quarta-feira, 21 de junho de 2017

IMAGINAÇÃO E EXISTÊNCIA

É cada vez menos possível a descrição de nós mesmos como lugar do acontecer da vida. Somos cada vez menos, através da introjeção de certos papeis sociais configurados por determinada época e formatação cultural, promotores de ações e transformações cotidianas da existência comum. Consequentemente, nos descredenciamos como sujeitos produtores de nós mesmos e nos reduzimos a consumidores de imagens impessoais que se replicam em variadas formatações  na circulação de ideias, emoções e angustias, através de todas as formas de mídia e narrativas. Nos tornamos receptores e reprodutores de imagens-sentido. 

UM LIVRO

Um livro é um objeto que quase nunca se resume aos seus próprios enunciados. Ostenta o nome do autor, a relevância do tema e as inquietudes do leitor. Muitas vezes diz menos do que  promete e se esconde em suas próprias paginas.

Um livro nunca é apenas um livro quando prova o sabor de diversas edições. Ganha, assim, sua própria historia, inventando memorias nas estantes e enfeitando nossas imaginações.

Mas um livro só vale a pena quando mais do que uma boa leitura acorda novas palavras na cabeça da gente, perpetuando-se como um texto .

Um livro, entretanto, também pode ser um objeto mudo.


terça-feira, 20 de junho de 2017

BOA LEMBRANÇA

Do ontem ficou um pouco,
Um gosto de sonho perdido
Que me inquieta
As margens do agora e sempre.

Fui preenchido por um bom momento,
Por um sopro, um movimento,
De existência intensa
Que não cabe no abismo
Da simples rotina.
Estar vivo é surpreender-se.


NOTA SOBRE O TEMPO PRESENTE

O tempo de agora é puro devir em sua enganosa regularidade. Posso senti-lo escapando, se transmutando em constantes variações de si mesmo. Paradoxalmente ele é constante, através do passado e do futuro.

Talvez o presente não passe de um tempo verbal, do ato e do fato em estado bruto, sempre se perdendo ou nos escapando na dissolução do absoluto de cada instante.


domingo, 18 de junho de 2017

NA CONTRA MÃO DA MULTIDÃO

" Um dos traços do Escravo é seu desejo de conformidade, sua vontade de estar ao lado do numeroso, da massa e dos grupos. Sozinho, ele está perdido. Ele quer o calor animal dos discípulos, os vapores da concentração e do espírito gregário. O mimetismo, eis sua qualidade essencial. Quando o hiperboriano evolui na mais franca das altitudes, o homem das multidões apodrece nos buracos da unidimensionalidade."

Michel Onfray in A sabedoria Trágica: Sobre o bom uso de Nietzsche

Aquele que anda sempre entre muitos não sabe distinguir a própria voz do coro da multidão. Nem mesmo conhece seu destino e as vontades do próprio coração.

Aquele que anda sempre entre muitos é puro  mimetismo.  Esta entre todos porque é ninguém. Vive significando o mundo sem tocar o não sentido da sua própria existência.

Apenas no abrigo da solidão pode alguém, dialogando com a própria sombra, vislumbrar o abismo de seus dias e a plenitude da ilusão de sua existência.

sexta-feira, 16 de junho de 2017

FILOSOFIA DO NÃO SER II

No mercado contemporâneo das ideologias, o niilismo é mercadoria do mais alto valor de uso. Pois denuncia a nulidade de qualquer certeza, eliminando toda concorrência. Não há valor de troca na verdade. O vazio é a medida do desvalor de todos os enunciados com pretensão a verdade.
O próprio niilismo é uma não verdade....

FILOSOFIA DO NÃO SER

Desde Platão somos assombrados pela metafísica da verdade e atormentados pelo fantasma do bem e do justo. Somos obcecados pelo significado, pelo imperativo do Ser. Resistimos ao não sentido, a consciência da nadificação, do paradoxo da simples indeterminação de nosso estar presente no aqui e agora, quando somos apenas silêncio. Nenhum ideal ausente sustenta nossa ilusão presente. Apenas não somos através de tudo aquilo nos afirma a existência e sentimento de mundo.

quarta-feira, 14 de junho de 2017

SOBRE A COMPLEXIDADE DO TEMPO PRESENTE

O conceito de tempo presente sempre me pareceu uma questão complexa. Afinal, ele comporta a coincidência (simultaneidade) de formatações e referências culturais diversas, camadas de  significações e referências que extrapolam o imediatismo do agora e o tornam contemporâneo de conteúdos simbólicos e psicológicos  que atualizam passados e, em alguns casos, insinuam futuros. Há uma sincronicidade de tempos e vivencias no mero acontecer do presente que transcende a linearidade cronológica. Fato que não deve surpreender ninguém dada a pluralidade de condições culturais que coabitam em uma mesma época.

Essencialmente, o tempo presente é devir e movimento de consciência. Como tal ele é ação e não um atributo abstrato dos fatos . Ele não  se identifica com um conjunto de formatações culturais  efêmeras e “presentistas” que em hipótese definiriam a contemporaneidade como ethos de uma determinada época. Afinal, ele também atualiza e dialoga com o passado.

Na medida em que as tecnologias digitais engendram uma nova experiência de mundo e sensibilidades a própria contemporaneidade passou a envelhecer constantemente e freneticamente apontar para versões mais complexas de si mesma.  O contemporâneo tornou-se indeterminado, praticamente um estar em movimento, deslocando de modo agudo nossos enraizamento em identidades e padrões de experiência cotidiana de mundo e existência.  

segunda-feira, 12 de junho de 2017

DESLOCAMENTO EXISTENCIAL

Sonhava com a transparência imanente de um eterno presente,
Apostava no ato perpétuo de se saber através do espelho
Contra todos os limites da realidade.
Queria confundir-se com seu próprio reflexo
Até não saber mais de si mesmo com precisão.
Precisava esvaziar-se de suas certezas e pensamentos,
Adentrar o escuro de suas duvidas
E o abismo de seus limites.
Vivia a perplexidade de saber muito pouco sobre si mesmo
E se afogava na ansiedade de não se reconhecer
Nas paisagens de sua própria vida.
Não queria mais não ser naquele rosto  que demasiadamente era.

     

DISCIPLINA E UTOPIA

Resultado de imagem para DERRIDA

A  norma como princípio de uma sociedade disciplinar  estabelece a normalidade e a ordem como meta de instituição de psiquismos. Busca a indiferença a qualquer autonomia comportamental, a qualquer vestígio de individuação  ou vontade de potencia.

Gostamos de enunciados em forma de slogans, de meta narrativas totalizantes  e apostas vazias em qualquer forma ideal de existência projetada em algum futuro hipotético. Recusamos a todo custo o reconhecimento das contradições estruturais do nosso modo de construir a realidade a partir de imperativos morais e fundamentalismos ideológicos.


Aceitamos um mundo no qual não nos reconhecemos  por que nos tornamos sua própria sombra.