terça-feira, 16 de agosto de 2016

MEMÓRIA DA PÓS IDENTIDADE

Minhas lembranças não valem  um instante de agora,
Não valem as marcas das perdas sofridas,
As saudades e as vontades quebradas
Cujos cacos se espalharam  pela realidade.

Como pesa a memória sobre os meus  ombros....
Quase tornam viver indesejável a sombra de tanto passado.
Mas o futuro não me proporcionará  mais do que ontem.

Tudo que me resta agora é inventar quem fui

Para saber onde estou e depois me esquecer.

INTENCIONALIDADE

Desconheço a vontade que me conduz adiante,
Que me faz tentar enxergar mais longe
Até o ponto de me perder do chão.
Mas ela me move e faz acontecer à vida
Apesar de todas as minhas inercias.
Quase não penso nela.
Apenas deixo que ela aconteça
Como uma segunda pessoa
Dentro do meu corpo
Inventado outras teleologias.
Não tento antecipar o significado dos meus atos,
Nem imprimo grandes intenções ao exercício da minha vontade.
Na maior parte do tempo apenas aconteço.


segunda-feira, 15 de agosto de 2016

INDIVÍDUO E LINGUAGEM

Nossas habilidades cognitivas não são inatas, mas uma consequência do domínio da linguagem e da capacidade de abstrações simbólicas. O que é o mesmo que dizer que o que torna o pensamento possível é a linguagem. Pois ele acontece através de  seu exercício.

Mesmo considerando que cada ser humano nasce com uma capacidade minima para interpretar e interagir com os estímulos do mundo exterior a partir de certa intencionalidade rudimentar, cabe ponderar que sem a base logica conceitual do pensar intencional mais sofisticado, não é possível estabelecer uma imagem de mundo que torne a realidade  inteligível a partir de alguma crença instrumental.

A possibilidade da ação, a  racionalização ou direcionamento objetivo da vontade através de escolhas, pressupõe a interiorização de uma imagem consensual de realidade no plano linguístico.

 Mas isso não significa que somos formatados por simulacros racionais em nossa relação com a realidade. O componente subjetivo, a fantasia, insere-se em nosso aparato cognitivo de modo privilegiado. Caso fizéssemos a diversas pessoas provenientes de lugares diferentes, e com variados graus de instrução e histórico vivencial,  diversas sobre perguntas abstratas como o sentido e o significado da vida , obteríamos respostas provavelmente peculiares a cada um.
 A forma  como estabelecemos uma leitura pessoal da realidade, mesmo compartilhando um só  instrumental linguístico cognitivo, aponta para o fato de que cada personalidade é um arranjo  único de consciência.  

Somos corpo, voz e palavra. Isso define nossa singularidade enquanto indivíduos, nosso modo próprio de acontecer no mundo. Mas, ao mesmo tempo, por si só, não é isso que nos proporciona distinção ou assegura a singularidade. Pois esta se estabelece na relação com os outros na medida em que compartilhamos um arranjo singular de realidade e de mundo, uma forma própria de codificar o real.


sexta-feira, 12 de agosto de 2016

ANTI DOGMATISMO

Já não carrego grandes verdades no bolso.
Nem mesmo tenho uma carteira de identidade.
Estou farto de princípios e definições.
Quero ser livre do peso de todas as certezas
E não ter qualquer compromisso com as boas opiniões.
A vida não cabe em qualquer pensamento
E preciso de algumas duvidas
Para respirar liberdade.
Não sou destes que vivem binários
Oscilando entre o sim e o não.



terça-feira, 9 de agosto de 2016

A INDETERMINAÇÃO DO DESTINO


Não sei se existe liberdade nas pré fabricadas escolhas que moldam meu cotidiano, meu destino e possibilidades. As circunstancias sempre definem a vida, Mas  não determinam  o que sinto. Como todo indivíduo eu porto a possibilidade do inesperado, do inédito que pode de repente mudar o rumo de todos, reescrever o cotidiano e sorrir ao futuro.

Não se trata aqui de livre arbítrio, mas da invenção de si mesmo como uma equação complexa de variáveis diversas. Mesmo quando a realidade fala mais alto do que o desejo, há sempre a opção do  degredo em sonhos e devaneios que nos conduzem além de nós mesmos.

