terça-feira, 15 de maio de 2018

CONSTATAÇÕES



Hoje amanheci pequeno,
Incrivelmente espantado comigo mesmo.

A vida transborda,
Não cabe em qualquer pensamento,
Mas cresce nas imaginações.

Tudo acontece em todos os tempos.
O presente é um passado que cresce futuro.

Não passo de um ponto estático
Em uma paisagem em movimento.

segunda-feira, 14 de maio de 2018

A DECADÊNCIA DO PENSAMENTO





Não há mais uma obra a ser escrita. Escrever já não se inscreve em um plano de referencias conceituais e sistematizações narrativas tendentes a verdade. Não há mais um real a ser desvelado, explicado ou analisado. Não há mais autoridade nas disciplinas ou dignidade no saber e seu jogo normativo. Não há mais poder nas palavras. O conhecimento se converteu em informação, em opinião mimetizada ou, no melhor dos casos em maquinaria técnica para o gosto dos que precisam de princípios e orientações. Não é mais tempo de pensar. O individuo emancipado pela razão foi o breve sonho de um século distante. Jamais pôs os pés na terra prometida do progresso. Vivemos agora a margem de qualquer representação convincente das coisas. A vida tornou-se transparente e epidérmica.   



A VELOCIDADE DAS PALAVRAS


A velocidade das palavras é tangível no acontecer da leitura. O texto tem um ritmo, é movimento. Ás vezes parece um organismo vivo. Mas quase não sei o que é o texto e a experiência de ler, pois não me percebo dentro dos enunciados. Eles acontecem quando eu não aconteço, onde não há substância.

A compreensão, o sentido, é um desvelar-se de uma matéria invisível. Existe algo dentro das palavras que não são as palavras. É preciso ter esta intuição para perceber o quanto elas são rápidas e fogem dos olhos. Toda narrativa acorda sensações físicas, apercepções; engendra duplos.

Não há representação. Existe um lado de fora dos significantes e dos significados, uma espécie de epiderme esvoaçante, um fantasma, que é a própria materialidade da narrativa.

A velocidade das palavras é perceptível onde não há temporalidade, onde o próprio leitor desaparece no acontecer da leitura, que é também um re acontecer da narrativa como espaço abstrato de experiência. A velocidade é aqui um contrário de tempo, é uma substancia, um atributo do discurso. Uma leitura não tem duração. Ela tem movimento. Mas ela não percorre qualquer espaço. A velocidade é o próprio pensar como experiência do sentido.  


sexta-feira, 11 de maio de 2018

POEMA HERACLITIANO




“Tudo frui como um rio”.
Somos e não somos no fluxo.
Na coincidentia oppositorum,
No desvelamento da essencial incerteza
Do ser e do não ser através do devir.

Existimos além do bem e do mal
No mais arcaico futuro
Onde a vida escuta a morte
E se perde da eternidade.

Nossa inercia é movimento,
Fogo e imanência.

O PENSAR DOS OLHOS


quinta-feira, 10 de maio de 2018

COORDENADAS GEO FILOSÓFICAS




Procuro um espaço que se faça mais do que um lugar,
Um ponto meta geográfico
Que se torne corpo do meu corpo,
Tempo e pensamento,
Onde eu não seja
E tudo esteja.

Lugar sem forma,
Em movimento...

Onde nada se perca
Em encontros,
Choques e dualismos.

Onde nada aconteça
No se fazer das coisas
E a linguagem nos contenha
Na grande ficção da produção do sentido.


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quarta-feira, 9 de maio de 2018

FANTASMAGORIA E ESCRITA NÔMADE



Há algo que sempre permanece não pensado dentro do próprio pensamento. Algo que acontece como um lado de fora do significado e, entretanto, desenha a nervura do sentido. Trata-se de algo que ultrapassa a forma-homem, que a remove e apaga como campo de intencionalidades, como artificio estruturante de cognição, expressão e  comunicabilidade, eliminado toda causalidade que oprime a escrita, pondo em xeque, portanto, todos os códigos retóricos.

A literatura é o jogo de enunciados privilegiado para esta transcendência da dualidade entre significante e significado por intermédio da linguagem, que nela se volta sobre si mesma, quando foge as normativas do seu próprio campo discursivo. Assim, todo dizer se torna um dizer do que é dito que não se reporta a qualquer objeto. A qualquer norma ou ordem discursiva. Tudo se faz fragmento, simulacro e deserto no acontecer nômade e imaterial de uma narrativa.

segunda-feira, 7 de maio de 2018

TEXTO, SENTIDO E MOVIMENTO

Existe uma veracidade em todo texto literário que não comunica uma verdade, mas a experiência de imagens e afetos. 
É o simulacro como um acontecer do sentido mediante um encadeamento de enunciados. 
A experiência de uma narrativa é seu próprio significado como avesso da realidade. 

O texto é um território através do qual  evadimos, transportamos a existência através da cartografia que é o texto. Ele não nos diz onde vamos, mas nos modifica, torna-se uma ambientação, um acolhimento. 

A leitura é isso: uma experiência de movimento que se dá através de inercias.

O DISCURSO E A MANUFATURA DA VERDADE


O DISCURSO E A MANUFATURA DA VERDADE


A arqueologia busca definir não os pensamentos, as representações, as imagens, os temas, as obsessões que se ocultam ou se manifestam nos discursos; mas os próprios discursos, enquanto práticas que obedecem a regras. Ela não trata o discurso como documento, como signo de alguma coisa, como elemento que deveria ser transparente, mas cuja opacidade importuna é preciso atravessar frequentemente para reencontrar, enfim, aí onde se mantém a parte, a profundidade do essencial; ela se dirige ao discurso em seu volume próprio, na qualidade de monumento. Não se trata de uma disciplina interpretativa: não busca um “outro” discurso mais oculto. Recusa-se a ser “alegórica”.

Michel Foucault in Arquelogia do Saber

O discurso é o conjunto de regras e praticas que permitem a construção das representações e codificações da realidade em um dado contexto sócio cultural. Como demonstrou Foucault em sua Arqueologia do Saber, o discurso é o que define o que pode e não pode ser dito sem ser, entretanto, uma copia do real, mas sua instrumentalização através de jogos de verdade que estabelecem relações de poder.

O discurso precede os sujeitos na produção de subjetividades. Jogos de verdade são jogos discursivos de poder. Eles são práticas que constroem objetos dentro de um regime de verdade, um conjunto de enunciados que integram a malha de poder.

Somos inventados pelas nossas praticas discursivas.  Quando alguém elabora um discurso, em seu trabalho de escrita reúne  um conjunto de vozes sociais, ideológicas e históricas distinguindo-se assim de si mesmo como indivíduo. A imposição de regras ao sujeito que fala impõe ao mesmo um papel pré definido na produção discursiva. Parafraseando Foucault, devemos evitar imaginar um mundo que nos apresenta uma face legível que apenas deveríamos decifrar.




sexta-feira, 4 de maio de 2018

SENTIDO E LINGUAGEM


Precisamos nos libertar do condicionamento da linguagem a um referencial antropológico. Ela não expressa o humano como algo dado. Nem mesmo se relaciona com ele. Seu propósito é criar sentido. Um sentido que nos transborda como ficção de um eu configurado por um corpo físico ou definido por intensionalidades articuladas por identidades, pela ingênua convicção do Ser e da Verdade como um valor absoluto e abstrato que engendra a experiência do mundo. 

A linguagem habita a si mesma e não o mundo. Ela é como um não lugar que define todos os lugares.