quarta-feira, 3 de maio de 2017

A DECADÊNCIA DA POESIA

Aliterações, métricas,
Assonâncias e rimas
Não definem um poema.
Assim como versos
Não mudam o mundo
Ou vestem de significados
A banalidade dos fatos.
Por isso apenas trocamos
Palavras desencontradas
Enquanto aguardamos o por do sol.
Amanhã não será outro dia.
Repetiremos contra o vento
Velhos enunciados banais
Enquanto uma sombra de poesia

Há de emudecer nossos olhos úmidos.

MERLEAU PONTY E O PRIMADO DA PERCEPÇÃO



O Primado da Percepção e Suas Consequências Filosóficas é o texto de uma exposição realizada por Maurice Merleau Ponty perante a Sociedade Francesa de Filosofia em 23 de novembro de 1946 e comentada, entre outros, por Hyppolite.


O texto inicia-se com o seguinte enunciado sobre a percepção como modalidade original  da consciência:


“  O estudo da percepção feito sem preconceitos pelos psicólogos  acabou por revelar que o mundo percebido não é uma soma de objetos, no sentido em que as ciências dão a esta palavra; que nossa relação com ele não é a de um pensador  com um objeto de pensamento e que, enfim, a unidade da coisa percebida, a respeito da qual muitas consciências concordam,  não é assimilável à de um teorema que muitos pensadores  reconhecem, nem à existência percebida à existência real.”

(Maurice Merleau Ponty. O Primado da Percepção e suas Consequências Filosóficas. Campinas,SP: Papirus, 1990, p.41.)


A partir de uma ponderação fenomenológica  da psicologia experimental de sua época, especialmente informada pela Escola da Gestalttheorie,  Merleau Ponty propõe uma critica ao cientificismo e a filosofia racionalista afirmando a importância do corpo na definição de nosso horizonte perceptivo. Ele transcende os limites do idealismo subjetivista e do positivismo objetivista ou, simplesmente, da realidade formal. Afirma, assim, o primado da experiência sobre  a construção de conceitos , contrariando nossa tendência ao verbalismo abstrato e unilateralmente racionalista.

Indo além da reflexão proposta pelo autor, acrescento que o "eu" esta longe de ser o centro da consciência. è o próprio corpo que desempenha tal papel através das percepções e a produção de uma imagética do real.  Além deste seu condicionamento da percepção a fabulação de toda a experiência, cabe também considerar  que o "eu" esta subordinado a grandezas impessoais de natureza e autônomas (arquétipicos) cuja manifestação escapa inteiramente ao seu controle e o condiciona.

Embora a noção de inconsciente e de psique objetiva legada pela chamada psicologia profunda seja inteiramente estranha a fenomenologia, alguns pontos de contato podem ser surpreendentemente estabelecidos. Como pretendo demonstrar em outra ocasião.

sexta-feira, 28 de abril de 2017

SOBRE AS METAMORFOSES DO REAL

O vazio da realidade não conduz ao falso ou ao ilusório, mas a uma metamorfose do sentido e da experiência do real como signo e símbolo. 

Nossos enunciados já não se inscrevem na ordem de um discurso "verdadeiro", não são orientados por  um télos,  uma finalidade ou sentido. Inscrevem-se agora no aleatório devir da experiencia imediata e do nomadismo existencial. 

O esvaziamento do real é sua plena realização, sua ruptura com toda metafísica do sentido e reconhecimento da simulação como o mais elementar artifício  da imaginação humana.

quarta-feira, 26 de abril de 2017

SOBRE ENUNCIADOS E A CONSTRUÇÃO DO "EU"

O exercício da palavra, oral ou escrita, é por definição uma expressão, fazer-se visível mais do do que um aro de comunicação. Pois,  enquanto a comunicação remete ao diálogo,  o dizer  é um apresentar-se  através de enunciados impessoais aos quais aderimos e transformamos.

Através das palavras o "nós" identifica o "eu" como porta voz do significado teleológico ou conjunto de preposições. Somos reconhecidos em nossa singularidade pela forma  singular através da qual expressamos conteúdos arbitrariamente selecionados e redefinidos  na singularidade do sentido de uma narrativa.

