The Beatles: The Biograpby de Bob Spitz, até onde sei, é atualmente a mais importante referência biografia para uma compreensão sóbria da vida e obra da maior banda de rock de todos os tempos. Não seria descabido afirmar tratar-se de sua biografia definitiva dado o raro e singular rigor empregado pelo autor em sua pesquisa. Afinal, os Beatles não são um universo fácil de reflexão quando consideramos o terreno mofetiço e ilusório representado pelo abundante conjunto de fontes disponíveis sobre sua carreira e biografias.
Escrever sobre os Beatles pode ser, não duvide, uma boa experiência para historiadores profissionais... Um exercício de desconstrução, desmistificações e incertezas sem paralelos...
Em suas NOTAS SOBRE AS FONTES, o autor nos ajuda a entender melhor o porque:
“Um dos empecilhos para a preparação de uma biografia definitiva dos Beatles é a impressionante falta de material de pesquisa confiável. A maior parte dos quinhentos volumes que formam o seu cânone carece de citações corretas, e, mesmo naqueles casos extraordinários em que as fontes são identificadas, a exatidão permanece duvidosa. Ou as lembranças eram vagas, as narrativas recicladas e os fatos não verificados ou as circunstâncias eram fabricadas ou obscuras- algumas vezes por testemunhas preconceituosas, outras vezes para proteger inocentes. Para o bem e para o mal, informações falsas sempre foram um elemento chave da lenda dos Beatles.
O âmbito dessas informações falsas deve bastante à frase de Napoleão que afirmava que “ a história é um conjunto de mentiras com as quais todos concordam.” Isso se tornou bem claro para mim logo no inicio das pesquisas para este livro. Durante uma entrevista com Paul McCartney, ele explicou como, à quase quarenta anos, os Beatles concordaram em ter uma “versão dos fatos” que lhes serviria de história, e eles se mantiveram fies a ela- além de enchê-la de detalhes- desde então. Paul me contou que “cerca de 65 por cento” da biografia oficial do grupo, intitulada The Beatles- escrita em 1967 pelo jornalista Hunter Davies-, é correta. ( referindo-se ao livro durante uma grande entrevista em 1970 com Jann Wenner, John Lennon disse: Era tudo conversa mole[...] minha tia [ Mimi] eliminou todos os detalhes verdadeiros da minha infância e sobre minha mãe. [...] Eu queria que o livro publicado fosse verdadeiro, mas todos nos tínhamos esposas e não queríamos magoar os sentimentos delas”.) Além do mais, todas essas histórias foram contadas e recontadas tantas vezes que nem mesmo Paul McCartney tem certeza de onde começa e onde termina a verdade- um dos motivos, sem dúvida, para que se refiram ao belo Antologia como “Mitologia”. Em todo caso, a “biografia oficial dos Beatles” não só esta lotada por testemunhos criados e adoráveis contos de fadas, mas também de incorreções: nomes escritos de forma errada, datas incertas, locais confusos- e grande vácuos.
Mesmo assim, confiei no livro de Davies como subsídio a minha própria pesquisa. As histórias verbalizadas nele pelos quatro Beatles-seus comentários informais, assim como suas versões imprevisíveis de eventos a tempos esquecidos- são, entretanto, intensas e fornecem os últimos relatos vividos ( e fascinantes) de certas travessuras. Apesar de eu ter incorporado algumas citações daquele livro nesta biografia, estejam certos de que elas foram analisadas detalhadamente para que houvesse certeza de estarem corretas, ou então escolhidas por conterem reflexões pessoais que são incontestáveis pela honestidade. Por último, seja dito que, quando tratamos de muitos dos participantes deste livro- os pais de George Harrison; a tia de John, Mimi, e seu pai Freddie; a mãe de Ringo; Millie Best; e outros personagens secundários-, o livro de Davies permanece como o único testemunho válido dessas pessoas nessa história marcante.”
( Bob Spitz. The Beatles: a biografia./ Vários tradutores. SP: Larousse do Brasil, 2007, p. 853-854.)