terça-feira, 20 de outubro de 2009

NIETZSCHE E O SIGNIFICADO DA HISTORIOGRAFIA



A coletânea ESCRITOS SOBRE A HISTÓRIA reunindo fragmentos de Fredrich Nietzsche sobre o tema, é uma referência indispensável para os críticos da modernidade e, mais especificamente dos defensores da pretensão a objetividade do conhecimento histórico.
Pode-se dizer que a historicidade, esta grande invenção do século XVIII, é inerente a imagem de mundo cristalizada pelo espírito moderno e suas teleologias racionais assentadas sobre o vicio da verdade que inspira toda tradição ocidental.
O mais radical exemplo de tal filosofia encontra-se no sistema hegeliano e na sua concepção de História como processo contra a qual Nietzche se insurge ferrenhamente em sua critica ao historicismo. É essencialmente contra a idéia de totalidade, de universal e identidade articuladas pela racionalidade sistêmica dos conceitos que Nietzche elabora sua critica a historiografia de seu tempo.
Para ele, o mundo, o homem e a natureza existem em devir, em uma intricada pluralidade de processos ou fluxos inspirados por uma potência cega condicionada apenas ao acaso e a necessidade.
Nestes termos, perde qualquer sentido a hipótese de uma “História Universal” ou racional. O que é muito coerente com a leitura que o filosofo fazia de sua época como um momento de reviravolta de todos os valores e na qual anunciava a boa nova da “Morte de Deus” ou do fim definitivo de toda metafísica, de todas as finalidades e sentidos tradicionais.
Destaca-se na coletânea aqui comentada a “ II Consideração intempestiva sobre a utilidade e os inconvenientes da História para a vida”,onde o autor desenvolve a premissa de que o elemento histórico e o elemento a-histórico são igualmente necessários à saúde de um indivíduo, de um povo e de uma cultura:

“... A serenidade, a boa-consciência , a atividade alegre, a confiança no futuro,- tudo isto depende, num individuo, assim como num povo, da existência de uma linha de demarcação entre o que é claro e visível e o que é obscuro e impenetrável, da faculdade de sentir com um poderoso instinto quando é necessário ver as coisas sob o ângulo histórico, e quando não. Este é exatamente o princípio sobre o qual o leitor é convocado a refletir: o elemento histórico e o elemento a-histórico são igualmente necessários à saúde de um individuo, de um povo, de uma cultura.”

( II Consideração Intempestiva sobre a utilidade e os inconvenientes da História para vida. In Fredrich Nietzsche. Escritos sobre História./ Apresentação, tradução e notas de Noeli Correia de Mello Sobrinho. RJ: Ed. PUC-Rio; SP, Loyola, 2005, p.74 )

Tal relativização da consciência histórica elege a vontade livre como cifra para a singularidade humana. Sem ela o individuo dilui-se na impessoalidade do processo histórico, torna-se um apêndice dele, o mesmo ocorre com uma cultura ou “povo”. A individuação,.. A singularidade social e pessoal, reside no a-histórico de uma “consciência irônica de si mesmo” além de toda referencia de processo e sentido temporal...

PRIMAVERA E MATERIA




Rendo-me ao paraíso

De pequenas vontades
E mínimos prazeres
Que enfeitam os dias doces
De primavera.

Tudo se faz demasiadamente
Simples
No acontecer do querer
Que me sustenta.

Sinto-me vivo em cada coisa
Que conquisto e faço
Em lúdico exercício
De físico e concreto
Pensar das coisas
em simbólicos paradoxos.

ESPECULAÇÕES SOBRE O CONCEITO DE PÓS-CULTURA

Depois do fim do longo século XX, marcado por tensões ideológicas e violências sociais e políticas, é cada vez mais difícil associar cultura a identidades coletivas orgânicas e coerentemente articuladas em um ethos ou sensibilidade.

Já não cabe a cultura re-presentar socialmente o mundo, mas formatar a superficialidade e aparência do individuo em meio ás cotidianas frivolidades inerentes a existência.
A cultura agora não passa de uma mascara densa e inútil que vestimos para viver nossas fantasias de realidade...

domingo, 18 de outubro de 2009

NOTA PARA REDEFINIÇÃO DO CONCEITO DE CULTURA



Nossas representações contemporâneas de mundo são um amalgama impreciso e incerto composto de inúmeras citações. Já não cabe falar mais em visões de mundo ou ideologias, pois já não somos capazes de acreditar ou viver de acordo com qualquer prerrogativa de fé ou crença em qualquer invenção do intelecto humano.

