segunda-feira, 19 de setembro de 2016

ALÉM DA DICOTOMIA SUJEITO E OBJETO

A objetivação da realidade através do conhecimento cientifico apenas nos faz  prisioneiros de conceitos abstratos e pragmáticos. Ela formatou a realidade de tal maneira que nos fez  subestimar  a dimensão irracional de nossas representações do mundo. Somos movidos  pela vontade  e ela, em ultima instância, molda o modo como percebemos objetivamente a realidade. Pensar é também um modo de perceber e ter consciência das coisas,  é o que define a vontade como um continuo impulso para além de si mesmo. Pensar e querer equivalem na apreensão do mundo. Pois tudo que concebemos como realidade  objetiva é representação, parte de nosso próprio acontecer no mundo enquanto ente. Assim, a realidade é uma configuração subjetiva e pouco faz sentido a clássica dicotomia entre sujeito e objeto, pois ambos coincidem enquanto gramatica de mundo e no ato cognitivo na medida em que o sujeito define o objeto e ambos existem como ato linguístico. 

terça-feira, 13 de setembro de 2016

SOBRE O PENSAR FILOSÓFICO

É um equivoco buscar no pensar filosófico  algum tipo de normatização para a vida prática. Tudo que ele nos oferece é um estranhamento do cotidiano e do senso comum. Tomando como referencia Hannah Arendt em  A VIDA DO ESPIRITO: O PENSAR, O JULGAR, O QUERER, ouso afirmar que a existência humana não pode ser explicada ou entendida a partir do encadeamento causal ou dialético dos fenômenos que lhe definem. Sua essência é a liberdade, a constante possibilidade do novo, do inédito, como ato desinteressado, como devir do discernimento. 

terça-feira, 6 de setembro de 2016

PÓS CONCEITO

A realidade é um desacordo entre a verdade e os fatos.
Estou tão certo disso que me engano afirmando positivamente
Qualquer enunciado vazio sobre o assunto.
Já estou farto de dizer o mundo,
De saber qualquer coisa além
Do simples e imediato acontecer da minha existência.
Tenho urgências que não cabem em qualquer conceito,
Em nenhuma premissa,

Geralmente penso contra mim mesmo.

segunda-feira, 5 de setembro de 2016

O CORPO COMO REFLEXÃO

Enquanto buscava a tranquilidade desapaixonada dos essenciais silêncios fui, aos poucos, escorrendo de mim, escapando as ansiedades e vontades, as certezas e convicções, para me saber apenas no sentimento do corpo. Respirar, olhar, tocar, era o mesmo que pensar. Não havia distinção entre o fisiológico e o filosófico na consciência precária dos fenômenos externos. Tudo era para mim auto consciência e a contingencia era tudo que fazia sentido. A vontade é o ponto onde o dentro e o fora coincidem como vida em movimento. 

sexta-feira, 2 de setembro de 2016

CO-AGENCIAMENTO, COLETIVO E LINGUAGEM

O coletivo é um hibrido de homens e coisas, uma infinitude de matérias heterogêneas entrelaçadas em uma rede de relações, compromissos e dissensos simbólicos  que nos levam a superação da logica dicotômica  estabelecida entre individuo e sociedade. Pois o coletivo é essencialmente linguagem,  lugar onde não há uma clara distinção entre as varias dimensões do real, na medida que é através delas que toda experiência possível torna-se inteligível enquanto tal. A premissa da linguagem, por sua vez, é o agenciamento, que como define Deleuze,

(...)  É uma multiplicidade que comporta muitos termos heterogêneos e que estabelece ligações, relações entre eles, através das idades, sexos, reinos - de naturezas diferentes. Assim, a única unidade do agenciamento é o co-funcionamento: é a simbiose, uma "simpatia". [p.84]- Gilles Deleuze e Claire Parnet: Diálogos, 1996.

O agenciamento é o principio de ligação das palavras, aquilo que estrutura o coletivo enquanto fenômeno totalizante, em outros termos,

....A unidade real mínima não é a palavra, a idéia ou o conceito; nem o significante, mas o agenciamento. É sempre um agenciamento que produz os enunciados. Os enunciados não têm por causa um sujeito que agiria como sujeito da enunciação, principalmente porque eles não se referem aos sujeitos como sujeitos do enunciado. O enunciado é o produto de um agenciamento, sempre coletivo, que põe em jogo, em nós e fora de nós, as populações, as multiplicidades, os territórios, os devires, os afetos, os acontecimentos. O nome próprio não designa um sujeito mas qualquer coisa que se passa, pelo menos entre dois termos que não são sujeitos, mas agentes, elementos. Os nomes próprios não são nomes de pessoas, mas de povos e tribos, de faunas e de floras, de operações militares e tufões, de coletivos, de sociedades anônimas e escritórios de produção. O autor é um sujeito da enunciação, mas não o escritor, que não é um autor. O escritor inventa os agenciamentos a partir de agenciamentos que se inventaram, ele faz passar uma multiplicidade na outra. O difícil é fazer conspirar todos os elementos de um conjunto não homogêneo, os fazer funcionar juntos. As estruturas estão ligadas às condições de homogeneidade mas não os agenciamentos. O agenciamento é o co-funcionamento, é a "simpatia", a simbiose. [p.65]
 idem.

