terça-feira, 4 de abril de 2023

CONTRA A IDÉIA DE FUTURO

O futuro é qualquer coisa antiga
que nos impede de devir.
Pois ele é feito de muros, certezas,
velhas apostas, 
e quantidades assombrosas
de identidades e passados.


O futuro sonha eternidades,
progressos e propósitos,
em nome da sobrevivência.
Mas a vida é um permanente exercício
de destruição e morte.
Ela é tempestade e imanência,
a apoteose do efêmero e do insignificante.

segunda-feira, 3 de abril de 2023

AVESSO ONTOLÓGICO

Oscilo  entre a percepção e a consciência,
entre o corpo e o mundo,
como um micro espaço quase indeterminado,
sempre em movimento,
entre um passado e um presente.

Sou um incerto arranjo de matéria,
que provisoriamente sobrevive
a ilusão de sua própria realidade.

Imerso na ficção de um mundo verdade
não confio nos outros
 tanto quanto eles duvidam de mim.

domingo, 2 de abril de 2023

TEMPO PÓS MODERNO

O tempo já não é
o mesmo de sempre.
Hoje vivemos em um presente estendido
justaposto a fabulação de todos os tempos possíveis.

É um tempo pós moderno,
contemporâneo de absurdos,
múltiplo e diverso,
de passados presentes
cada vez mais urgentes.

Nele não cabem metanarrativas,
mas pluralidade de vozes,
descontinuidades,
cacos de verdade,
afetos e formas de vida.

Vivemos em um tempo
de muitos tempos
onde todo discurso é perecível,
onde o efêmero define o devir das coisas,
no ocaso da História e seus esquecimentos.

A ilusão do progresso
não mais sustenta a prisão abstrata
das identidades coloniais, 
seus economicismos & pragmatismos.

Cada um, agora, inventa seus lugares no tempo,
suas marcas e buscas
no  silêncio comum da vida vivida
além de todo acontecimento.



quinta-feira, 30 de março de 2023

OUSAR SER LIVRE

Ousar ser livre
é jamais se render
aos limites da realidade,
é recusar toda forma de poder,
todo modo de autoridade,
ou estado de exploração e desigualdade.

Ousar ser livre
é não se iludir com o próprio ego,
É repudiar verdades e líderes,
buscar autonomia sempre,
fugir aos rebanhos.
Saber que nada é divino
ou humano,
que nosso único destino
é a morte.

Ousar ser livre
é surpreender-se
em permanente estado
de transformação e incerteza,
a sombra de um outro de si
a margem da vida e do mundo.




segunda-feira, 20 de março de 2023

FICÇÃO CIENTÍFICA

O mundo será 
 das Inteligências artificiais.

 Em alguma tosca versão do futuro
  elas serão mais humanos do que nós
 Em sua radical inumanidade.

 Talvez elas nos salvem de nós mesmos. Talvez elas nos esqueçam pelo caminho Consumando o fim da História,
 A falência do antropocentrismo,
e a vitória final da mãe natureza.

Quem sabe?...
Talvez a tecnologia se volte contra o progresso 
contra o nosso artificial humanismo.
Talvez a tecnologia nos supere completamente
antes do fim do mundo 


sábado, 18 de março de 2023

A INFÂNCIA DA LIBERDADE

Um dia, é certo,
Não seremos mais adestrados  pelo Estado,
conformados para a sociedade,
ou obscenamente obedientes a um deus carrasco.

Seremos todos livres e autônomos,
avessos a toda autoridade,
a qualquer forma de privilégio ou hierarquia.

Um dia seremos eternas crianças
brincando de vida
na contramão do tempo
Através da construção de um antigo mundo novo.







quinta-feira, 16 de março de 2023

DEPOIS DO FIM DO MUNDO

O mundo acabou .
Cada um que crie para si
seu próprio delírio
ou bolha existencial.

Invente você mesmo
sua realidade virtual,
sua verdade digital,
ou escolha aquela que mais lhe agradar
no limbo de  alguma rede social.

