sábado, 21 de outubro de 2017

CULTURA URBANA

A vida na cidade é um viver para o exterior. A cidade em suas funções e paisagens abriga a diversidade, o fluxo constante de indivíduos e uma variedade vertiginosa de estratégias de  produção de sentido e atividades. O habitante da cidade  esta quase sempre a céu aberto. O espaço privado, os interiores se acoplam ao cotidiano cidadino quase como um apêndice da vida publica em suas redes de deslocamentos.

Habitamos pessoas e lugares. As ruas são como veias abertas no corpo feminino da Urbes que cada vez menos pode ser definida a partir de qualquer identidade. Sua geografia é o remendo de diversas referencias territoriais e funcionais desenhadas pelas vias expressas que nos levam de uma parte a outra. A cidade é nômade. Mesmo que nosso sedentarismo privado faça parecer o contrário.

A cidade é sempre lugar de comercio de coisas e pessoas, de fluxos e representações.  A cidade é essencialmente movimento. Dentro dela nos sentimos pequenos, insignificantes na multidão.  Sabemos que sempre estamos sendo observados, reconhecidos pelo enquadramento simbólico e não por quem somos. No espaço urbano ninguém é ninguém. Tudo é imediata geografia simbólica, espetáculo e simulacro.


SOBRE OS LIMITES DO CONHECIMENTO

“Armamos para nós um mundo, em que podemos viver-ao admitirmos corpos, linhas, superfícies, causas e efeitos, movimento e repouso, forma e conteúdo: sem estes artigos de fé ninguém toleraria agora viver! Mas com isso ainda não são nada de demonstrado. A vida não é argumento; entre as condições da vida poderia estar o erro.”
F. Nietzsche in A Gaia Ciência

O uso do conhecimento é diferente da crença no conhecimento.  Posso valorizar um determinado saber sem lhe converter em uma chave absoluta de compreensão. Meu modo de codificar a realidade não reduz o conhecimento em um filtro e instancia de julgamento.  O toma mais como um instrumento do que como  uma espécie de revelação.
Não é prudente reduzir o mundo aos enunciados de qualquer forma de conhecimento filosófico ou cientifico.  Deve-se  mesmo descartar o ideal de um domínio racional absoluto da realidade, pois a realidade não pode ser reduzida a razão.Não existe um mundo verdade a ser revelado a nossa consciência. Toda imagem de mundo e realidade é um capricho sempre provisório da imaginação.


PROBLEMA EXISTENCIAL

Adivinho o que sinto através do saber das coisas.
Mas tudo que sei é incerto, raso e abstrato.
Apenas o que vivo é concreto,
Mesmo que ilegível dentro do que sinto.
Estou perdido em um dilema abstrato
Onde saber e sentir engendram o querer
Como fácil resultado de uma falsa equação.

Penso porque sinto onde não existo.

terça-feira, 17 de outubro de 2017

DUALISMO

O corpo acontece
entre a reflexão e o reflexo,
inventa o ato
abstrato e concreto
de sua própria ilusão
quando resume em si mesmo
todo o possível da realidade
entre razão e desrazão.

OS LIMITES DA LINGUAGEM

Sigo onde não há sujeito ou objeto. Apenas o devir de imagens, afetos e representações abstratas.
Sigo onde tudo é imperfeito...
A consciência é precária e se perde nos abismos da linguagem, nas falhas do meu dizer pequeno.
Conceitos  e representações são como bolas de sabão. 
Os discursos são paisagens, geografia existencial.
A narrativa é o lugar nenhum da existência como espelho de um corpo vivo.
Por isso pouco me importo com tudo aquilo que pode ser dito.

segunda-feira, 9 de outubro de 2017

O PROBLEMA CONTEMPORÂNEO DA AMIZADE

O cuidado com o outro é indispensável ao cuidado de si. Por isso não é de surpreender o lugar fundamental que a amizade ocupa na obra tardia  de Foucault. Em sua reflexão sobre sexualidade ele vai além da dicotomia entre eros e philia  e estabelece uma ética da amizade que ultrapassa a perspectiva individual, a centralidade do sujeito e do egocentrismo, avançando para  praticas de subjetivação baseadas em  novas modalidades relacionais não normativas. Tal tema , que remonta a antiguidade, portanto, também afeta relacionamentos héteros, embora no último volume da História da Sexualidade tenham privilegiado o  homossexualismo. Afinal, a reflexão de Foucault aponta para uma nova forma de sociedade não centradas  no erotismo.

Se os vínculos orgânicos definidos pelas relações sociais comunitárias baseadas no funcionalismo de personas hoje já não fazem mais sentido, a amizade emerge  como um campo de experimentações de vínculos estabelecidos pelo prazer e, ao mesmo tempo, como reabilitação da sociabilidade enquanto construção de si e de uma “cultura de existência”, como uma nova ética que despersonificando os sujeitos inventa a vida como o desafio do inédito.

