segunda-feira, 10 de julho de 2017

A IMPESSOALIDADE DA ESCRITA

Escrever nunca deve ser uma escolha, mais uma compulsão, uma “doença saudável” que nos mantem alguma saúde contra o devir do mundo e as insuficiências da realidade.  Nenhum bom escritor escreve por prazer ou para realização pessoal, mas movido por sua debilidade pessoal. É ela que o conduz a um deslocamento do próprio rosto através de uma narrativa.


Escreve-se sobre grandezas impessoais, nunca sobre si mesmo. O próprio ato da escrita é um transbordamento de si mesmo através destas grandezas: sociedades, culturas, ideologias, gênero, crime, ficção, psicologia, comportamento.... Ninguém é nada disso.  Quando se opina sobre qualquer tema, estamos simplesmente desaparecendo na adesão a uma corrente de opinião.

 A palavra é justamente o lugar onde não estamos, onde não somos, em permanente deslocamento.

quinta-feira, 6 de julho de 2017

FILOSOFIA PARA JOVENS

É preciso aprender a pensar ao ar livre,
Sem o peso dos conceitos,
Dos vícios da tradição.
A verdade é um engodo.
Pensar é apenas um jogo
Onde nos sonhamos senhores
De nossas representações do mundo.
Mas o que mais somos
Além de tristes escravos de nossas convicções?
A liberdade existe apenas no efêmero,
Em seguir do nada ao  nada,

Como se viver fosse um inocente divertimento.

SOBRE ERROS E ENGANOS


Errar é diferente de cometer enganos. Mesmo que, aparentemente, em ambos os casos sejamos vitimas de equívocos. Um erro é uma imprecisão, mas um engano é uma convicção. Não se deve confundir as duas coisas.

Errar é inebriar-se com a  verdade a ponto de sucumbir aos seu encantos sem atentar para suas contradições. O engano é tomar o falso pelo verdadeiro. O ultimo pode ser  um momento do primeiro. Mas entre as duas situações existe uma sutil diferença.


Nossa vocação para crença, seja de qualquer natureza, nos faz não perceber a diferença   e nos mantém escravos de ambos.

terça-feira, 4 de julho de 2017

FLUXO VIRTUAL


Meus olhos cansados contemplam a tela,
O fluxo de imagens, símbolos,
estímulos, prazeres e signos
Que nos inventam a realidade.
Não concluem nada
Perante o hipnótico plano
Da quarta dimensão virtual.
Meus olhos cansados tocam pensamentos,
Acordam imaginações.
Aprendem que tudo é puro fluxo
E movimento.

segunda-feira, 3 de julho de 2017

AS METAMORFOSES DO REAL

Somos consumidores obesos de informação. Diariamente configuramos e reconfiguramos nossa imagem de mundo através da leitura diária de jornais, telejornais e, cada vez mais, através da  tela do computador, como espelho distorcido da existência coletiva. Informação e opinião importam agora mais do que os fatos.

O mito do conhecimento como artifício de domínio objetivo da realidade foi desmentida pela sua própria realização. Quanto mais sabemos menos somos capazes de entender e mais nos tornamos aptos ao esquecimento coletivo, pois o acontecimento já não marca o compasso do tempo, mas sua própria banalização como devir incontrolável do acontecer humano. A morte do real e a era do hiper real, advogada por Jean Baudrillard, é cada vez mais nítida no horizonte cognitivo contemporâneo.

A questão é  tentar antecipar as novas formas de linguagens e codificações de mundo que  podem emergir neste cenário de virtualização das gramaticas cotidianas. Mesmo que o projeto de uma civilização baseada em coletivos inteligentes e virtuais de Pierre Levy seja  uma aposta demasiadamente otimista. O que parece indiscutível, entretanto, é que a ideia de realidade, mesmo na mais inocente das hipóteses, está mudando.

sexta-feira, 30 de junho de 2017

A DECADÊNCIA DO LUXO E DO BOM GOSTO

A volúpia culinária e o bem vestir, a economia do superficial, é ainda uma peça importante do jogo social. A aparência permanece como um artifício de prazer e prestigio. Mesmo que em uma sociedade de consumo o uso de tal artifício não seja mais  um privilegio, uma forma de distinção, mas uma lei comum e banal a qual a grande maioria, dentro de suas possibilidades, procura obedecer. 

O  uso do luxo e do bom gosto é uma forma de simular a alegria de viver, quando ela já não é mais possível de outra forma que não passe pela simulação, pelo registro virtual e  compartilhado. Cada um de nós  inventa seu próprio simulacro reproduzindo aquilo que acredita que a vida deveria se como exibicionismo e exposição de um tipo ideal de ilusão.


quarta-feira, 28 de junho de 2017

EM ESTADO DE ESBOÇO

Não estou pronto para o futuro.
Tenho ainda alguns passados pendentes,
Desejos interrompidos
E vazios existenciais que me afastam
De mim mesmo.
Sou qualquer versão interrompida
de um eu possível
que ficou pelo caminho do tempo.
Não sou passível de conclusões.


A PÓS VERDADE ATRAVÉS DA PÓS MODERNIDADE

Tenho muito medo da felicidade,
Do meu querer embriagado
Guardado em segredo contra a sociedade.
Tenho muito medo da minha vaidade,
Das minhas certezas
E versões casuais e cruciais dos fatos.
A verdade é um veneno

Que alimenta certezas vãs.

segunda-feira, 26 de junho de 2017

LINGUAGEM E EXISTÊNCIA

É no plano da linguagem e das estratégias discursivas que as escolhas individuais podem se realizar. É também através dela que o mundo existe como significado e processo teleologicamente orientado.  Podemos mesmo falar de uma estética da percepção definida pelo ato linguístico. Pois a condição humana é, em grande medida, um modo de percepção das coisas através de uma consciência radicalmente diferenciada do inconsciente. Deste modo, existe uma relação radical entre consciência e linguagem que condiciona a percepção. A própria vivência de uma experiência só adquire um conteúdo, um significado, quando esta experiência adquire uma realidade como um conjunto de  enunciados e preposições.


A DECADÊNCIA DA OBJETIVIDADE

A objetividade tornou-se uma caricatura da possibilidade de significação do mundo vivido. Transcendemos o factual através da economia de imagens, impressões virtuais e fragmentação de nossas experiências cognitivas. Contra qualquer tendência totalizante e racional da simples impressão da realidade, afirmamos a descontrução do sujeito através da decomposição do objeto.

Lembrando Baudrillard,

“É isso que chamo de ironia objetiva:  existe uma forte probabilidade, quase uma certeza,  de que sistemas  serão desfeitos  por meio de sua própria sistematicidade. Isto é verdadeiro  não apenas para estruturas técnicas mas também para estruturas humanas. Quanto mais estes sistemas  políticos, sociais e econômicos avançam em direção a sua própria perfeição, mais eles se desconstroem.  Isto é muito claro no campo da mídia e da multimídia, onde, por causa de um excesso de informação, perdemos o acesso  a informação real e aos acontecimentos históricos reais.”
 Jean Baudrillard . A ilusão vital. RJ: Civilização Brasileira: 2001, p. 85

A História foi superada pela imaginação virtual, pela virtualização das épocas,  estilos de vida e pela afirmação constante da economia simbólica de nossas  simulações de existência. Isso vale para todas as dinâmicas da reprodução social da  vida.