“ A juventude podia viver no presente, tinha, enfim, sua música. Basta imaginar as apresentações de Benny Goodman no Paramount Theatre de Nova York, em março de 1937. O preço do ingresso era apenas 35 cents. Na estréia havia mais de 20.000 pessoas numa sala onde cabiam 3.650 sentadas. Todo mundo dançava e pulava.Era a musica deles, e ninguém iria economizar energia. Nunca, talvez, os Estados Unidos, viram tal fenômeno, e o jazz era o grande vencedor. Aquela “cultura” própria do jazz tornava-se a cultura de toda a juventude, e todo mundo aproveitou-a. A partir de então, todos os movimentos que animariam a juventude americana se traduziriam com uma força impar na música, primando a forma sobre o conteúdo, retomando a velha distinção filosófica; o meio de comunicação era a mensagem.
A música adquirira uma força com a qual nenhuma outra forma de expressão podia lutar. Em relação a essa forma, o jazz ocupava uma posição particular, na medida em que ressaltava muito mais o novo, o inédito. Ainda que continuasse a utilizar um repertório conhecido, tomado de empréstimo ( acaso não seria o repertório das melodias populares?), ele o manipulava em seu benefício. O que contava não era tanto o que dizia, mas a maneira como o fazia, o que excluía a repetição servil: “De minha parte”, disse a cantora Billie Holiday, “ não consigo cantar duas vezes do mesmo modo a mesma canção, menos ainda durante dois ou dez anos. Se alguém é capaz de fazê-lo, trata-se então de torneio, de exercício, de tirolesa, qualquer coisa, menos de música.”.
Entre esses jovens nasceu uma minoria particularmente ativa, os hipsters, os caras “para frente”. Eles viviam a música e praticavam uma linguagem de iniciados, o jive talk. Não era uma criação totalmente nova na sociedade americana, e o livro de “ Mezz” Mezzrow e Bernard Wolfe, Really the Blues, descreve comportamentos semelhantes no correr dos anos 30, em Chicago. Os músicos eram seus heróis e exemplos, adotando em público atitudes destinadas a chocar, “por exemplo, a recusa de se conformar com a antiga convenção que obriga o músico, no momento de terminar o solo, a indicar com um sinal de cabeça que o que toca em seguida deve emendar; a expressão de tédio que lhes parece obrigatória, para executar inovações musicais mais ousadas; o costume de tocar de costas para o público, de movimentar-se no palco e sair dele, arrastando os pés, após terminar seu solo, sem olhar para sala.”

(François Billard. No Mundo do Jazz/ tradução de Eduardo Brandão. SP: Companhia das Letras/ Circulo do Livro, 1990 ( Coleção A Vida Cotidiana, p. 245 et seq.)

POEMA NOTURNO

O fragil equilíbrio
Dos meus sentimentos ausentes
Bate e arde em meus pensamentos
Em comoção de luas e estrelas.


Sei apenas
que é a noite,
que relógios me gritam
O superficial das horas
Enquanto me afogo
No negro
Que esta lá fora.

Entre luzes e sombras urbanas
adivinho desertos,
sinto a face do outro
que me define em sonhos.

quarta-feira, 9 de abril de 2008

A DANÇA DA VIDA


Alfabetos explodem
Em cada palavra dita,
Perdida,
No ato da expressão
Turva
Do acaso de cada momento.

Danço a vida
Em ritmos desconhecidos
De pensamentos,
Danço em emoções
E sentimentos
Escrevendo cores
No tempo.

Entre vontades
E ações
Vislumbro abismos abertos.

Mas tudo é puro movimento,
Mudança, perda
E transformação
No impreciso da dança
em que o mundo se faz
limite.

POEMA DELIRIO


Um branco minguante
Empilhado sobre
Um degrau
De pedaço de sonho
Veste-se
De negro e sombra.

Combatentes formas em confusão
Desenham uma paisagem noturna
Na qual me deito
Sobre as esperanças
De amanhãs esquecidos.

Já é tarde,
Quase longe,
Para o passo
Que perdi no escuro.

Reapreendo o mundo
Em todas as cores
E coisas da imaginação.

Sou de repente
Todos os meus limites,
Ventos, risos, gritos
E provisões de razão
No vazio do labirinto
Que me faz ser
No abstrato de cada ato.

terça-feira, 8 de abril de 2008

FRONTEIRAS, PASSAGENS, PAISAGENS NA LITERATURA CANADENSE


Um dos livros mais interessantes que li nos últimos tempos foi a coletânia organizada pela professora Maria Bernadette Porto intitulada Fronteiras, Passagens e Paisagens na Literatura Canadense que resume o dialógico esforço de pesquisadores brasileiros e canadenses em torno da produção literária no Canada e sua leitura da experiência única da realidade e significado simbólico do continente americano no contexto daquilo que, em termos culturais, poderíamos chamar de extremo ocidente em sua versão americanista . Cabe observar que a citada coletânia ocupa-se privilegiadamente do Canadá Francês. Mas, definitivamente, vale à pena reproduzir aqui uma passagem da apresentação da obra, feita por sua organizadora, na qual comenta brevemente os ensaios reunidos :

“Baseando-me no conceito de “coletividade nova” que designa o conjunto de sociedades criadas a partir do séc. XVI, em decorrência de migrações provenientes da Europa em direção a territórios considerados novos, Gérard Bouchard nos fornece pistas para compreender a formação do imaginário e da identidade quebrenses graças à apropriação do espaço e de si mesmo realizada no interior desta comunidade.
Ao privilegiar em seu ensaio a análise do confronto entre cultura erudita e cultura popular no Quebec, o sociólogo salienta conseqüências, visíveis ainda hoje, do projeto de letrados que se esforçavam para a criação de uma cultura nacional graças a uma literatura calcada no modelo francês, em detrimento da cultura popular que vicejava através de uma língua hibrida onde se inscreviam os sinais da americanidade. Em decorrência da ação dos letrados, valorizou-se a idéia de homogeneização da sociedade canadense francesa. Daí decorreria, aos olhos de Bouchard, a dificuldade de vivenciar a dupla relação com a Europa e a América, conhecida até hoje pelos quebranistas.

