A
vida privada já não esta mais entre as quatro paredes de casa, mas na
capacidade de evadir-se da realidade através do herói de vídeo game. Esta relativa
indeterminação do eu frente a pluralidade de estratégias de devaneio é uma das mais curiosas novidades do tempo presente. Podemos vestir varias
personas, despi-las, esquece-las e usa-las de novo. Nos tornamos metamorfoses
constantes que já não cabem em qualquer rotulo especifico. O catálogo social
implodiu as tribos culturais. Temos tantas opções que já não precisamos
escolher. Assim, nossa própria intimidade tornou-se uma experiência pública. É preciso
que os outros nos digam quem somos na especificidade de cada circunstância e
momento. Por isso gostamos de brincar de ser um outro, esquecer do mundo e da privacidade proporcionada por um eu virtual. Afinal, ele mesmo, também não passa de simulacro.
Este Blog é destinado ao exercicio ludico de construção da minima moralia da individualidade humana; é expressão da individuação como meta e finalidade ontológica que se faz no dialogo entre o complexo outro que é o mundo e a multiplicidade de eus que nos define no micro cosmos de cada individualidade. Em poucas palavras, ele é um esforço de consciência e alma em movimento...entre o virtual, o real, o simbolo e o sonho.
terça-feira, 10 de janeiro de 2017
NOSTALGIA E TEMPO PRESENTE: A CONTEMPORANEIDADE DO PASSADO
A nostalgia do passado pode nos conduzir a uma falta de compromisso
com o tempo presente quando narramos uma experiência qualquer ou compartilhamos
uma memória. Pois não esta em jogo ai apenas uma lembrança, mas seu significado.
Tal significado é mais comunicado do que o fato narrado quando compartilhamos a memória de uma experiência vivida.
Mas é bom observar também que o próprio
significado é contemporâneo. Estamos assim falando de uma ação passada que se torna
representação presente. Nestes termos, o valor que atribuímos ao passado
através da nostalgia é também uma desvalorização do presente ou um modo de
viver o tempo presente evadindo-se no ontem. A nostalgia é tanto uma representação e reinvenção
afetiva de um tempo perdido como também uma ação no aqui e agora configurada
pela experiência presente desta perda, pela sua reelaboração contemporânea.
Objetivamente, o passado é tudo
aquilo que foi perdido. Não pode ser resgatado. A nostalgia é o paradoxo de
reinventar o passado como contemporaneidade, como paradoxal imagem do não ser e
silêncios que definem as insuficiências e ausências do tempo presente que, por
sua própria natureza, encontra-se fadado a um incacabamento constante.
segunda-feira, 9 de janeiro de 2017
A ILUSÃO DO CONHECIMENTO OBJETIVO
A ilusão fundamental do intelecto
moderno é a ingênua crença de que a realidade, em sua suposta e decantada
objetividade, possui uma regularidade, um ordenamento intrínseco, sendo a
natureza, portanto, inteligível e, portanto, racional. Assim fica assegurada,
desde que observado o método adequado, a conivência entre o dizer e o viver das
coisas. No acontecer das culturas e sociedades, o trabalho humano sobre a
natureza faz seguir a marcha do desenvolvimento da espécie, destes estranhos
bípedes, desde sempre predestinados a reinar neste pequeno e belo planeta.
A ilusão de tal raciocínio está
na ignorância do fato de que somos nós que inventamos a
natureza que observamos , que todo conceito, qualquer fenômeno, é uma
construção ou condição de nossa percepção. Tudo que para nós existe só pode
existir em termos humanos. Projetamos em tudo que existe nossa condição humana.
Decorre desta simples constatação
que nenhum conhecimento é esclarecimento ou desvelamento de um ser oculto das
coisas pelo precioso dom de nossa racionalidade. Não somos especiais. Apenas
narcisos a ponto de fazer de sonhar o mundo a sua imagem e semelhança. Compreender
o mundo é entender como pensamos e produzimos a realidade.
PARA ALÉM DO HUMANO
A grande questão hoje não é a
capacidade do ser humano transformar a natureza através da tecnologia, mas da
tecnologia transformar o ser humano extrapolando sua condição de artifício no
híbrido entre o não natural e o humano. Está em questão a hipótese de uma alteração
sem precedentes do imaginário social frente à falência do conceito de realidade
diante das estratégias do virtual e suas novas sensibilidades.
A metafísica da realidade fundada no conceito
de "Ser" e de "Verdade", na ontologia do real, já não mais se sustentam com o
deslocamento da ideia de identidade e reconfigurações da subjetividade. A
fabulação e a imagética podem condicionar mais a vida do pensamento contemporâneo
do que a linguagem verbal e sua racionalidade fundada em raciocínios lineares
encadeados por conceitos fechados.
Mas ainda não possuímos instrumental cognitivo para assimilar todas as
possíveis consequências das hipóteses
aqui vagamente apresentadas. Como, afinal, seria possível representar um mundo
onde toda representação deixou de fazer sentido?
quinta-feira, 5 de janeiro de 2017
DO MUNDO AO PENSAMENTO
“O pensamento não busca desvendar algum segredo do mundo, nem descobrir
sua face oculta- ele é essa face oculta. Não descobre que o mundo tem uma vida
dupla-é essa vida dupla, essa vida paralela. Apenas obedecendo a seus mínimos movimentos
despoja o mundo de seu sentido e o predestina a fins bem diversos que aqueles
que o mundo se da a si. Apenas seguimos seus traços, o pensamento mostra ao
mundo que, por trás de seus fins supostos, não vai a lugar algum.
