segunda-feira, 30 de julho de 2018

A VERDADE E A MENTIRA SEGUNDO NIETZSCHE



 Raramente nos damos conta do quanto o fundamento de qualquer verdade é sempre uma não verdade. O dizer verdadeiro é aquele que se inventa através de conceitos, este curioso artificio para dizer as coisas como elas devem ser na ignorância de suas diferenças. A sombra do Nietzsche de Sobre a verdade e a mentira no sentido extra moral, cabe dizer que tomamos a simbolização enunciativa do real como o próprio real, adivinhando, assim, uma ordem nas coisas.Nietzsche define a verdade neste breve texto de 1873 da seguinte maneira:

“O que é, pois, a verdade?
Um exercício móvel de metáforas, metonímias, antropomorfismos, numa palavra, uma soma de relações humanas que foram realçadas poética e retoricamente, transpostas e adornadas, e que, após uma longa utilização, parecem a um povo consolidadas, canônicas e obrigatórias: as verdades são ilusões das quais se esqueceu que elas assim o são, metáforas que se tornaram desgastadas e sem força sensível, moedas que perderam seu troquel e agora são levadas em conta apenas como metal, e não mais como moedas.”

A verdade é a obrigação de mentir socialmente através das convenções consolidadas, é também uma inconsciência das metáforas intuitivas originais. Assim, ela é essencial ao espírito gregário e a vida em rebanho. Afinal, a verdade tornou-se a principal lei da legislação da linguagem depois que o intelecto, este artificio essencial a sobrevivência  dos seres menos favorecidos, inventou a dissimulação como uma necessidade vital. Assim, através dele, a própria linguagem se converteu em um artificio, em dissimulação consagrando a ilusão do verdadeiro e do falso, uma arma, um mecanismo normativo e, portanto, de controle. 
Longe da soberba do homem racional e sua leviana história universal, vivemos melhor quando reinventamos nossos jogos de linguagem como exercícios metafóricos, quando através da intuição afirmamos a vida subjetivando a existência como obra de arte.  

sexta-feira, 27 de julho de 2018

NOTA SOBRE DELEUZE E O CINEMA


“O fato moderno é que já não acreditamos neste mundo. Nem mesmo nos acontecimentos que nos acontecem, o amor, a morte, como se nos dissessem respeito apenas pela metade. Não somos nós que fazemos cinema, é o mundo que nos aparece como um filme ruim.”
Gilles Deleuze in A Imagem Tempo (Cinema 2)

No modo como Deleuze fala sobre o cinema, tão influenciado pela filosofia de Bergson, o afeto não é um dado da percepção ou da representação. Mesmo eventualmente relacionado ao passional ou ao subjetivo, ele não se confunde com a ordem do pensamento. Ele é um outro tipo de informação que instiga a perceber e pensar de forma diferente daquela a qual estamos habituados, que parte da indiscernibilidade entre sujeito e objeto, entre pensamento e corpo,  estabelecendo o impensado de um pensamento afeto através de dois regimes de imagem: a Imagem-movimento e a Imagem-tempo. A própria matéria é um conjunto de imagens que nos afeta sem qualquer distinção entre o virtual e o real. Em poucas palavras, o cinema nos oferece a potência do falso... imagens que pensam.



A ESPIRAL DO CETICISMO


Sempre estou disposto a saltar sobre mim mesmo,
Sobre o tempo presente e a prisão dos fatos rasos.
Não para cair adiante,
Sobre a ilusão de futuros.
Mas para visitar passados desconhecidos
E vislumbrar ausências

Questionando tudo aquilo que nos tornamos.

SOBRE A CRIAÇÃO DE CONCEITOS



Descubra um plano de imanência sobre o qual construir e entrelaçar conceitos,
inventar-se em novas formas de subjetivação,
descobrir na paisagem abrigos, dobras e linhas de fuga....

terça-feira, 24 de julho de 2018

MAQUINAÇÕES ABSTRATAS



Pouco sei das coisas que vejo agora.
Mas elas sempre desenharam uma presença,
Uma invisibilidade ativa em minha vida.

As coisas são consciência,
Entes em meu pensamento
Revisando a história do mundo.

