terça-feira, 31 de agosto de 2021

A VIDA COMO POSSIBILIDADE

cresci sem esperanças,
vivi sem ilusões,
imune a doença
de qualquer verdade.

Na intimidade
de todos os meus tempos,
fui indiferente ao mundo,
identidades,
e  felicidades.

Sei que a vida é qualquer coisa louca
que nos falta. 
Algo que espera a humanidade
na possibilidade de um desvio.
Ela é quase a contra existência de um delírio.

segunda-feira, 30 de agosto de 2021

CONFORMISMO

Algumas pessoas só querem um dia sem sustos,
uma noite sem agonias,
e uma paz de primaveras e jardins.

Em segredo, elas  abominam a realidade,
não naturalizam ou ritualizam
nosso caos diário,
e esperam sempre boas notícias dos jornais.

A realidade, de fato,não lhes interessa.
Confessam, abertamente, através de um  pacifismo conformista,
 suas fragilidades emocionais.

A ilusão, para elas, é o mais urgente dos remédios
na alegria do faz de conta.


CONSCIÊNCIA

A consciência é, de alguma forma estranha, uma experiência coletiva do humano e do inumano, onde o eu só existe como outro, através da memória e da linguagem. A consciência é um fora si. Pois autoconsciência não existe. Consciência é sempre consciência de alguma coisa, entre a imagem e a matéria, entre o orgânico e o inorgânico. Consciência é natureza, participação e não uma forma de narcisismo cognitivo.

domingo, 29 de agosto de 2021

POSSIBILIDADES PERDIDAS

Procuro saber a rua em seus detalhes,
na eternidade de alguns segundos,
registrando futuros
perdidos
ou interrompidos
pela precariedade do agora.

As vezes a gente se perde
no que poderia ter sido,
sonhando a intimidade
de um rosto desconhecido.


terça-feira, 24 de agosto de 2021

VIDA

Ouvi dizer que estamos vivos,
Como se a vida 
fosse uma coisa biologicamente dada,
e não uma potência ou latência,
entre a consciência e a imanência,
 das palavras e dos atos
 de um corpo em movimento.

sexta-feira, 20 de agosto de 2021

PALAVRAS E COISAS

Vemos através das palavras,
entre os enunciados,
ou no buraco dos versos e das frases,
aquilo que escutamos das coisas.

A realidade pulsa, 
é movimento e jogo de forças,
indeterminação e tensão,
ou uma quase alucinação.

Nada é o que parece.
Nada está definido.
A vida é um ato de rebelião permanente das identidades,
significações e verdades.


Vêr é saber-se outro,
é escutar as coisas
e se tornar ninguém
através das palavras.

Apenas as coisas falam.
A linguagem lhes pertence
na contramão das representações.








QUANDO AMANHECE O POENTE



Quando amanhece o poente,
o céu treme no chão,
os sonhos movem montanhas,
e a vida transborda como um rio
que reinventa suas margens,
expandindo mágoas e aflições.

O céu rasgado pelo poente invertido
inaugura o noturno explendor das diurnas imaginações estrelares.

Já não é dia ou noite,
o tempo torna-se um vento de liberdade,
uma tempestade de vontades.

Quando amanhece o poente...


quinta-feira, 19 de agosto de 2021

O POR VIR DA MEMÓRIA

A memória não dá conta do existido.
Não esclarece o passado,
e muito menos explica o presente.

Ela é a potência do tempo,
o virtual dos atos no simulacro de imagens intempestivas
em perpétuo movimento.

É sempre fragmento,
narrativa acontecimento,
que não resolve a vida,
mas que realiza o inventário de suas ausências.

A memória é maior que a lembrança,
é sentimento de mundo,
que nos enterra vivos
entre a eternidade de um encanto e um momento de perda e de espanto
contra toda esperança.

A memória é sempre futura
e guarda um gosto de morte,
no eterno retorno da vida,
na impessoalidade do por vir
que nos reduz a silêncios.

Tudo passa....


terça-feira, 17 de agosto de 2021

A MISÉRIA DO SER

Ser se tornou consumo.
O ego   nos assujeita
na sedução absoluta
do objeto que nos devora a alma.

Ser é o que se come
ou o que define sua fome,
concreta e abstrata,
sua necessidade
ou precariedade,
seu modo de vida
e de morte.

Ser é desver-se no mundo,
desinventar subjetividades,
devir outros mundos,
multiplicar-se nos rostos,
fragmentar-se, 
perder-se,
saber-se um fora
dentro da cidade abismo.

Ousar imaginar imanentes metafísicas
de um corpo que afeta
afetado por um devir inumano.

Ser é saber-se mato, água,
terra e ar,
trair a realidade
antes que ela nos traia
calando a loucura,
transmutando a matéria,
como um insano alquimista.

Ser é viver como coisa,
É consumir,
consumir-se,
misturar-se,
Desaparecer,
gritar,
onde nada existe
além do simulacro
no fluxo das formas,
dos signos e dos limites do sentido e do não sentido.


Ser é o não valor de tudo que existe,
 é dizer o que não pode ser dito
na inconsciência de nossos atos
e na inutililidade de nossas certezas, emoções e conquistas.

Ser é contemplar o próprio cadáver
no anonimato de um crânio
exposto em qualquer vitrine.






MELANCOLIA CLIMÁTICA

As mudanças das estações já não me alteram o Ser.
Dentro de mim está sempre chovendo
e a Terra não me vê.
Apenas gira,
enquanto a agonia do sol
permanece espetacular,
sempre insinuando o fim do mundo, 
esclarecendo a melancolia climática.