quinta-feira, 20 de setembro de 2007

DEVANEIOS E COTIDIANO



EVASÃO
Não presto atenção
aos cenários dos meus labores.
Sonho montanhas enevoadas
acima da dança dos arvoredos
em qualquer lugar distante
dentro de mim.

A realidade imediata
quase não existe
em suas incertezas,
tumultos e túmulos.

Exploro em emoção sem brilho
as vastidões infinitas
do meu intimo vazio.

NADA E COTIDIANO

Cai sem sentido ao chão
um copo vazio.
Um copo que de repente
não mais existe
e dá vida a cacos inertes
sobre um carpete imundo.

Tudo não passa
de uma caseira banalidade
sem consequências,
algo indigno do título de acontecimento.

Entretanto,
no acaso do copo e dos cacos
vislumbro toda profundidade
do incômodo significado
do NADA
nos pedaços dos meus eus dispersos
no ocaso de alguma vã filosofia.

segunda-feira, 17 de setembro de 2007

LITERATURA INGLESA VII

Oscar Fingall O' Flahertie Wills Wilde (1854-1900) é na verdade um autor essencialmente britânico já que nasceu em Dublin, Irlanda.
Publicou, entretanto, pela primeira vez em Londres seus primeiros versos por volta de 1878 e em pouco tempo notabilizou-se como autor de peças teatrais muito bem sucedidas entre as quais constam O Marido Ideal, O Leque de Lady Windermare e aquela, considerada por muitos sua obra prima, A Esfinge.
Pessoalmente estou mais familiarizado como as densas e indefiníveis páginas do seu único romance: O retrato de Dorian Gray e com suas Histórias de Fadas. Estas últimas, diga-se de passagem, foram escritas. Como se sabe, para seus filhos. Wilde casou-se em 1884 com Constance Mary Lloyd, com quem teve dois rebentos. Após o nascimento destes repentinamente tomou horror da vida conjugal e passou a viver em companhia do jovem Alfred Douglas, escândalo que lhe custou à época dois anos de prisão e toda a boa reputação como escritor. Durante o período de carcere redigiu De Profundis, uma amarga apologia a dor e da melancolia... Mas em suas aparentemente inocentes Histórias de Fadas, já nos deparamos com o amargor e a tristeza como traços essências da vida em meio a feiura, encanto, surpresas, ilusões e desilusões que definem o mundo.
No prefácio que elabora para o Retrato de Dorian Gray, Wilde, como bom critico da moral vitoriana que era, traça a imagem da atividade artística como um exercício absoluto de liberdade, uma criação acima de qualquer restrição ética ou moral, da subjetiva “impressão das coisas belas”... Em suas próprias palavras ao término do citado prefácio:

“ Pode-se perdoar-se a um homem a criação de uma coisa útil, contando que ele não a admire. A única justificativa para a criação de uma coisa inútil é que ela seja admirada intensamente.
Toda arte é absolutamente inútil
.”

Mas esse encantamento pelo beleza encarnada na inutilidade de uma obra de arte pressupõe também que:

“... Toda arte é ao mesmo tempo aparência e símbolo.
Os que penetram abaixo dessa aparência o fazem por sua conta e risco.
Os que decifram o símbolo também o fazem por sua conta e risco. A arte reflete o espectador e não a vida.”


Uma passagem desta obra merece aqui ser citada:

“...- Eu agora, nunca aprovo nem reprovo nada. Aprovar e reprovar são atitudes absurdas para com a vida. Não viemos ao mundo para dar largas aos nossos preconceitos morais. Jamais presto atenção ao uie diz o vilgo, nunca interfiro no que fazem as pessoas sim´páticas. Quando uma personalidade me fascina, seja qual for o modo de expressão escolhido por essa personalidade, considero-o absolutamente satisfatório. Dorian Gray apaixonou-se por uma linda pequena, que personifica Julieta, e pretende casar-se com ela. Por que não? Se casasse com Messalina, nem por isso seria menos interessante. Você sabe que eu não sou um paladino do casamento. O verdadeiro inconveniente do casamento é que ele extingue em nós o egoismo. E os seres sem egoismo são incolores. Carecem de personalidade. Ainda assim, há temperamentos que o estado conjugal torna mais complexos. Esses conservam o seu egotismo e acrescentam-lhe muito muitos outros “egos”. Obrigados por isso a viver uma vida múltipla, tornam-se superiormente organizados. E ser superiormente organizado é, ao meu ver, a finalidade da existência do homem.” (Oscar Wilde. O Retrato de Dorian Gray. Tradução de Marina Gaspary. RJ: Ediouro, 9º Ed., 2001, p.73.)

MARCAS

Tento inutilmente esquecer
que estou aqui,
que as horas demoram
a ficar dentro de mim
definindo o vazio
de tempo souto e insosso
onde me desconheço
no cair morto
dos segundos
que me escapam rebeldes
em um grito de eternidade.
Mas tudo é um momento;
um impertinente acontecimento
no vago e provisório tempo
que escreve-se como ingrata tatuagem
na pele incerta da alma.

ILUSÕES

Perdi-me sem querer
ou perceber
em um dia incolor
no vazio deserto
das horas.

Esvazei-me de mim
bebendo o silêncio
dos mais densos esquecimentos
Como se nada fosse importante,
como se não houvesse realidade,
ou existisse qualquer possibilidade
de um amanhã seguinte.