O ato de pensar é um ato de sedução que visa a desviar o mundo de seu
ser e de seu sentido- mesmo correndo o risco do pensamento tornar-se, a si
mesmo, seduzindo e desencaminhando.”
Jean Baudrillard in A Troca Impossivel. RJ: Nova Fronteira,
2002, p. 152
A relação entre o mundo e o
pensamento, mediada pelo significado, não é definida pela realidade. O
pensamento é o não lugar do mundo. Através dele acrescentamos ao real uma
dimensão diversa da experiência imediata e concreta. O pensamento não é sua
representação, mas sua transfiguração. Assim, todo pensamento é uma forma de
ficção cuja matéria prima é a incerteza do mundo e da própria realidade. O pensamento tem vida própria e se fecha sobre
si mesmo adjetivando o mundo. Ele se destina a construção de sentido e
significado, a afirmação da subjetividade. Quase sempre habitamos em nossos
pensamentos e não no mundo como experiência sensível e imediata de nós mesmos.
Vivemos todos, de certa forma, alienados da realidade.
quarta-feira, 4 de janeiro de 2017
O EU E O SILÊNCIO
Só posso ser eu mesmo
Através do silêncio.
Pois quando falo
Parte de mim
São os outros.
Quase não me escuto
Quando digo o mundo.
Apenas me rasgo
No costurar do pensar
Através do qual me perco
De tudo aquilo que decora
A mais simples realidade.
terça-feira, 3 de janeiro de 2017
O AMANHÃ
Podemos viver anos a espera do dia seguinte.
Acordar todas as manhãs com a expectativa
De um amanhã autêntico.
Mas sempre estar de novo
Diante do ontem,
Do que sempre foi e será novamente.
O tempo não respeita o futuro.
Prefere as inercias, as tradições
E preguiças .
Prefiro o risco, o incerto
E o desconhecido
A sempre ver o mesmo rosto no espelho.
Preciso ser outro,
Estar sempre em transito,
Buscando...
Talvez no fim desta estrada
O amanhã ainda me espere.
segunda-feira, 2 de janeiro de 2017
HISTORICIDADE
Coisas vividas nunca serão
contadas
Em toda a sua intensidade.
Também não serão lembradas
Em sua máxima realidade.
Serão sempre reinventadas,
Recicladas e transformadas
Segundo as exigências
De cada tempo presente.
Nada é permanente.
Nem mesmo o passado.
O QUE É CONSCIÊNCIA?
O que é a consciência? Seria um
conhecimento das coisas, uma qualidade da mente ou a experiência da percepção
formatada por uma dada cultura? Não há
uma definição possível de consciência que não implique a própria consciência.
Isso nos conduz a uma situação delicada. Poderíamos dizer que uma anatomia da consciência
pressupõe a percepção, o processamento mental da informação e sua codificação
sensual e simbólica. Trata-se de um fenômeno fisiológico e mental. Toda consciência
é também uma forma de autoconsciência que só pode ser definida pela
consideração do seu oposto que é o inconsciente. A consciência é dada pelos
seus limites.
A questão é que a consciência não
esta no centro da totalidade de coisas que constituem uma existência humana em
todos os seus diversos níveis. Do molecular, passando pelo biológico e chegando
as suas mais complexas derivações, no mental.
Nossas ações não são orientadas
exclusivamente pela consciência, o que é redundante afirmar depois de mais de
cem anos da psicanálise. Mas o que é
mais pertinente é admitir que, do ponto de vista do senso comum, a consciência é
mais um estado do que um fenômeno. Não é algo que possa ser convertido em
objeto a não ser em casos nos quais testemunhamos um rebaixamento do nível de consciência
como, por exemplo, delírios e outras disfunções cognitivas.
Faz, portanto, algum sentido
questionar o que é a consciência? Qualquer resposta, por mais erudita e
fundamentada que seja, ainda será uma produção da consciência. Logo, duvidosa
pois personifica a coincidência do sujeito
e do objeto da própria questão. Mas não estaria ai justamente o interessante desta
interrogação limite? A consciência da consciência não seria um paradoxo?
O PARADOXO DA CONSCIENCIA
Não posso duvidar do acontecer do
meu eu ou que o próprio mundo existe. Mas meu existir é mediado pela consciência
assim como a atestação de toda existência. Isso faz da consciência, que
permanece fechada sobre si mesma, a medida de todas as coisas possíveis e impossíveis.
Só a o eu e o mundo dentro da consciência. O que torna sujeito e objeto duas
grandezas ilusórias. Pois o sujeito é seu objeto e vice versa, de forma que
ambos se anulam.
Somos como percebemos as coisas.
Não há um ser ou natureza a ser desvelada. Apenas consciência. Isso torna sem
sentido a ideia de verdade e faz complexo o conceito de eu e de mundo. A consciência
é consciência de ter consciência. Nada revela sobre as coisas, mas sobre si
mesma.
Talvez tudo que somos não passe
de uma grande farsa. Mas se for o caso, não temos como sabê-lo. Tal hipótese
tem pelo menos o mérito de nos permitir a não nos levarmos a sério.
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