Sei que sou como vejo as coisas,
Que  existo como penso meus atos
Através de muitos dispositivos,
Em um eu disperso no corpo invisível
De  qualquer máquina abstrata


segunda-feira, 23 de julho de 2018

LINGUAGEM E ESCRITA



“O saber humano se espalha por todos os lados, a perder de vista, de modo que nenhum indivíduo pode saber sequer a milésima parte daquilo que é digno de ser sabido.”
Arthur Schopenhauer

Escrever não é um ato tão naturalizado como o falar. Exige uma postura que pressupõe um esforço para sistematização de um saber previamente articulado. Desta forma, o autor nunca é livre no ato de escrever. Ele não é o agente da escrita.  Ele replica o eco de vozes coletivas em seu fazer discursivo através de suas referencias. É o ler que permite o escrever, encadeando aleatoriamente discursos que se duplicam, que se dobram sobre si mesmos.

Escrever é sempre replicar um determinado saber. Mas longe de ser definido pela perícia com que se reelabora um dado saber eleito, o que realmente define um texto são os seus silêncios. Aquilo que é ignorado, paradoxalmente, torna um discurso viável. Eis o segredo de sua coerência na pretensão a um dizer verdadeiro.

Se o saber é múltiplo e diverso, irredutível a qualquer enunciado, todo discurso é parcial e introduz uma instabilidade em nossa codificação coletiva da realidade. Cada texto é como uma ferida aberta na gramatica do real, na multiplicidade das possibilidades do dizível.  Todo texto realmente significativo  deve anunciar seu próprio desaparecimento, sua superação. Ele é a experiência de um abismo, de um desassossego que nos afeta através das palavras. Escrever pressupõe um inacabamento da possibilidade do dito, um confronto com o indeterminado de um devir que é a própria linguagem.   


domingo, 22 de julho de 2018

ALÉM DO TEMPO PRESENTE



Fugi da hiper realidade da simulação diária,
Da palavra fechada e disseminada,
Realizada por verdades de mão única.

Procurei a reversão das genealogias,
Os labirintos do micro celular,
Do quase molecular.

Tudo que encontrei foi um grande vazio
Onde todas as coisas possíveis
Haviam definido mudas
Seu provisório lugar de quase não ser.

sexta-feira, 20 de julho de 2018

PONDERAÇÕES FILOSÓFICAS


Descartes não duvidou de si mesmo.
A liberdade em Espinosa não tem livre arbítrio.
Hegel restituiu a razão a metafísica.
Shopenhauer inventou Nietzsche...
E seguimos hoje perplexos,
Entre o estoicismo e o paradoxo
A espera do além do humano.

O TEXTO CORROÍDO


O texto corroído é descartável.
Já não diz mais nada,
Não acorda a consciência,
Não desvela mundos dentro do mundo.
É apenas palavra e registro inútil
De um pensamento suspenso.
Afetos e sentidos investigam as coisas.
Mas as palavras envelhecem.
o discurso não funciona.
É pior do que qualquer dúvida.
O texto corroído inventa equívocos
E já não tenho mais nada a dizer.
.

quinta-feira, 19 de julho de 2018

SOBRE A DUALIDADE DA CONSCIÊNCIA DO MUNDO


A consciência sensível e a consciência intelectual possuem o mesmo objeto: a exterioridade do mundo. Mas representam percepções e experiências diferentes deste objeto. O mundo é irredutível as duas. Apresenta-se como algo concreto através do corpo e ao mesmo tempo como uma abstração do pensamento. Em ambos os casos ele nos afeta como uma experiência interior que se reduz a um fora, que em sua multiplicidade permanece em alguma medida inconsciente. 

Mas toda forma de consciência é a percepção do exterior. Desta forma  não existe  consciência interior. Existe apenas expressão, movimento, de um fora que nos surpreende como um dentro, mas com o qual nos relacionamos através do filtro de determinadas configurações culturais ou simbólicas que definem o sensível e o intelectual. O sentir define o pensar e vice versa. Vemos apenas aquilo que podemos pensar. O próprio eu é exterioridade, o que inviabiliza  a subjetividade como um contraponto do mundo. Sujeito e objeto são uma coisa só.