A amizade não é uma relação privada, mas um campo de circulação de significados e sentidos coletivos onde cada um de nós inventa o outro como parte de si mesmo.



sexta-feira, 6 de outubro de 2017

AGENCIAMENTO E IMANÊNCIA

Em Deleuze o conceito de agenciamento entrelaça um regime de signos com um conjunto de relações materiais correspondentes. A existência, enquanto imanência, acontece através de variados  agenciamentos sociais definidos por códigos específicos. Todo agenciamento remete ao campo do desejo, sob o qual se constiui na polaridade entre a forma de maquina abstrata (instituições) e das relações de força. Os agenciamentos produzem os enunciados que são um jogo do fora de nós, do coletivo. Assim, não existe sujeito do enunciado.
Como Deleuze define em seus Dialogos com Claire Parnet

“O que é um agenciamento? É uma multiplicidade que comporta muitos termos heterogêneos e que estabelece ligações, relações entre eles, através das idades, sexos, reinos - de naturezas diferentes. Assim, a única unidade do agenciamento é o co-funcionamento: é a simbiose, uma ‘simpatia’”.

Como experiência da imanência os agenciamentos assim se caracterizam:

"Segundo um primeiro eixo, horizontal, um agenciamento comporta dois segmentos, um de conteúdo, outro de ex­pressão. De um lado ele é agenciamento maquínico de cor­pos, de ações e de paixões, mistura de corpos reagindo uns sobre os outros; de outro, agenciamento coletivo de enunciação, de atos e de enunciados, transformações incorpóreas atri­buindo-se aos corpos. Mas, segundo um eixo vertical ori­entado, o agenciamento tem ao mesmo tempo lados territo­riais ou reterritorializados, que o estabilizam, e pontas de desterritorialização que o impelem." 

Não há fronteira definida entre o subjetivo e o mecânico 

na abstração do agente que intervém no mundo, que 

estabelece seu contorno através da construção do 

sentido, através do vagante de mutações imagéticas que

 nos configuram em meio ao devir coletivo como 

territorialização constantemente impelida a sua própria 

transcendência.




Todo desejo é maquinado ou agenciado revela o 

estatuto paradoxal de qualquer acontecimento possível. 

Como apontado no inicio, o agenciamento remete a uma 

reciprocidade entre a 

forma do conteúdo (regime maquínico) e a forma de 

expressão (regime de signos).

A INFORMAÇÃO COMO CONTÁGIO E OPINIÃO

“ Os cegos  não querem admitir  que eu tenha olhos, e os surdos dizem que sou mudo.”
“As verdadeiras verdades são aquelas que se pode inventar.”
Karl Kraus in Aforismos

O comercio das opiniões obedece ao princípio da afinidade. O familiar atrai o familiar de modo que as opiniões não se comunicam  entre si. Apenas se replicam como uma espécie de vírus cuja a logica é o contágio e sua expansão incondicional.

A possessão por opiniões é um dos males da era da informação onde o real, como bem percebeu Baudrillard, deu lugar a hiper realidade e ao virtual que nos pensa.


O próprio pensamento já não pensa, convertido ao mimetismo de opiniões que circulam em busca de hospedeiros. Cada um de nós e o seu meio de expansão e sobrevivência. Somos todos suas vitimas.  Como na peça de Ionesco, nos tornamos rinocerontes diariamente no fluxo de informações. Mas não nos damos conta disso. Ainda  nos iludimos com o Cogito. 

quinta-feira, 5 de outubro de 2017

CULTURA CONTEMPORÂNEA

A visibilidade dos artefatos de cultura define o consumo de simulacros que nos configuram a consciência das coisas. Os usos do corpo e do espírito adquirem formas abstratas e imprecisas no fluir de nosso existir nômade.

Já não buscamos qualquer grande objetivo, qualquer perspectiva, que não seja maior do que o simples dispor de si mesmo entre os outros. Queremos sobreviver e colecionar um pouco de prazer. Nisso se resume tudo aquilo que nos define provisoriamente nos dias do agora.


Não me perguntem mais quem eu sou. Pois eu existo como uma função das coisas, como instancia de significação. Sou um objeto, talvez uma coisa, um corpo estranho na geografia da existência. Sou apenas meu próprio lugar de construção de símbolos e sentidos. Eu sou apenas um lugar.

A VERDADE DO SUJEITO

O sujeito tornou-se  erroneamente a medida de todo o saber possível. Como portador do sentido, arquiteto de significações formatadas por uma codificação epistemológica que o antecedem, ele inventa a si mesmo  como elemento do próprio discurso. Mas o sujeito é virtual, ele é um não lugar, funciona como um paradoxo da linguagem. 

O eu que escreve estas linhas é uma ilusão. Me procurem  onde eu não estou, pois é lá que sempre poderei ser visto. Desde o princípio estive condenado a inventar minha própria destruição.