Por isso categoricamente me oponho a todos os determinismos e absolutismos. Não sou um dado objetivo, mas uma auto invenção e reinvenção constante de mim mesmo. Minha mente é a medida de todas as coisas...

segunda-feira, 8 de agosto de 2016

PARA UMA FILOSOFIA DO CORPO

As  manifestações  linguísticas de nossas vivências privadas são banais, mesmo quando pretendem profundidade.   Falo aqui da publicidade cotidiana  de um “eu” que não se realiza no jogo semântico . Sempre guardamos  algum voluntário ou involuntário silêncio quando falamos  sobre nós mesmos. Não há como fugir disso, pois o próprio “eu” do discurso se edifica a partir de indeterminações e fronteiras ontológicas.  Entre o biológico e o artifício cultural este eu se afirma a margem da natureza, revela nossa incapacidade de codificar a realidade enquanto totalidade de fenômenos abstratos inscritos em um corpo vivo inspirado por pulsões. Sempre nos movemos no campo das idealizações abstratas e parciais.

Assim, é preciso que se diga, que a saúde física é mais essencial do que qualquer  representação ideal  de felicidade. Mesmo quando infelizes, é essencial a manutenção de nossa integridade física, pois dela sempre depende a possibilidade de nosso acontecer no mundo. Claro que um corpo no pleno gozo de suas funções não nos torna mentalmente saudáveis ou garante uma existência criativa e fecunda.


O corpo é a medida de tudo aquilo que somos, o meio, o fim e o principio de nossa condição humana. Cada um é em todos os sentidos seu corpo e, através dele, sua voz entre os outros como testemunho de sua singularidade e ação. O próprio pensamento torna-se um fenômeno físico através de nossos atos.

quarta-feira, 3 de agosto de 2016

CORPO E SIGNIFICADO

A fala e o pensamento reinventam o corpo
Através do significado que traduz o gesto,
O movimento de ser para o outro do mundo
Na mera expressão de mim mesmo.

Toda a condição humana
Não passa de um ato linguístico
Onde a vida se define como envolvimento,

Ato e relação.

Do eu ao outro...
aconteço.

terça-feira, 2 de agosto de 2016

POESIA É APENAS POESIA

É certo que a poesia nunca mudará o mundo.
Poemas não  corrigem erros
Ou transformam a realidade.

Poemas são apenas poemas;
Mas são mais que palavras...
Há algo neles que nos preserva da vida,
Dos absurdos e silêncios da realidade.

A poesia não muda o mundo,
Mas transform palavras
E, quem sabe,
inventa um pouco as pessoas.


HANNAH ARENDT E A DIGNIDADE DA POLITICA

“Essa falta de significado não é um problema inventado. É um fato real que experimentaríamos todos os dias se nos déssemos ao trabalho de não apenas ler o jornal, mas também, por indignação com a balbúrdia em que se transformaram todos os problemas políticos, de levantar a questão de como, dada essa situação, as coisas poderiam ser feitas de forma melhor.”

ARENDT, Hannah. A Promessa da Política. Rio de Janeiro: DIFEL, 2008.

Qualquer intervenção em um mundo comprometido em suas significações deve recusar o terreno das idealizações e utopias sociais. Mais do que isso, deve partir do banal, da micro realidade do existir cotidiano, para recodificar o mundo que existe em cada indivíduo. Pois a simples manutenção da existência privada e o consumo de bens aprisionou o eu a suas próprias imagens, o afastou do plano da ação politica ao colocar-se no centro de nossas preocupações coletivas.


Quando o ciclo produtivo se tornou a suprema preocupação da sociedade moderna  a politica deixa de garantir a vida em seu sentido mais amplo, parou de se ocupar do mundo e se degenerou na simples consideração da produção e reprodução material da existência, afastando-se de qualquer ideal de liberdade.


A CONDIÇÃO PÓS MODERNA E O FLUXO DO AGORA

A imersão na contemporaneidade, no moderno como imediato agora onde o simples instante se faz eternidade submergindo a consciência, é o que nos induz ao transe da inflação de todos os cinco sentidos.

Tudo que importa é o fluxo frenético do raso de experiências que inventam subjetividades desfocadas.

A tradição e a verdade apodrecem na geladeira da História enquanto cozinhamos o futuro em fogo brando.

Nada mais importa muito, nem mesmo nossas vidas presas no espelho.