segunda-feira, 14 de abril de 2008

CRÔNICA RELÂMPAGO XXIV


Há algo de inevitavelmente limitado em todas as nossas considerações sobre as coisas. Algo que pressupõe a maior ou menor “eficácia” de nosso auto sentimento de mundo nas constâncias e variações do ato de viver.
Falar sobre tal limitação é perceber também a pequenez de nosso mínimo universo vivido frente à vastidão do mundo que nos cerca e suas possibilidades e diversidades infinitas. Nesse sentido, a limitação é uma condição ontológica da própria individualidade, algo incontornável.
Admitir nossos limites, ou nosso limite ontológico frente à vastidão que nos cerca e da qual raramente nos damos conta em toda a sua complexidade, é um verdadeiro e amargo desafio cuja única finalidade é a plena consciência do que não somos, das imprecisões de nossas auto representações.
Cada um de nós é um quase nada de mundo... vislumbrando em tudo uma oportunidade de laica transcendência. Não se trata absolutamente de preservar a mera auto- estima, mas de nos levarmos mais a sério do que deveriamos.

ABSTRAÇÕES DA VIDA

Um devanear imprudente
Sobre as sobras do ontem
Inaugura o dia
Em uma preguiçosa manhã
De abril.

Todo dizer possível
Não cabe em uma única frase
De dizível percepção
Das coisas.

A vida sabe nos surpreender
A todo tempo
Confidenciando ao acaso
Nossos limites e desrazões,
Nosso viver fechado
Em pensamentos
E certezas vãs.

sábado, 12 de abril de 2008

SENTIMENTO DE OUTONO


O fundo fosco da natureza
em serenidades
que definem o outono,
conduz meu sentir
a abstratos espaços
de lugar comum
e nenhum
de não pensamentos.
Deito-me nas horas vazias
do dia de hoje,
para mim já esquecido,
vislumbrando meus tempos perdidos,
saboreando o depois
de todos os atos,
sabendo em tudo
um ngolpe de acaso
e aleatório desejo.

sexta-feira, 11 de abril de 2008

NOSTALGIA

Leio os silêncios
Entre os rabiscos
De versos antigos
Tentando reencontrar
Meus tantos rostos
Que se perderam
No tempo.
Como se fosse possível
Desfazer-me
Dos vazios presentes
E mergulhar em passados
Até recuperar prometidos futuros.

LITERATURA INGLESA XXV


Charles John Huffam Dickens (1812-1870) pode ser considerado o mais popular e influente dentre os romancistas ingleses e britânicos da chamada era Vitoriana. A vitalidade sua obra é atestada por sua sobrevivência nos dias de hoje por intermédio de inúmeras adaptações cinematográficas e de animações.
Definitivamente, Dickens é um clássico britânico e principalmente anglófico.
Vale à pena observar que boa parte de seus romances e contos foram escritos em episódios regularmente publicados em jornais, o que proporcionava uma interação curiosa e única entre o autor e seus leitores que, mediante o maior ou menor numero de vendas dos exemplares, influenciava os rumos da narrativa; mas sem diminuir a qualidade do texto...
Embora um tanto quanto melodramático, os romances de Dickens são em grande parte obras de critica social, embora mais voltadas para o enterterimento do que para qualquer modalidade de “realismo”.
Grandes Esperanças ( Great Expectations) e o quase auto biográfico David Corpperfeld são considerados seus mais perfeitos romances. Mesmo assim sendo, emntretanto, vale a pena destacar, dentro do conjunto de sua produção, o romance histórico “ Um Conto de duas cidades” sobre a Revolução Francesa e a Revolução Industrial Inglesa.
Seu conto “Canção de Natal” é, entretanto, o mais conhecido e popular dentre seus escritos.

JEAN BAUDRILLARD: UMA CURIOSA LEITURA EUROPEIA DA AMERICA


Dentre as mitologias laicas que definiram a modernidade ocidental ao longo do século XIX e XX, o mito da América e da emigração européia, privilegiadamente representada pela america anglo-saxã, constitui uma das principais heranças de nossa contemporaneidade ocidental.
Um livro que muito bem ilustra essa “revolução permanente” chamada Estados Unidos é o relato de viagem, ocorrida durante a era Reagan, produzido pelo filosofo francês Jean Baudrilard entitulado AMERICA.
Sirvo-me aqui de uma passagem muito interessante sobre o significado cultural dos Estados Unidos para as configurações de mundo em que vivemos a partir das trocas simbólicas entre o velho mundo europeu e o novo mundo americano.
Pode-se dizer, em poucas palavras, que os Estados Unidos, enquanto imagem coletiva externa e interna da experiência de uma pluralidade de indivíduos, realizou o ideário do progresso oitocentista ao fundar a primeira e única verdadeira sociedade moderna não europeia.