A geografia de nossos gestos  de linguagem nos projeta nos outros como "eu". Isto é profundamente banal e, ao mesmo tempo, profundamente significativo no acontecer intersubjetivo dos enunciados.

domingo, 23 de abril de 2017

SOBRE O OFÍCIO DE SUCUMBIR SEGUNDO ASSIM FALOU ZARASTRUSTRA DE NIETSZCHE

Assim Falou Zaratruta: Um Livro Para Todos e Para Ninguém. é uma daquelas obras que se apresentam ao olhar perdido do mais humilde leitor como um labirinto que se reinventa em releituras constantes.

Já no prefácio de Zaratrusta nos confrontamos com o surpreendente desafio de sucumbir a nós mesmos:

" Amo aqueles que não sabem viver a não ser como os que sucumbem, são os que atravessam."

Assim, nos descobrimos como uma cordas estendida  sobre um abismo, nos fazemos contra o otimismo do "Ultimo Homem" aprendendo o ofício de sucumbir. Que aqui se diga em todas as cores vivas das letras que o ofício de viver  é aprender a sucumbir:
"Amo aquele que ama a virtude : pois virtude é vontade de sucumbir e um dardo da aspiração."
Precisamos urgentemente dialogar com o abismo para reaprender a vida contra todo humanismo....

sábado, 22 de abril de 2017

A MORTE DO EU

É estranho como nosso desapontamento com a vida  social pode ser medido pelas derrotas em nossa vida privada ou pessoal. Não há mais  uma clara fronteira entre o público e o privado em tempos de massificação e espetáculo. Estar em casa se tornou impossível em qualquer lugar virtual ou real. Nos sentimos em todos os sentidos desabrigados e obrigados ao outro para fugir do mais profundo imediato de nós mesmos através dos simulacros do coletivo.Deveria ser o contrário. Mas perdemos a realidade de nosso rosto em mutação através das agonias do sempre igual de todos.

O MAR

O mar sempre se repete
sem fim ou começo.
É  sempre movimento
na naturalidade do seu estar ali.

Fechado em seu corpo de abismo
conversa com o céu e com o vento
e, as vezes, afunda navios.

O mar é como o intimo caos
que contem tudo aquilo que existe.

sexta-feira, 21 de abril de 2017

COMO ACONTECE A NARRATIVA

A unidade verbal das palavras é dada pelo significado. Mas o significado de um enunciado transcende a gramática e sua função de signo. Todo texto literário ou filosófico possui um sentido aberto, orientado pela teleologia  autoral e a hermenêutica do leitor. Nesta dialética ele acontece e se apresenta em situação de linguagem, afirmando-se como narrativa , como encadeamento de imagens de pensamento e consciência. 
Escrever é dialogar com um outro de si mesmo que entre a intuição e o conceito, inventa o leitor.

quinta-feira, 20 de abril de 2017

RAZÃO, MITO E PENSAMENTO NA CONTEMPORÂNEIDADE

A  oposição entre o método dialético ( de inspiração sociológica) e o método lógico ( de inspiração neo positivista) torna-se uma falsa questão quando estabelecemos  a imaginação e o símbolo como uma premissa elementar de toda codificação da realidade.O pensamento não é uma questão de método, mas de fantasia criativa.

Pressuponho aqui, todo acontecer  humano como um ato mental e uma experiência imagética e irracional  do qual a própria racionalidade não passa de um produto, de uma fantasia, assim como qualquer representação ou elaboração possível de uma realidade. Ouso, portanto,  dizer que nossas racionalizações possuem um fundamento compulsivo e irracional.

MITO E PENSAMENTO

A arte do pensamento não se confunde com o exercício da razão.
Pensar é quase um encantamento,
é a aventura de se inventar através de enunciados
contra o silêncio de palavras antigas
que perderam a vida.
Pode ser descrito como um exercício 
de desconstrução criadora
através da da máscara de um texto
onde se reinventam significados, gramáticas e símbolos,
que buscam dizer a existência
através dos mitos.