O que aqui se apresenta é a recusa de qualquer logica dicotômica na construção e vivencia dos conceitos; uma concepção de relação entre as coisas que pressupõe o “lugar meio” do processo do dizer. Neste processo fluido, o coletivo, enquanto experiência ontológica, é um co-agendramento. Não há, assim, uma distinção entre individual e coletivo, já que o individual esta contido em um determinado ponto e, ao mesmo tempo, distribuído por toda uma rede de relações de fenômenos que compõem a totalidade do real.

Afinal, o que é um acontecimento?

UM TOQUE DE NARCISISMO

Deixo meus delírios a vontade.
Gosto da companhia das minhas antipatias,
Afetos, caprichos, humores e defeitos.
Nunca estou sozinho quando recolhido
Em meus mais íntimos recantos de rasa existência.
Sou acompanhado por pomposas fantasias,
Sonhos e imaginações errantes,
Contra o deserto e o mau gosto da realidade.
Por isso evito pessoas e gosto da superfície dos espelhos.

Em que outro lugar, afinal, poderia inventar bons diálogos?

quinta-feira, 1 de setembro de 2016

CONTRA O DETERMINISMO DA EXISTÊNCIA

Antes a vida humana era determinada pelos astros  ou pela providencia. Hoje é determinado pela realidade social e econômica, segundo os atuais portadores da verdade objetiva de plantão. Sempre alguma forma de determinismo impõe ao mundo uma ordem e soluções.

Mas, pessoalmente, prefiro acreditar que há mais acasos condicionando minha existência do que causalidades, sejam metafisicas ou materialistas. Nunca terei a vida que espero, mas aquela que me será possível através da soma absurda de variáveis que não cabem em qualquer planejamento. O futuro sempre fica pelo caminho e é ingênuo acreditar unilateralmente no imperativo das  circunstancias.


Não  determino todos os fatos da minha vida, mas sei que sou uma  combinação complexa de fenômenos  internos e externos diversos, cuja totalidade escapa a qualquer racionalidade estreita.  

quarta-feira, 31 de agosto de 2016

SOBRE O POUCO DIZER DAS COISAS

Dentre todas as possibilidades da minha cotidiana gramática da existência, escolhi os vácuos entre os silêncios para dizer quase nada. Melhor ser econômico com os pensamentos e não carrega-los com conceitos, teses, premissas ou conclusões fáceis e sistemáticas. Melhor passear a deriva entre uma e outra incerteza. Nenhuma verdade há de mudar o mundo. Então, por que me preocupar com o rigor do texto e o poder das minhas formulações? Pensar dever ser antes de tudo uma recreação, um esquecer de si mesmo. Não uma prisão ou o pathos de um intelecto que já não se reconhece nas pequenas e gratuitas coisas do mundo. 


A realidade não faz sentido. É puro entrelaçamento de acasos e erros que contrariam toda intencionalidade possível. Por isso não devemos ser escravos de nossas convicções. Tenho muito pouco a dizer que vale realmente a pena  ser ouvido.

segunda-feira, 29 de agosto de 2016

ALÉM DA DICOTOMIA SOCIEDADE/INDIVÍDUO

O eu é hoje um principio social tão decisivo que  não mais reconhecermos fronteiras muito nítidas entre nossa condição privada (pessoal) e pública (impessoal). 

Enquanto indivíduos não somos capazes de estabelecer uma relação com nós mesmos sem tender ao outro, ao que esta fora de nós. Assim, seria possível falar de uma zona irracional de interseção entre o individual e o coletivo. Simplesmente não podemos nos situar em relação ao primeiro sem nos inscrever no segundo.

Neste sentido, é saudável romper com a dicotomia construida pela modernidade entre o individual e o coletivo, pois existimos em individuação, em um cuidado de si que é também um saber e ser no mundo.

A intersubjetividade e as sociabilidades não se limitam a um pertencimento mecânico do individuo singular a uma comunidade ou sociedade. As paixões coletivas são geradas no plano dos sentimentos individuais. Já na micro-física de nossa intimidade,  ainda estamos longe de racionalizações que esgotem aquilo que cotidianamente nos faz humanos,  o retraimento e a futilidade que nos é imposto pelo nosso mais imediato "agir privado". Cabe hoje redefinir o campo da intimidade e seus protocolos irracionais. Quem somos quando não estamos em público revela o tipo de mascaras sociais que precisamos.


A IMAGINAÇÃO OCEÂNICA

Uma das minhas fantasias mais inspiradoras é a de descobrir uma “imaginação oceânica”, ampla, que nos inscreva no sentimento contraditório de existir como uma gota no oceano. Tal percepção subjetiva da nossa insignificância objetiva poderia conduzir a uma codificação menos confiante e mais realista de nossa condição humana. Aprenderíamos  a não nos levar demasiadamente a serio, a não proporcionar as situações cotidianas mais importância do que aquela que elas de fato possuem.


Não nos sentiríamos obrigados a viver e a pensar como deuses e muito menos a contar com qualquer forma de providencia na administração cotidiana da existência. Apenas não saberiamos que não somos especiais e o único sentido das coisas é sua assombrosa falta de sentido.

 A  imaginação oceânica nos minaria a vaidade e o excesso de confiança. Mas nos daria em troca uma certa n serenidade descrente, uma espécie de “descaso ontológico”. Não se trata de um caminho para a felicidade, mas para uma intensidade da experiência banal. Pois aprenderíamos, finalmente, que tudo o que pode ser vivido é superficial e transitório.