LÓGICA DO SENTIDO é um dos mais
fascinantes trabalhos deixados por Gilles Deleuze. Através dele, Deleuze nos
propõe uma teoria do sentido a partir de uma leitura da obra de Lewis Carroll
iluminada por considerações originais do pensamento estoico e seu lugar
decisivo na história da filosofia
ocidental.
A obra é estruturada através de
uma série de 34 paradoxos e, nas palavras do próprio autor, pode ser definida
como um “romance lógico e psicanalítico”. Para ele, Caroll foi o explorador e o estruturador
de um método serial em literatura. Os
estoicos, por sua vez, ao romperem com os pré- socráticos, os socráticos e os
platônicos, inventaram novas formas de pensamento onde paradoxos subvertem
tanto o bom senso quanto o senso comum, estabelecendo a ambiguidade, a dualidade e a incerteza, como
dimensões essenciais da própria linguagem. Ela estabelece seus limites na mesma medida
em que os extrapola, em que desloca o sujeito e a identidade.
“O paradoxo é, em primeiro lugar,
o que destrói o bom senso como sentido único, mas, em seguida, o que destrói o
senso comum como designação de identidades fixas.”
Os acontecimentos não devem ser
procurados em sua profundidade, mas na superfície. Parafraseando Deleuze, é
seguindo a fronteira, margeando a superfície, que passamos do corpo ao
incorporal. A continuidade do avesso e do direito substitui todos os níveis de
profundidade elevando ao nível da linguagem todo o devir e seus paradoxos.
A obra de Lewis Carroll
circunscreve no “mundo plano” do sentido-acontecimento, ou do
exprimível-atributo, onde tudo que se passa, passa-se na linguagem e pela
linguagem. O que significa que não devemos confundir aqui o acontecimento com
sua efetuação espaço-temporal em um estado de coisas.
Meu comentário é deliberadamente
marginal em relação ao denso conteúdo desta obra clássica da filosofia
contemporânea. O pequeno recorte aqui proposto em torno do lugar do paradoxo na
linguagem, apenas se destina a despertar alguma reflexão sobre o modo como
cotidianamente experimentamos a linguagem, sem reconhecer nela as ambiguidades
e dualismos que, muitas vezes, habitam nossos enunciados no jogo entre o falar
e o dizer e que transcende o eu das
proposições.