(...)

A partir de um olhar critico que foge a qualquer tendência a considerar o feminino através de uma perspectiva essencializante, Sandra Regina Goulart de Almeida desenvolve reflexões em que problematiza as questões de gênero e o termo pós-colonial em referência ao Canadá. Ao ressaltar a inscrição do feminino na paisagem literária canadense, a autora salienta o lugar de onde falam escritoras contemporâneas: tirando partido das margens, do lócus dos exilados, tais escritoras encaram o espaço de alteridade onde se encontram como fértil e transgressivo e ai questionam as brechas e os silêncios do discurso partriacal. Adotando a visão de um outro lugar, buscam uma escrita “aparentemente impossível e irrepreensível”, uma cartografia própria para a voz feminina. Assim, ocupam “um inevitável entre-lugar, [...] um espaço que se situa ao mesmo tempo dentro e fora do circulo de produção pós-colonial [...] dentro e fora da estrutura de poder partriacal”.
(Maria Bernadette Porto (org.) Fronteiras, Passagens, Paisagens na Literatura Canadense. Niterói: EdUFF:ABECAN, 2000, p. 8)

Através de um fragmento do ensaio da própria organizadora presente na coletânea, podemos assim resumir o espírito desta singular coletânia:

“... Falar em fronteiras, passagens e paisagens próprias a América remete-nos, antes de tudo, à noção de metamorfose, ao devir de povos cujas histórias supõem experiências plurais de desterritoriarização e de outros enraizamentos.
(...)
Trata-se, ainda, de levar em conta a América como espaço privilegiado de coletividades novas, surgidas num passado relativamente recente, em decorrência de migrações internacionais ou intercontinentais a partir de velhas áreas de povoamento em direção a territórios novos ( BOUCHARD, 1986). Apesar de diferenças em seus percursos históricos, tais populações apresentam em seu intinerário os seguintes traços, pelos quais se atualiza a prática da metamoforse: a) o fenômeno de continuidade ou ruptura ( em maior ou menor grau) em relação ao modelo cultural da mãe pátria; b) utopias de recomeço e de reconstrução cultural; c) gestos de apropriação do novo território ( no plano material e simbólico) ( BOUCHARD, 1996).

( idem p. 51 et seq.)

OLD

As sobras do vento
E das dores do tempo
Passeiam sem dó
Pelo indeterminado pensamento
Do meu amanhã.

Nada tenho a dizer
Sobre o hoje
Ou sobre as coisas
Aleatoriamente espalhadas
Na superfície
Da mesa da sala deserta.

As time goes by
That old feeling
Sumertime.

segunda-feira, 7 de abril de 2008

CONSIDERAÇÕES SOBRE O CONCEITO DE ACONTECIMENTO

A maioria dos dias não passam de notas de rodapé para o grande texto que é cada existência humana.
****
A noção de acontecimento tornou-se negativa na medida em que nos reconhecemos em rotinas biográficas para as quais a regra é o fato previsível de nossas ritualísticas obrigações diárias.
****
O acontecimento, enquanto ocorrência de um inesperado evento de significados e implicações imprevistas, em seu aspecto sombrio, confunde-se com a fatalidade e o indesejável de uma desconstrução trágica de contextos vividos ( confronto com a morte ou ocorrencia de acidentes).
Em seu aspecto positivo, entretanto, vivenciamos a experiência do acontecimento quando realizamos viagens a lugares distantes e inéditos, quando nos retiramos da cultura e cotidiano em que estamos inseridos e percorremos o desconhecido de qualquer estrangeira paisagem física e humana.
O que entendo aqui por acontecimento é muito mais do que a banal ocorrência de fatos e eventos, mas a vivência de situações numinosas, alheias ao cotidiano e prenhe de significado psicológico e imagético.

A DESCONSTRUÇÃO DA PALAVRA

Preservar o tempo através de missivas, diários e memórias foi uma das paixões difusas das abastardas classes medias vitorianas. Tais narrativas não literárias corresponderam a um modo ingênuo e otimista de conservar para alem de si e do momento a concretude do efêmero, a imediata experiência do vivido através da qual desenha-se a singularidade de uma biografia. Através desses relatos buscava-se construir alguma compreensão de si através da fugacidade da experiência intima e privada, de sua continuidade, diversidade e unidade, ao longo do intervalo cronológico definidor da própria vida singular.
Nos dias de hoje tal habilidade em grande medida se perdeu tanto quanto o médio controle do vocabulário e da gramática, indispensáveis mesmo a esse exercício lúdico de leitura e escrita intima.
Indo um pouco mais longe e reafirmando teses que já sustentei aqui em outro momento, diria que a palavra escrita deixou de definir a cultura e a civilização do mundo ocidental. A palavra já não é mais “sentida” como um espelho da natureza, da vida e das coisas, já não goza de qualquer importância significativa para a construção ou “materialização” de nossa experiência de existência. Não estamos mais restritos em nossa consciência do externo do mundo aos muros de qualquer discurso ou verdade.
Se quer buscamos uma continuidade entre o que fomos, o que somos e o que seremos, relegando o efêmero a dimensão do descartável e provisório reservado sem pudor a experiência da sucessão de dias que faz a vida e naturalmente se perde.
O sentimento contemporâneo do mundo é cada vez mais um aprendizado do metafórico deserto que nos envolve intimamente...