domingo, 18 de novembro de 2007

DELIRIO CRONOLÓGICO

O futuro do meu presente
É o passado imperfeito
De um sonho ingênuo.
Pois escrevo-me no tempo
nas sombras dos fatos
que me arrastam
as margens das horas e rumos
de onde contemplo
as infinitas águas
do finito da vida
entre o agora e o outrora
que me observam distantes
pela porta
da alma dos fundos.

PERDIDO PENSAMENTO

Entre as vielas e vozes
Da tarde aberta
Caiu um pensamento
Que sustentava
Um céu quase certo.
Perdeu-se ali com ele
Alguma descartável
Certeza de vida,
Alguma presunçosa verdade
Que de tão profunda
Abandonou-se ao vento
E abraçou
O gratuito esquecimento
Em um segundo
De intensa e irrefletida vida.

terça-feira, 13 de novembro de 2007

SENTIR-SE

Indiferentes
Ao assédio do sol
Meus eus dispersos
Em vastos desertos internos
Encontram o sono da vida
E o sonho de espelho
Na face da lua,
Vislumbram
A irrealidade do mundo
Diante do sentimento
De mim mesmo
Perdido em palavras
E deitado no vento
De vontades urgentes

SHAKESPEARE E O RENASCIMENTO INGLÊS


O renascimento inglês, se comparado ao caso italiano, pode ser considerado um fenômeno tardio. Os dois condicionantes, por assim dizer, de sua ocorrência seriam a ascensão ao poder da Dinastia Tudor, com Henrique VII em 1485, e a difusão do calvinismo ou as conseqüentes tensões e disputas religiosas que marcariam especialmente o séc.XVI. Cabe ainda ressaltar que no caso inglês a “cultura renascentista” circunscreveu-se a expressão musical e literária, atingindo sua mais representativa realidade através do chamado Teatro Elisabetano. Assim sendo, não deve causar estranheza a afirmação de que Shakespeare ( 1564-1618) foi definitivamente um dos mais significativos e expressivos artistas renascentistas de toda a Europa. Talvez aquele que, mais do que qualquer outro, ao dizer os dilemas, angustias e imaginações do seu tempo, foi capaz de dizer, para alem de sua própria época, os labirintos da condição humana.
Através de seus sonetos, comédias e tragédias, Shakespeare construiu uma obra ambivalente e paradoxal; a um só tempo popular e erudita, medieval e moderna, mas acima de tudo vertiginosamente humana...
Evidentemente esta é apenas a primeira referência ao velho bardo neste blog, algo abaixo de uma introdução e um pouco acima de um comentário.

terça-feira, 6 de novembro de 2007

NOTURNO

Lembro-me
Do novo de coisas antigas
Que provei em
Noites distantes.
Momento em que
Um vento se fazia
Vivência de algo ausente,
Um vazio a povoar
E percorrer memórias,
A decorar a casa e o corpo
Na embriagues do infinito
Em movimento.

BEATLES E A MAGIA DE Sgt. PEPPER'S


Ruber Soul e Revolver demarcam um momento de transição na musicalidade dos Beatles. Se até então eles poderiam ser considerados um fenômeno musical adolescente, dentre outros, encontravam-se então, convertidos em banda de estúdio, prestes a transmutarem-se no fabulous four que mudariam para sempre o cenário musical do rock mundial.
Cabe observar que músicais como Taxman, Tomorrow never Knows e Yellow Submarine, já introduziam, mesmo que ainda discretamente, uma nova poética e musicalidade que seria levada as últimas conseqüências em 1967 com o lançamento do explosivo Sgt. Pepper’s Lonery Hearts Club Band.
Difícil para mim aqui enumerar todas as inovações então apresentadas pelos Beatles nesse ousado trabalho. Sgt. Pepper’s é na verdade um grande teatro alegórico onde o virtual espetáculo de uma banda imaginária dá o tom de uma viagem musical psicodélica em treze faixas quase encadeadas em um só fôlego, dada a ausência de intervalo entre elas, que reúnem uma diversidade sem paralelos de estilos, desde música indiana, erudita, folk, vaudeville, efeitos especiais, etc.
A própria capa do álbum já é suficiente para causar perplexidade com os Beatles fantasiados com uniformes coloridos, cercados de personalidades famosas e enigmáticas, além das referências cifradas a morte de Paul McCartney.
O mais curioso é que a audição de faixas como Lucy in the sky with diamonds ou With a little help from my friends nos dias de hoje não provoca o estranhamento de estarmos diante de um monumento sonoro do passado, mas a surpresa de uma música, ainda nos dias de hoje, contemporânea, capaz de criar uma espécie de “não lugar”, ou comunicar com toda força a metalinguagem musical que define as mais universais criações artísticas de todos os tempos.

