terça-feira, 30 de dezembro de 2008

BEATLES E A FILOSOFIA: A ETICA FEMINISTA DO CUIDAR by Peggy J. Bowers.


Dentre os ensaios reunidos na coletânea Beatles e a Filosofia, ELA É UMA MULHER : OS BEATLES E A ETICA FEMINISTA DO CUIDAR de Peggy J. Bowers é singularmente impactante. Ao propor uma leitura dos Beatles a partir da psicologia social de Carol Gilligan e sua “Etica Feminista da Ética do Cuidar” a autora nos constrói possibilidades surpreendentes de interpretações da musicalidade e sensibilidade dos Beatles.
Em seus próprios termos:

“ Embora a principio pareça improvável pensar que a musica dos Beatles articule uma filosofia feminista sistemática, tanto Paul quanto John- após colaborarem mutuamente quase de forma exclusiva durante a carreira dos Beatles- acabaram por entrar em importantes relacionamentos colaborativos com suas companheiras: Linda, no caso de Paul; e Yoko, no caso de Lennon. Embora a musica da banda não seja feminista de forma explícita, uma analise ética do cuidar revela um poderoso subtexto de raciocínio moral que há muito foi associado ao estilo feminino na cultura ocidental. Esse traço da filosofia moral procura subverter a presunção de que os agentes abordam questões morais independentemente do contexto social e relacional. A ética feminista do cuidar surge como um desafio aos modelos masculinos de raciocínio em que os sujeitos emergem isolados das forças sociais que, na realidade, os moldaram. Em vez de desvalorizar os modos femininos de raciocínio, considerando-os inferiores, esse novo modelo procura usar o conceito da ética do cuidar como um meio de reconstruir nosa lógica moral de uma maneira que revele a ilusão do isolamento, tão central no sujeito modernista.
A musica que é tão ressonante na cultura popular, por um período de tempo tão longo, forma percepções, fluindo de contexto para contexto em que infiltra consciência de modos, às vezes, desconhecidos. Os temas abertamente relacionais encontrados na musica dos Beatles revelam uma contracultura moral enraizada na ética do cuidar. O que vem à tona é um drama em que a arte não apenas imita, mas constitui a vida.”

(Peggy J Bowers. Ela é uma mulher: Os Beatles e a ética feminista do cuidar. In Os Beatles e a Filosofia/ tradução de Marcos Malvezzi. SP: Madras, 2007, p.73)


Independentemente de concordar total ou parcialmente com a autora, o fato é que temas como o “amor romântico” nas letras dos Beatles, em suas diferentes fases e momentos, parece transcender muitas vezes o mero clichê, sugerindo de fato a intersubjetividade como interdependência ontológica, como expressão de autenticidade ou busca de modalidades subjetivas de percepção do mundo e realidade que transcendem as normas sociais e convenções através de uma sensibilidade estética bastante incomum. Acredito que a peculiaridade do psicodelismo dos Beatles em grande parte passe justamente por essa representação de vínculos harmônicos e simples entre indivíduos tão clara, por exemplo, na clássica “All You Need is Love”.
Em outras palavras, creio mesmo que existe no patrimônio estético/cultural que nos foi legado pelos Beatles um sentimento e reflexão em torno de uma realidade sócio cultural subjetiva e afetivamente insatisfatória que conduz a uma busca de recosntrução de si mesmo na mínima moraria de mundo privado psicologicamente reconstruido.
Voltando ao ensaio aqui comentado:

“As expressões de pura força emotiva na musica dos Beatles podem ser explosivas. Pense em canções como “Here Comes the Sun” e “Good Day Sunshine”, que retratam a alegria como uma experiência personificada que cria elos sociais. “Here Comes the sun”, em especial, convoca as sensações calorosas da vida quando George conclama seu outro significativo os observar: “litle darling, the smile’s retruing to their faces. Little darling, it seems like years since it’s been here. Here comes the sun. Here comes the sun. Here comes the sun and I say, it’s alright” ( querida, o sorriso esta voltando aos seus rostos. Querida, parece que faz anos desde que ele esteve aqui. Lá vem o sol. La vem o sol, e eu digo, esta tudo bem”). Observe que o elevado sentido da vida é experenciado não apenas pelos pensamentos e sentimentos individuais, mas vendo-os claros nos rostos de outras pessoas, fortalecendo seu senso compartilhado de pertencer.
George, tão famoso por sua guitarra chorosa, estava muito consciente do poder da musica para expressar emoções cruas. Em sua autobiografia ele declara que o que o atraia no sitar e na musica indiana era a habilidade deles em evocar fortes experiências emocionais em determinados espaço e tempo. O namoro dos Beatles com o misticismo oriental e a experimentação com drogas psicodélicas surgiram de um desejo de procurar modos alternativos para o entendimento da natureza do eu.”

(Peggy J Bowers. Ela é uma mulher: Os Beatles e a ética feminista do cuidar. In Os Beatles e a Filosofia/ tradução de Marcos Malvezzi. SP: Madras, 2007, p.75)

2 comentários:

Anônimo disse...

Bastante interessante.



Abraços d´ASSIMETRIA DO PERFEITO

Carlos Pereira jr (merlimkerunnus) disse...
Este comentário foi removido pelo autor.