A vida se desfez
em qualquer pensamento
de ideal distante,
de onde me acenavam
ilusões e cansaços
convidando a mentira
de uma migalha
de mera felicidade.

CRÔNICA RELÂMPAGO VII


Liberdade é uma palavra relativa, quase vazia... E, por outro lado, um estado impreciso do espirito, uma inquietação ou silencioso grito, que nos ensina o gosto do ar e do céu diante de cada dificuldade que nos impõe a vida.
Liberdade talvez se confunda com a irracional necessidade de termos escolhas, mesmo quando não as enxergamos, quando elas não se confundem com o sabor de opções, e se impõem como o amargo possível imediato ao qual nos leva a vertigem dos dias.
Liberdade... é algo que nos habita, principalmente quando não nos sentimos livres.

sexta-feira, 14 de setembro de 2007

AUSÊNCIA

Faz poucos dias
perdi-me
em luzes e fantasias
de sol pequeno,
fiquei esquecido
por mim mesmo
a margem de alguma estrada
onde os quatro ventos sopravam
todos os cantos do infinito.

Variações de nada
decoraram meu céu impuro
no impreciso vazio
das saudades que tive
de mim
no saber de todas as coisas.

CHRÉTIEN DE TROYS E A MATÉRIA DA BRETÂNEA


O frances Chrétien de Troyes ( aprox. 1135 - ? ) me parece ser, dentre os autores que se ocuparam da matéria da Bretanea, aquele em que a problemática de sua cristianização não ocupa o primeiro plano d anarrativa, a exemplo de outros dos seus continuadores, como Robert de Boron. Em seu Percival ou o Romance do Graal, a imagem do miraculoso vaso associa-se mais significativamente ao tema pagão da terra enferma e morte ritualística do rei do que a de uma milagrosa relíquia a ser buscada e recuperada em nome de um projeto redentor de inspiração messiânica. Em sua obra, o que predomina é na verdade o tema do amor cortes e sua metafísica do amor e da dama inspirada pelas tradições celticas e armóricanas, além do lirismo provençal.
Pode-se dizer com segurança que Chrétien nasceu na região de Champagne e que esteve submetido a dois importantes patronatos: a corte de Champagne e a de Frandes. Sabe-se, inclusive que uma das filhas de Eleonor da Aquitânia, a grande patrona das letras, Marie de Champagne, foi quem lhe propôs o tema e o argumento de Lancelot ou o Cavaleiro da Charrete, obra através da qual a personagem foi introduzida no ciclo Arthuriano.
O leitor contemporâneo, não sem razão, pode intuir nas imaginativas imagens dos cavaleiros da Távola Redonda, em suas mil peripécias, errâncias e jogos amorosos, uma dissimulada ou inocente crítica a própria instituição medieval da cavalaria... Basta lembrar que o desenvolvimento do ciclo arthuriano deu-se paralelamente as Cruzadas, embora estas, até onde eu sei, nunca sejam significativamente mencionadas nestas obras. A própria incapacidade dos nobres cavaleiros da corte de Arthur mostrarem-se dignos do graal ou obtê-lo, dá o que pensar sobre o significado desse ideário cavaleiresco representado pela matéria da bretânha frente a realidade de seu próprio tempo... Há algo mais do que a mera construção de um modelo de perfeição cavalaleiresco como ensinam os manuais... Mas tal problematização vai muito além da obra deste autor, primeiro nome da literatura em França.

quinta-feira, 13 de setembro de 2007

DESAFIO AO DIA

Acorda dia.
Quero de ti
qualquer coisa além das horas,
da morte ou da janela aberta
em movimento de paisagem.

Quero o imediato
do gosto puro e selvagem
do corpo e da alma
espalhado em cada objeto
a minha volta.

Quero o tudo do nada
que me transforma e forma
discretamente
em cada segundo de insólitaexistência.

CARNE E VERBO



Queria agora
gritar a vida
em todas as cores,
formas e odores
que a palavra transforma
em realidade
no perpassar dos sentidos;

Dar carne a palavra
que me diz e contradiz
no mágico exercício
do canto e do encontro
de mim mesmo
no vazio do verbo.

Mas como despir-me
do impreciso de Ser,
saber apenas a vida
na elementar e vadia
realidade da alma
que dentro do infinito
se faz finitude
no abstrato do mundo?

CRÔNICA RELÂMPAGO VI



No imaginário contemporâneo, os signos já não possuem necessáriamente correspondência verdadeiramente verificável com o mundo que por princípio deveriam representar; ultrapassaram a fronteira do símbolo no esboço de uma hiper realidade estabelecida pelo jogo entre sentido e não sentido em cujo hiato existimos.
A polifonia de gestos, imagens, palavras e artefatos culturais diversos, ou até mesmo, sentimentos e emoções, que alucinadamente desfilam, pior exemplo, na superfície da tela de um monitor de computador, alterou sem que nos déssemos inteiramente conta, nosso modo de lidar e viver com as linguagens e configurações anímicas em que existimos.
Inaugurou-se, assim, sob o sígno dos jogos de incertezas e performasses, a construção de uma imagem contemporânea e imprecisa de mundo que nos suga a existência na aventura desafiadora de descontrução permanente e manutenção do espectro plural que somos na descontrução de toda experiência e realidade vivida de Ser.