“A América corresponde para o europeu, ainda hoje, a uma forma subjacente do exílio, a um fantasma de emigração e de exílio, e, portanto, a uma forma de interiorização de sua própria cultura. Ao mesmo tempo, ela corresponde a uma extroversão violenta e, por conseguinte, ao grau zero dessa mesma cultura. Nenhum outro país encarna a esse ponto essa função de desencarnação e, em conjunto, de exacerbação, de radicalização, dos dados de nossas culturas européias... Foi por um golpe de força, ou um golpe teatral, o do exílio, o do exílio geográfico redobrando, nos pais fundadores do século XVII, o exílio voluntário do homem em sua própria consciência que o que substituiria na Europa de esoterismo critico e religioso transforma-se no Continente Novo em exoterismo pragmático. Toda a fundação americana responde a esse duplo movimento de um aprofundamento da lei moral nas consciências, de uma radicalização da exigência utópica que sempre foi a das seitas, e da materialização imediata dessa utopia no trabalho, nos costumes e no modo de vida. Aterrissar na América é, ainda hoje, nessa “religião” do modo de vida de que falava Tocquanville. O exílio e a emigração cristalizaram essa utopia material do modo de vida, do êxito e da ação como ilustração profunda da lei moral, e transformaram-na, de certo modo, em cena primitiva. Nós, na Europa, foi a revolução de 1789 que marcou, mas não com o mesmo caráter: com o selo da História, do Estado e da Ideologia. A política e a história continuam sendo a nossa cena primitiva, não a esfera utópica e moral. E se essa revolução “transcendente” à européia já não esta muito assegurada, hoje em dia, de seus fins nem de seus meios, o mesmo não poderia ser dito da, imanente, do modo de vida americano, dessa asserção e pragmática que constitui, hoje como ontem, o patético do novo mundo.
A América é a versão original da modernidade; nós somos a versão dublada ou com legendas. A América exorciza a questão da origem, não cultiva a origem ou a autenticidade mítica, não tem passado nem verdade fundadora. Por não ter conhecido uma acumulação primitiva do tempo, vive numa atualidade perpetua. Por não ter conhecido uma acumulação lenta e secular do principio de verdade, vive na simulação perpetua, na atualidade perpétua dos sinais. Não tem território ancestral, o dos índios esta hoje circunscrito às reservas que são os equivalentes dos museus onde amarzena os Rembrandt e os Renoir. Mas isso é sem importância – a América não tem problemas de identidade. Ora, a potência futura é dedicada aos povos em futuro, sem autenticidade, e que saberão explorar essa situação ate o fim. Vejam o Japão, que numa certa medida, realiza essa tarefa melhor do que os próprios Estados Unidos, conseguindo, num paradoxo para nós iminteligível, transformar a potência de territoriedade e da feudalidade na territorialidade e da imponderabilidade. O Japã já é um satélite do Planeta Terra. Mas a América já foi, em seu tempo, um satélite do planeta Europa. Queiramos ou não, o futuro deslocou-se para os satélites artificiais.”

( Jean Baudrillard. América. / Tradução de Álvaro Cabral. RJ: Rocco, 1986; p. 65 e 66.)

quinta-feira, 10 de abril de 2008

MUSICA E SÉCULO XX: O JAZZ ENQUANTO FENÔMENO JUVENIL


A música no século XX tornou-se um fenômeno social e psicológico sem procedentes. Basta para ilustrar tal conclusão citar o papel desempenhado pelo Rock’ n’ Roll no Pós II Grande Guerra e ao longo dos anos sessenta e setenta, a verdadeira revolução de valores que sacudiu parte da Europa e os Estados Unidos e que podemos considerar mais do que um fenômeno de juventude, uma verdadeira ruptura com o ethos moderno que balizava até então a cultura ocidental. A transformação da musica e do hábito de ouvi-la, sua conversão em uma gigantesca indústria e referencial identidário coletivo, ancorada nas inovações tecnológicas que permitiam sua reprodutividade em qualquer hora ou lugar através de um aparelho doméstico, representam uma inovação psico-historica das mais relevantes. Se a musica foi, ao lado do cinema, uma das principais linguagens definidoras do espírito do último século, o Jazz pode ser considerado, no contexto norte americano de Pós- recessão de 29, o inicio de tudo aquilo que o Rock posteriormente representaria como linguagem.
François Billard, em uma passagem de seu divertido livro NO MUNDO DO JAZZ, da Coleção A VIDA COTIDIANA, entre nós publicada pela Companhia das Letras, nos ajuda a pensar o lugar do Jazz no século XX enquanto fenômeno psico- histórico e juvenil:

“ A juventude podia viver no presente, tinha, enfim, sua música. Basta imaginar as apresentações de Benny Goodman no Paramount Theatre de Nova York, em março de 1937. O preço do ingresso era apenas 35 cents. Na estréia havia mais de 20.000 pessoas numa sala onde cabiam 3.650 sentadas. Todo mundo dançava e pulava.Era a musica deles, e ninguém iria economizar energia. Nunca, talvez, os Estados Unidos, viram tal fenômeno, e o jazz era o grande vencedor. Aquela “cultura” própria do jazz tornava-se a cultura de toda a juventude, e todo mundo aproveitou-a. A partir de então, todos os movimentos que animariam a juventude americana se traduziriam com uma força impar na música, primando a forma sobre o conteúdo, retomando a velha distinção filosófica; o meio de comunicação era a mensagem.
A música adquirira uma força com a qual nenhuma outra forma de expressão podia lutar. Em relação a essa forma, o jazz ocupava uma posição particular, na medida em que ressaltava muito mais o novo, o inédito. Ainda que continuasse a utilizar um repertório conhecido, tomado de empréstimo ( acaso não seria o repertório das melodias populares?), ele o manipulava em seu benefício. O que contava não era tanto o que dizia, mas a maneira como o fazia, o que excluía a repetição servil: “De minha parte”, disse a cantora Billie Holiday, “ não consigo cantar duas vezes do mesmo modo a mesma canção, menos ainda durante dois ou dez anos. Se alguém é capaz de fazê-lo, trata-se então de torneio, de exercício, de tirolesa, qualquer coisa, menos de música.”.
Entre esses jovens nasceu uma minoria particularmente ativa, os hipsters, os caras “para frente”. Eles viviam a música e praticavam uma linguagem de iniciados, o jive talk. Não era uma criação totalmente nova na sociedade americana, e o livro de “ Mezz” Mezzrow e Bernard Wolfe, Really the Blues, descreve comportamentos semelhantes no correr dos anos 30, em Chicago. Os músicos eram seus heróis e exemplos, adotando em público atitudes destinadas a chocar, “por exemplo, a recusa de se conformar com a antiga convenção que obriga o músico, no momento de terminar o solo, a indicar com um sinal de cabeça que o que toca em seguida deve emendar; a expressão de tédio que lhes parece obrigatória, para executar inovações musicais mais ousadas; o costume de tocar de costas para o público, de movimentar-se no palco e sair dele, arrastando os pés, após terminar seu solo, sem olhar para sala.”

(François Billard. No Mundo do Jazz/ tradução de Eduardo Brandão. SP: Companhia das Letras/ Circulo do Livro, 1990 ( Coleção A Vida Cotidiana, p. 245 et seq.)

POEMA NOTURNO

O fragil equilíbrio
Dos meus sentimentos ausentes
Bate e arde em meus pensamentos
Em comoção de luas e estrelas.


Sei apenas
que é a noite,
que relógios me gritam
O superficial das horas
Enquanto me afogo
No negro
Que esta lá fora.

Entre luzes e sombras urbanas
adivinho desertos,
sinto a face do outro
que me define em sonhos.

quarta-feira, 9 de abril de 2008

A DANÇA DA VIDA


Alfabetos explodem
Em cada palavra dita,
Perdida,
No ato da expressão
Turva
Do acaso de cada momento.

Danço a vida
Em ritmos desconhecidos
De pensamentos,
Danço em emoções
E sentimentos
Escrevendo cores
No tempo.

Entre vontades
E ações
Vislumbro abismos abertos.

Mas tudo é puro movimento,
Mudança, perda
E transformação
No impreciso da dança
em que o mundo se faz
limite.

POEMA DELIRIO


Um branco minguante
Empilhado sobre
Um degrau
De pedaço de sonho
Veste-se
De negro e sombra.

Combatentes formas em confusão
Desenham uma paisagem noturna
Na qual me deito
Sobre as esperanças
De amanhãs esquecidos.

Já é tarde,
Quase longe,
Para o passo
Que perdi no escuro.

Reapreendo o mundo
Em todas as cores
E coisas da imaginação.

Sou de repente
Todos os meus limites,
Ventos, risos, gritos
E provisões de razão
No vazio do labirinto
Que me faz ser
No abstrato de cada ato.