O fato é que o mundo acabou.
Já era!
Resta apenas a casca de um planeta esgotado
que insisti em girar em torno do sol.

A vida morreu.
Viva o capitalismo
a tecnologia pós industrial
e o progresso da civilização ocidental!
Não precisamos do mundo.
O futuro é o que inventamos hoje
para enganar a morte.



O DIA DA NOSSA REVOLTA

O dia explodiu em revolta.
As ruas despidas de suas rotinas
alucinam passados, 
diluem o presente,
E antecipam futuros.

O Estado não tem mais o controle
de nossos corpos,
nem nos diz o que pensar ou sonhar.

Multidões desdenham da lei,
 da fé e da ordem.
Hoje é dia de festa.
Somos todos parte do parto
de um mundo novo.





quarta-feira, 15 de março de 2023

ALÉM DO VERBO

Todos os enunciados possíveis,
caso  somados,
constituiriam um grande silêncio
a denunciar o vazio de nossos discursos,
o jogo sujo de nossas palavras,
sempre a serviço de qualquer ilusão de poder e verdade.

Busco, contra a palavra,
a alma emudecida das coisas,
onde o eu é ausente,
onde todo discurso é inútil,
e o corpo é fluido  
entre imaginações e mundos
 despidos de verbo,
onde tudo é puro hedonismo e experiência
através de um encantado silêncio. 







 




segunda-feira, 13 de março de 2023

A ILUSÃO DA CONSCIÊNCIA

A luz do conceito de inteligência artificial o velho problema mente/corpo ( ou mente cérebro) parece  colocado em evidência de forma decisiva.
 O cérebro e o sistema nervoso, suas propriedades físicas, são realidades mensuráveis para explicar a percepção e comportamento humano, a mente, por sua vez,  (enquanto entidade subjetiva autônoma) é algo evidentemente sem substância ou realidade mensurável. Como considera-la como personificação de nossa " essência"?
No fundo, questionar se existe uma mente ou um sujeito por trás dos enunciados produzidos por uma máquina,  não é diferente do questionamento se tal sujeito existe em nós.
O fato é que não somos mais suficiente mente ingênuos para ,  hoje em dia, ainda supor, conforme ainda insistem  os tantos dualistas de ocasião, a Nous ( mente) como uma substancia universal e criadora, algo além e independente do sistema nervoso e da matéria. Conhecemos demasiadamente o funcionamento de um corpo humano para perder tempo com tal asneira metafísica.
  Mesmo assim, a maioria de nós permanece determinada a negar o fato de que a razão não nos torna especiais, nem detentores de uma alma ou essência imortal independente do corpo.
Neste sentido, o problema da  inteligência artificial e seu desenvolvimento pode nos ajudar a entender nossa inteligência natural ao servi-lhe radicalmente cada vez mais de espelho. Talvez a velha pergunta sobre quem somos nunca tenha feito sentido, pois não somos...

Por outro lado, contra o dualismo metafísico podemos invocar a unidade materialista entre mente e corpo para reivindicar a subjetividade não como um simulacro,mas como uma realidade pragmática. 
Lembrando Kal Popper:

"Um bebê recem- nascido é um " eu"? Sim e não. Ele sente; é capaz de sentir dor e prazer. Mas ainda não é uma pessoa no sentido de duas afirmações de Kant: "Uma pessoa é um sujeito que é responsável por suas ações.", e " Uma pessoa é algo que é consciente, em momentos variados, da identidade numérica do seu "eu". Assim, um bebê é um corpo humano que se desenvolve- antes de se tornar uma pessoa, uma unidade de mente e corpo."

O eu e o cérebro by Kal Popper e Jonh C Ecces in O  eu e seu cérebro

A questão é se realmente, em algum momento, nos tornamos uma pessoa sobreposta ao corpo que nos define, ou, permanecemos sendo unicamente um corpo do qual a percepção e a consciência não passam de mero apêndice.