segunda-feira, 5 de novembro de 2007

ROCK E CULTURA MUSICAL

Pode-se-ia escrever a História do Séc. XX exclusivamente através de sua música. Para muitos foi um século inconvenientemente barulhento, onde a urbanização crescente somada ao avanço tecnológico povoou o cotidiano humano de uma ilimitada e caótica quantidade de sons e ruídos a ponto de transformar ou “transtornar” a sensibilidade coletiva de modo realmente sem procedentes.
Abordando um ponto especifico da cacofonia moderna, diria que a reprodutividade técnica ilimitada de execuções musicais desmistificou e desritualizou a experiência musical ao tornar possível, em qualquer lugar e hora do dia, preencher nossas vidas e momentos com música. Sem isso seria impossível pensá-la como como um elemento produtor de sociabilidade, de exercício de vida interior em êxtase participatório ou comunitário que em alguma medida realiza o não verbal da vida e de nossa condição humana.
Foi através da difusão do radio e depois do long play que a sonoridade converteu-se em suporte de uma cultura, em um habito social identificado principalmente com os jovens e seus acervos musicais cultivados com tanto gosto e carinho como antes se mantinha uma biblioteca. Mas foi nos Estados Unidos e na Europa do pós guerra que essa nova cultura consolidou-se definitivamente com o advento do Rock in Roll iniciando um dos fenômenos mais curiosos do século.

CRÔNICA RELÂMPAGO XIII

Tudo na vida depende de tempo. Algumas coisas exigem mais tempo do que gostaríamos para desembocarem em realidades vividas e, não raramente, o fazem de modo diverso daquele que imaginávamos ou pretendíamos. A vida é como um jogo de xadrez onde nunca conseguimos antecipar satisfatoriamente os movimentos do adversário que é o nosso próprio destino, algo que surpreendentemente encontra-se dentro de nós mesmos e não na infinidade de questões e situações que nos povoam no palco do tempo humano.
Tudo na vida depende de tempo... porque só sabemos de nossas ansiedades e imediatas necessidades anímicas no cultivo de idealizados rostos e auto imaginações refletidas na face dos dias. Ignoramos imprudentemente as astúcias e segredos saturnais....

LITERATURA INGLESA XIII


“ A gente sabe que acertou quando aquilo que se escreve possui uma verdade e uma realidade dez vezes mais poderosa que a realidade original”
Hemingway

A literatura de Ernest Hemingway ( 1899-1961) é como um delicado artesanato cuja matéria é a própria vida imediata. Amante do Box, guerras, caçadas e touradas, este romancista e ensaísta norte americano dedicou-se como ninguém a voluptuosa e sensual experiência de viver, convertendo-a no próprio sentido da arte de escrever. De certa forma, pode-se dizer que tamanho mergulho na matéria da vida justifica seu suicídio como única opção trágica frente a franca decadência física e mental impostas pela doença.
Dentre seus contos conheço apenas “O Lutador”. Limitei-me até o presente ao sabor de dois de seus romances mais conhecidos: “O velho e o Mar” e “O sol também se levanta”. O suficiente para ter uma nítida idéia do homem por traz da cuidadosa prosa.
Hemingway foi antes de tudo um aventureiro, um homem profundamente mergulhado em seu tempo. Como jornalista, participou da cobertura das duas grandes guerras mundiais e freqüentou ao longo de sua vida lugares como África, Espanha, Itália e Cuba. Jamais foi, entretanto, um escritor engajado como muitos de sua época, apesar de declarar-se partidário da Revolução Cubana. Na verdade Hemingway foi um grande solitário profundamente mergulhado no imediato de sua própria vida...

AS DEUSAS E A MULHER: NOVA PSICOLOGIA DAS MULHERES


Nas últimas décadas assistimos ao desenvolvimento, principalmente nos Estados Unidos, de uma ampla releitura da mulher e do feminino enquanto realidade e imagem psíquica ou simbólica. A hoje chamada “nova psicologia das mulheres”, inspirada pela psicologia analítica inaugurada por C G Jung, é um dos mais fecundos produtos deste revisionismo cultural.
Um interessante exemplo é o trabalho da psiquiatra norte americana Jean Shinodra Bolen: As Deusas e a Mulher: Nova Psicologia das Mulheres. Neste, a partir da imagem de sete deusas gregas: Demeter, Perséfone, Hera, Hestia, Atena, Ártemis e Afrodite, a autora procura apreender através de padrões comportamentais e traços de personalidade elementares os múltiplos imperativos psíquicos que definem o movimento diverso de coisas que é cada mulher.
Como ressalta a autora, a condição feminina é condicionada não apenas a estereótipos culturais em seu relacionamento com o mundo, mas também a grandezas arquetipícas peculiares em sua relação consigo mesma.
A compreensão destas grandezas psíquicas interessa tanto as próprias mulheres quanto aos homens, pois nos conduz a uma consciência e a uma experiência mais complexa da própria condição humana. O mito da Grande Deusa e das deusas enquanto imagem da psique coletiva mostra-se pertinente em tal empreendimento na medida em que:

“Quando um mito é interpretado intelectual ou intuitivamente, isso pode resultar em alcance novo de compreensão. Um mito é como um sonho do qual nos lembramos, até mesmo quando não é compreendido, porque ele é simbolicamente importante. De acordo com o mitologista Joseph Campbell, ‘ Sonho é mito personalizado; mito é sonho despersonalizado’. Não é de admirar que os mitos invariavelmente pareçam algo algo vagamente familiar”
( Jean Schinoda Bolen. As Deusas e a Mulher: Nova Psicologia das Mulheres/ tradução de Maria Lydia Remédio; revisão de Ivo Storniolo. SP: Paulus,1990 ( Coleção Amor e Psique), p. 2)