quarta-feira, 16 de maio de 2018

DEVIR E NÃO IDENTIDADE



Não sei mais quem eu era e muito menos o que posso me tornar. Todo o devir que é minha existência conduziu a este impasse, a uma despersonificação que desvela, no ato da linguagem, um lado de fora onde o caos se infiltra como um absurdo ontológico.

Trata-se também de uma experiência, onde o corpo, o ambiente e o sentido nivelam-se. A indeterminação deste acontecer é onde a vida escapa a existência.  

O TEXTO COMO TERRITÓRIO DE SENTIDO


As palavras marcam,
Transformam o branco da folha
Em território de sentido.
Mas não são um dizer das coisas.
São um acontecimento linguístico,
Um fato abstrato,
Que nos surpreende como pensamento.
O sentido não está no texto,
Mas em nós mesmos.
Ele extrapola o dizer.
É um lugar abstrato
Onde habitamos mundos
Que não existem.

terça-feira, 15 de maio de 2018

CONSTATAÇÕES



Hoje amanheci pequeno,
Incrivelmente espantado comigo mesmo.

A vida transborda,
Não cabe em qualquer pensamento,
Mas cresce nas imaginações.

Tudo acontece em todos os tempos.
O presente é um passado que cresce futuro.

Não passo de um ponto estático
Em uma paisagem em movimento.

segunda-feira, 14 de maio de 2018

A DECADÊNCIA DO PENSAMENTO





Não há mais uma obra a ser escrita. Escrever já não se inscreve em um plano de referencias conceituais e sistematizações narrativas tendentes a verdade. Não há mais um real a ser desvelado, explicado ou analisado. Não há mais autoridade nas disciplinas ou dignidade no saber e seu jogo normativo. Não há mais poder nas palavras. O conhecimento se converteu em informação, em opinião mimetizada ou, no melhor dos casos em maquinaria técnica para o gosto dos que precisam de princípios e orientações. Não é mais tempo de pensar. O individuo emancipado pela razão foi o breve sonho de um século distante. Jamais pôs os pés na terra prometida do progresso. Vivemos agora a margem de qualquer representação convincente das coisas. A vida tornou-se transparente e epidérmica.   



A VELOCIDADE DAS PALAVRAS


A velocidade das palavras é tangível no acontecer da leitura. O texto tem um ritmo, é movimento. Ás vezes parece um organismo vivo. Mas quase não sei o que é o texto e a experiência de ler, pois não me percebo dentro dos enunciados. Eles acontecem quando eu não aconteço, onde não há substância.

A compreensão, o sentido, é um desvelar-se de uma matéria invisível. Existe algo dentro das palavras que não são as palavras. É preciso ter esta intuição para perceber o quanto elas são rápidas e fogem dos olhos. Toda narrativa acorda sensações físicas, apercepções; engendra duplos.

Não há representação. Existe um lado de fora dos significantes e dos significados, uma espécie de epiderme esvoaçante, um fantasma, que é a própria materialidade da narrativa.

A velocidade das palavras é perceptível onde não há temporalidade, onde o próprio leitor desaparece no acontecer da leitura, que é também um re acontecer da narrativa como espaço abstrato de experiência. A velocidade é aqui um contrário de tempo, é uma substancia, um atributo do discurso. Uma leitura não tem duração. Ela tem movimento. Mas ela não percorre qualquer espaço. A velocidade é o próprio pensar como experiência do sentido.  


sexta-feira, 11 de maio de 2018

POEMA HERACLITIANO




“Tudo frui como um rio”.
Somos e não somos no fluxo.
Na coincidentia oppositorum,
No desvelamento da essencial incerteza
Do ser e do não ser através do devir.

Existimos além do bem e do mal
No mais arcaico futuro
Onde a vida escuta a morte
E se perde da eternidade.

Nossa inercia é movimento,
Fogo e imanência.

O PENSAR DOS OLHOS


quinta-feira, 10 de maio de 2018

COORDENADAS GEO FILOSÓFICAS




Procuro um espaço que se faça mais do que um lugar,
Um ponto meta geográfico
Que se torne corpo do meu corpo,
Tempo e pensamento,
Onde eu não seja
E tudo esteja.

Lugar sem forma,
Em movimento...

Onde nada se perca
Em encontros,
Choques e dualismos.

Onde nada aconteça
No se fazer das coisas
E a linguagem nos contenha
Na grande ficção da produção do sentido.


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quarta-feira, 9 de maio de 2018

FANTASMAGORIA E ESCRITA NÔMADE



Há algo que sempre permanece não pensado dentro do próprio pensamento. Algo que acontece como um lado de fora do significado e, entretanto, desenha a nervura do sentido. Trata-se de algo que ultrapassa a forma-homem, que a remove e apaga como campo de intencionalidades, como artificio estruturante de cognição, expressão e  comunicabilidade, eliminado toda causalidade que oprime a escrita, pondo em xeque, portanto, todos os códigos retóricos.

A literatura é o jogo de enunciados privilegiado para esta transcendência da dualidade entre significante e significado por intermédio da linguagem, que nela se volta sobre si mesma, quando foge as normativas do seu próprio campo discursivo. Assim, todo dizer se torna um dizer do que é dito que não se reporta a qualquer objeto. A qualquer norma ou ordem discursiva. Tudo se faz fragmento, simulacro e deserto no acontecer nômade e imaterial de uma narrativa.

segunda-feira, 7 de maio de 2018

TEXTO, SENTIDO E MOVIMENTO

Existe uma veracidade em todo texto literário que não comunica uma verdade, mas a experiência de imagens e afetos. 
É o simulacro como um acontecer do sentido mediante um encadeamento de enunciados. 
A experiência de uma narrativa é seu próprio significado como avesso da realidade. 

O texto é um território através do qual  evadimos, transportamos a existência através da cartografia que é o texto. Ele não nos diz onde vamos, mas nos modifica, torna-se uma ambientação, um acolhimento. 

A leitura é isso: uma experiência de movimento que se dá através de inercias.