segunda-feira, 13 de agosto de 2018

DIFERENÇA E CONTEMPORÂNEIDADE



“No ser, a profundidade e a intensidade são o Mesmo - mas o mesmo que se diz diferença. A profundidade é intenidade do ser ou inversamente. E dessa profundidade intensiva, desse spatium, saem ao mesmo tempo, a extensia e o extensum, a qualitas e o quale.”
Guilles Deleuze in Diferença e Repetição

O que é a diferença? Seguindo os passos de Deleuze podemos responder de forma complexa a esta questão falsamente simples partindo da premissa de que ela é o oposto da identidade. Como disse Nietzsche  em Verdade e mentira do ponto de vista extra moral, “Nunca uma folha é inteiramente igual a outra.” Contrariando o mundo verdade da identidade da razão representativa, o ser é  diferença e multiplicidade. Este é o afeto que nos transforma através de novos agenciamentos e maquinações de um pensamento nômade, que foge ao jogo dos significantes e dops significados.

Percebemos que somos em multiplicidades, que no além do saber verdade das praticas discursivas tradicionais, nos confrontam com a univocidade do acontecimento dos seres. Somos, assim, cada um de nós, o lugar do não lugar que percorre todas as coisas, inventando-se como singularidade entre diferenças e repetições.

É a diferença e não a identidade que nos define em um mundo cada vez mais descentrado. Ela nos lança, através do pensamento, no abismo indiferenciado das singularidades impessoais, onde não existem sujeitos a priori. O ser é, em poucas palavras, um produto do caos. A diferença é basicamente simulacro que nos situa em um espaço descodificado, liso, que nos conecta a exterioridade de nós mesmos através das coisas, onde somos meros estetas de nossas próprias vidas.

Parafraseando Deleuze em Logica do Sentido, imersos na dupla direção do mundo, vivemos o paradoxo daquilo que destrói o bom senso como sentido único, mas, em seguida, o que destrói o senso comum como designação das identidades fixas em um devir sempre inacabado.  

O mundo contemporâneo é o mundo dos simulacros onde as identidades são simplesmente simuladas subvertendo seus próprios modelos. Pensando em Platão, cabe dizer que a diferença começa a sair de sua caverna e deixa de ser um monstro.





quinta-feira, 9 de agosto de 2018

IGNORÂNCIA


A EXPERIÊNCIA DO MUNDO

A distinção entre o sensível e o inteligível é um equívoco da razão representativa, do falso jogo do Ser e do devir. A experiência da existência é diluir-se entre  coisas e processos múltiplos e simultâneos,  em micro e macro processos e experiências de ver e dizer. Mas é através do nada de nossas praticas discursivas que toda a realidade é inventada como consciência e significado, como o acontecer de um sentido que nos consome e ultrapassa. Cada um de nós é incapaz de dar conta da experiência do mundo, das diversas manifestações do nada que preenche de existência tudo que se faz possível como realidade vívida.

terça-feira, 7 de agosto de 2018

BREVE NOTA SOBRE O PENSAR


O QUE É LIBERDADE?


A liberdade não é um fundamento ontológico da condição humana. Em nossa relação com o mundo somos definidos pela necessidade.

A liberdade é uma construção, um artificio, que se confunde com uma ética e uma estética de vida. Desta forma ela modifica o modo como interiorizamos o mundo  como acontecimento, como  fluxo constante de experiências diversas.

Liberdade é elevar a imaginação e a arte a condição de afeto mediante diversas estratégias de des subjetivação

segunda-feira, 6 de agosto de 2018

O QUE SOMOS NÓS? SOBRE FOUCUALT E A HERMENEUTICA DO PENSAMENTO




Uma passagem de Paul Vayne em Foucault: O Pensamento, A Pessoa, nos instiga a pensar as formações históricas e as práticas discursivas que circulam e configuram uma época e sociedade:

“ Em cada época, os contemporâneos encontram-se assim fechados em discursos como em aquários falsamente transparentes, ignoram quais são e até que existe um aquário. As falsas generalidades e os discursos variam através do tempo; mas, em cada época, passam por verdadeiros. De tal modo que a verdade é reduzida a dizer a verdade, a falar conforme o que se admite ser verdadeiro e que fará sorrir um século mais tarde.”

A originalidade da pesquisa foucaultiana está em trabalhar sobre a verdade no tempo sem, entretanto, cair em qualquer forma de relativismo. O sujeito do conhecimento não é soberano, já o sabemos desde Freud e Nietzsche, tal premissa inspira em Foucault uma hermenêutica das práticas discursivas ou estabelece o domínio de uma espécie de “inconsciente do saber” no além dos universais antropológicos.

