quinta-feira, 11 de janeiro de 2024

O PASSADO COMO DOENÇA


Há um passado
que não para de crescer
contra o tempo presente
em nome do avanço de uma antiga catástrofe civilizacional.

Ele vem do norte
como uma grande avalanche
que nos carrega em sua queda.

Este passado se chama Razão
e cresce com nossa ilustração*,
com nossa fome de Estado,
de controle e de progresso,
como um  processo tecnológico,
quase tétrico teológico,
de absoluto narcismo.

Nosso triste sonho de vaidade 
é a apoteose do delírio
de uma história universal
inspirada pela acumulação de riquezas e bens
da qual toda forma de vida 
se tornou refém.

O poder é o passado personificado
como espírito nacional,
como projeto colonial,
desigual, racial, racional
e como solução final
para todos os dilemas da humanidade.

O poder é  o passado como exploração
do outro e da natureza,
como ambição pessoal,
como destruição do que pode e poderia ser.

Logo, 
 ninguém existirá 
para abrigar lembranças,
não haverá futuros ou tempo presente,
mas apenas o devir vazio
de uma eternidade morta e enterrada
sob o passado de nossa humanidade indecente,
devorada por suas guerras,
teologias e verdades supremas, 
por sua ambição desmedida
na contramão de toda natureza.

Tudo em nome do Estado e do progresso universal
que só será  pleno com nossa aniquilação,
com o triunfo do nosso passado.



* Aufklãrung














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