Sabemos que equações matemáticas ou tautologias não remetem a qualquer realidade objetiva. Categorias como “necessidade”, “leis naturais” ou “valor” não são aplicáveis de modo convincente as descrições do real que nos povoam e orientam cotidianamente.
Tal ceticismo em relação as possibilidades do conhecimento humano nos afasta da sedução da verdade, da vocação que temos para nos confundir com criações do intelecto a ponto de derivar delas identidades e visões de mundo. Toda modalidade de saber já não passa de uma relativa codificação do real sobre a qual nunca estamos inteiramente seguros.
Nem mesmo a maior ou menor eficácia alcançada por este ou aquele campo do conhecimento cientifico personificados por suas realizações pragmáticas, parece ser um critério valido para atribuir valor a qualquer pensamento. Pois não importa quais sejam suas premissas ele será irremediavelmente arbitrário e unilateral...
Em poucas palavras, deslocado da idéia de verdade e de significação ontológica os saberes humanos convertem-se cada vez mais em performance do espírito. O que significa que, se para modernidade o método das ciências naturais foi o grande modelo para construção de saberes, a arte tende a desempenhar papel análogo no indeterminado da pós modernidade.

BIG NIGHT

Agora mesmo

Há flores florescendo
Em algum telhado
De antiga casa de subúrbio,
Luzes decorando calçadas
No espelho de uma poça
De chuva
E tropeços embriagados
No caos do passeio público.

A noite me abraça
Enquanto visto
Minha própria sombra
Na magia da madrugada.
Nada mais existe
Alem deste instante
Simples...

terça-feira, 13 de outubro de 2009

SOBRE O NÃO SENTIDO DA VIDA E A IMANÊCIA COMO PRINCÍPIO

Vivemos todos abandonados ao passar do tempo, entregues ao aleatório acontecer das coisas, administrando emoções e pensamentos diversificados e conflitantes.

Tudo faz pouco sentido... Mas a vida, pura e simplesmente, parece-me suficiente em meio ao acumulo do efêmero e das imanências cotidianas.
Tudo é aparência... Não há qualquer profundidade a explorar ou nos iludir como meta. Apesar de nossas intuições de transcendências, o tempo sempre nos ultrapassa na simplicidade tosca do dia a dia e nada há alem disso...

RED DAY

Preciso

de uma gota de silêncio
para olhar a vida
nos olhos
e explorar nervoso
todas as cores
da existência. ,
esquecer-me
Tão completamente
A ponto de perceber
A beleza de um dia aberto
Em riscos e possibilidades...

segunda-feira, 12 de outubro de 2009

ALLEGORIES OF READING

Sob o apagamento

Constante do tempo,
Procuro-me em restos
De infância,
Em desfeitos momentos
E metafísicas ruínas
De familiares lugares perdidos...

Em parte alguma me encontro
Ou surpreendo em encanto
De estar simplesmente
No mundo...




Todas as coisas
Passam mudas
Em progressivo infinito
Para o absoluto vazio
Que constantemente
Nos transforma em realidades...



ESPECULAÇÕES PÓS MODERNAS SOBRE O CONCEITO DE REALIDADE E INDIVIDUALIDADE



O conceito moderno de subjetividade, fundado na premissa de que o homem é dotado de uma consciência autônoma e de uma racionalidade cognitiva pré-figuradora de um “eu” funcional, já não nos parece convincente no tempo presente. O velho conceito de “eu” é cada vez mais deslocado pelo revisionismo do conceito de simulacro, diante do qual o “eu” só pode ser um principio de incerteza, algo múltiplo e discontínuo condicionado a eficácia de nossas sempre provisórias codificações do mundo e da “realidade”. Em outras palavras, tudo é linguagem e, ao mesmo tempo, condicionado a uma variável incerta sem lugar no tempo e no espaço que nos corresponde aos instintos nos animais. C G Jung procurou dar conta dessa dinâmica que define a condição humana através do conceito de arquetipico e de individuação.

Mas ainda estamos longe de qualquer conclusão... ou de uma satisfatória fantasia ou codificação do abstrato de nós mesmos e do real...

quinta-feira, 8 de outubro de 2009

UM FRAGMENTO DE LUDWIG WITTGENSTEIN II


Se considerarmos óbvio que um homem aufira prazer de suas próprias fantasias, lembreme-nos que a fantasia não corresponde a uma imagem pintada, a uma escultura ou a um filme, mas a uma formação complicada, de componentes heterogêneos- palavras, imagens, etc. Então, não contrastaremos o operar com signos escritos e falados com o operar com “imagens da imaginação” de eventos.


(A feiúra de um ser humano pode ser repelente num quadro, numa pintura, como na realidade, mas pode também ser repelente numa descrição, em palavras.)

A postura para com uma imagem ( para com um pensamento). A maneira como experimentamos uma imagem torna-a real para nós, isto é, liga-a com a realidade, estabelece uma continuidade com a realidade.


( O medo liga uma imagem aos terrores da realidade.)

( Ludwig Witgenstein. Gramática Filosófica/ organizada por Rush Rhees/tradução de Luis Carlos Borges. Edições Loyola, 2003, p. 137 )