O discurso se impõe como um a priori histórico configurado por dispositivos de saber/poder, estabelece um regime de verdade que define, em todos os níveis das praticas cotidianas, o verdadeiro e o falso, o possível e o impossível. A ontologia diferencial de nós próprios torna-se neste contexto, parafraseando Paul Vayne, uma exegese histórica de nossos limites, nos permite ousar pensar diferente, em vez de legitimar aquilo que já se sabe.

Trata-se aqui de pensar a atualidade da Filosofia como um trabalho critico do pensamento sobre si mesmo, como uma critica permanente da precariedade de nosso ser histórico.
Afinal, o que somos nós?



sexta-feira, 3 de agosto de 2018

NIETZSCHE E A FILOSOFIA DA VONTADE: UMA RELEITURA

“A filosofia da vontade, segundo Nietzsche, deve substituir a antiga metafísica: ela a destrói e a ultrapassa. Nietzsche acredita ter feito a primeira filosofia da vontade; todas as outras eram metafísica. Tal como a concebe, a filosofia da vontade tem dois princípios que formam a alegria da mensagem: querer = criar, vontade = alegria.”
Guilles Deleuze in Nietzsche e a Filosofia

A crítica contemporânea ao saber e seus territórios disciplinares é uma critica não apenas as relações institucionais de poder que ele engendra. É também uma recusa de suas técnicas do dizer/verdade ou, mais especificamente, da teoria da representação. É através dela que se estabelecem os assujeitamentos, a adequação dos indivíduos a práticas discursivas que materializam uma normatização da vida e configuração artificial da realidade, que nos são impostas meta narrativas que funcionam como um conjunto de forças, como um dispositivo. Atribuir sentido, interpretar signos e símbolos, desta forma,tem se confundido desde o Platonismo, com o esforço social de engendrar modos de vida e valores que nos conformam ao rebanho. O conhecimento é visto como o dizer verdadeiro e, por isso, ungido a condição de norma e arbitro de relações de poder ou de controle pelo seu valor de verdade, pela capacidade de organizar a sociedade, a partir do critério do verdadeiro e do falso.
Uma filosofia da vontade, tal como proposta por Nietzsche, destina-se, ao contrário, a criar vida, a elevar-se ao poder do falso, da arte, da criação de novos valores, que estabelecem o devir ativo como identidade criadora do poder e do querer que apontam para novas formas de vida.




PÓS HISTÓRIA


quinta-feira, 2 de agosto de 2018

O PROBLEMA DA SUBJETIVAÇÃO NA CONTEMPORÂNEIDADE




A obra tardia de Foucault inaugurou o horizonte de uma ontologia histórica quando nos dois últimos volumes de sua História da Sexualidade e ao longo dos seus últimos cursos no Colege de France, ocupou-se do modo como nos tornamos sujeitos através das praticas discursivas (saber) e de poder que constituem o cuidado de si na cultura ocidental.

Mas são as implicações contemporâneas de suas pesquisas que aqui me interessam. As estratégias de subjetivação estão condicionadas as formações históricas, a dispositivos historicamente construídos para produção de sentido em cada sociedade. Mas na contemporaneidade a subjetivação já não mais se confunde com o assujeitamento, com a constituição de  identidades. Subjetivação pressupõe hoje uma diferenciação ilimitada, aponta para desterritoriarizações, linhas de fuga e reterritoriarizações que passam pela vertigem do estranhamento, por uma diferenciação radical dos códigos sociais vigentes e a busca por novas “formas de vida” ou intuições de outra existência possível. Há na contemporaneidade novas potências condicionando a relação de cada um de nós consigo mesmo que apontam para uma condição de indeterminação. O que se perdeu foi a identidade entre sujeito e verdade permitindo a subjetivação instituir-se como um campo aberto de experiências e experimentações. 

Mas como podemos ser livres e praticar liberdade em uma sociedade onde aflora uma verdadeira anarquia simbólica, onde não há mais a referência de um sujeito soberano e unioversal? Como podemos ainda dizer o que é liberdade quando já não partimos mais da referencia moderna de um eu abstrato capaz de produzir o mundo a sua imagem e semelhança, como um espelho que configura sua auto imagem? Já não há jogos de verdade, qualquer enquadramento moral, que defina as práticas e técnicas de si. Há um sentimento de inquietação, uma compulsão a se expressar contra um mundo cada vez mais hostil e ilegível a consciência diferenciada. O que pode ser dito com alguma segurança é que o que estamos buscando em meio a tudo isso ainda não tem nome.... Talvez, passe por uma releitura do conceito de individuação desenvolvido por Jung e que pressupõe uma coincidência entre o sentido e o não sentido, entre o ser e o extra ser da experiência arquetípica. É a forma-homem que nos parece ultrapassada no sentimento de exterioridades, de um lado de fora.