segunda-feira, 6 de novembro de 2017

VIDA E EXPERIENCIA DO REAL



O vivido é o ponto de chegada da experiência e não o seu ponto de partida. Pois aquilo que é vivenciado só ganha forma e significado na medida em que é representado. Antes disso o vivido é puro e cego reflexo do exterior, mero automatismo.


O vivido é um campo complexo da consciência do real que não remete propriamente a ação e a sua experiência, mas aquilo que lhe atribuímos posteriormente como significado. Posso simplesmente atravessar uma rua visando chegar a algum lugar. Isso é diferente de atravessar determinada rua, em determinado dia e ocasião. A valoração da experiência é o que lhe define como tal no jogo simbólico da representação dos nossos próprios atos. 

O QUE É UM ACONTECIMENTO?


Um acontecimento não se reduz a sua materialização como evento concreto. Pode-se dizer que é um processo em grande parte virtual. Mesmo que não definido por qualquer causalidade, mas pela simultaneidade de determinados eventos.
Como, afinal, poderia uma coisa acontecer fora da simultaneidade de tantos outros acontecimentos? A multiplicidade é sua característica mais elementar. Por isso pouco entendemos um acontecimento, pois geralmente não estabelecemos sua rede de relações, não percebemos que um acontecimento só é pleno na medida em que estabelece uma descontinuidade dentro de uma cadeia de eventos, criando uma situação inédita. Assim, um fato não é necessariamente um acontecimento, mas a continuidade de uma cadeia de eventos.
Um acontecimento não tem sujeito, é devir que liga um passado e um presente saltando para o futuro. Ele é uma singularidade que personifica o desdobramento da própria vida como movimento que nos ultrapassa, como algo que não se curva a nossa previsibilidade e muito menos a nossas apostas e certezas teleológicas. Fatos criam continuidades, acontecimentos inventam o inédito através da acausalidade.







DEVIR E AGENCIAMENTO

Busco a palavra que me faça
Um devir água, 
Um devir folha, 
Um devir animal ou inseto,
Que me ponha novamente
Em movimento
contra as inercias deste vazio
de ser gente.

DO TEMPO AO TEMPO

Tudo que precisava era de tempo.
Tempo para trabalhar,
Para viver, viajar,
Amar, sofrer e gritar.
Precisava de tempo
Para dormir mais um pouco
E até para esquecer o tempo.
O tempo nunca era suficiente.
E, apesar de toda perda de tempo,
Sempre reclamava da falta de tempo.

SOBRE ESCREVER


Escrever depende da nossa capacidade de escutar silêncios no âmago do cotidiano. Não se trata de usar as palavras para dizer qualquer coisa da qual a fala não dá conta entre o signo e o simbolo.

É preciso calar a si mesmo para escrever, contemplar imprudente vazios e absurdos dentro da gente até que as palavras alcancem o limite do significado.

Escrever é uma situação extrema, uma vertigem que ameaça nossa própria existência. São muito raras as pessoas que sabem escrever.

terça-feira, 31 de outubro de 2017

O PARADOXO DE UMA AUSÊNCIA

A existência nos ultrapassa como indivíduos
Tudo que pensamos, sentimos ou dizemos
é um ato impessoal de imaginação.
Só podemos ser compreendidos
Na medida em que nos apagamos
No falar mais íntimo e profundo
Das representações.
O eu é o paradoxo de uma ausência.

SER E ENUNCIAÇÃO

O Ser da linguagem é o vazio do homem como significante. Somos para nossos enunciados como receptáculos descartáveis de sentido. Pois o lugar do humano é o não sentido. Somos pensados pelas palavras e existimos de modo humano apenas onde ela existe. Aquilo que eu digo é onde eu existo.

segunda-feira, 30 de outubro de 2017

CORPO E REALIDADE

A realidade é uma condição fisiológica e não uma objetividade, algo que independentemente de nós existe como exterioridade. Por isso o mundo é sempre  como tal  nos parece possível.

Mesmo o "eu" que percebe  e pensa é tão virtual quanto as linguagens que o configuram. Em outras palavras, o corpo é a medida da realidade.

domingo, 29 de outubro de 2017

O TEATRO DO VERBO

Quando alguém acorda a vida das palavras, escreve sempre algo mais do que quer dizer. As palavras inventam o autor como um ator do  grande teatro dos significados.  Tudo que importa é a encenação dos enunciados inventando um enredo mais verdadeiro do que a própria existência. Mas raramente nos danos conta do quanto habitamos um mundo que a palavra inventa.