quarta-feira, 28 de julho de 2021

O SENTIDO DA ARTE

Para qualquer artista a realidade é  uma prisão, 
uma ilusão verdadeira,
frente a qual a obra é uma estratégia  de fuga, 
uma busca de qualquer coisa mais profunda
além do jogo infantil entre sujeito e objeto.
Arte é  criar qualquer coisa mais real do que o próprio mundo.

terça-feira, 27 de julho de 2021

CERNUNNUS

Tenho a idade dos meus fracassos,
das minhas perdas
e arrependimentos.

Garanto que sou mais velho
do que aparento,
carrego o peso das idades do mundo
na leveza do agora fugidio.

Não sou apenas este eu recente,
limitado e provisório 
que não  resiste aos anos.

A parte mais importante de mim
é aquela que fora do tempo
segue livre entre animais
no coração da floresta.

UNIVERSO EM EXPANSÃO

Não  existe inércia. 
Tudo é  movimento,
coincidência de opostos,
deslocamento de si
e do mundo,
nas metamorfoses
do tempo e do espaço,
em uma mente que se expande
ao infinito do corpo vivo.

segunda-feira, 26 de julho de 2021

TEXTO

Cada texto é  como um mar,
uma força viva da consciência, 
em movimento ondulado de palavras 
que me arrastam
para longe do agora
no sem tempo da imaginação
e do sonhar.

Cada texto é  um lugar
que me desabriga,
que tira da boca a frase feita,
cotidiana,
e suja de feijão.

Quase me afogo num pensar
que me engole através  do escrito,
que me leva,
e desfaz o mundo
em outros mundos que não  cabem na vida
ou na ilusão  do possivel.

Textos são corpos
que se toca com os olhos.
O pensamento é  sua pele,
mas corre como um rio.


Textos são movimento,
Textura, sensação, 
ato abstrato e verbo.

Todo texto é sujeito.






sábado, 24 de julho de 2021

O CORPO E O DIZER

Não existem erros no plano da escrita livre que recusa toda ordem discursiva, que sabe o abismo da retórica  contra a norma do dizer verdadeiro e racional. Existem palavras e conceitos que ainda não  foram inventados, imagens de pensamento  que não foram ainda exploradas na trasvalorização  de todos os valores.
Toda mudança  das formas de vida possiveis começa na intensidade de novas texturas de sensações alcançadas através de um dizer que nos acontece como abstrata materiaridade corporal.

SER & NÃO SER

Ser si mesmo é  qualquer forma de não ser no acontecer do eu, mas saber o eu como um modo impessoal de ser outro entre os outros, saber-se devir não humano como expressão  do mundo.  In-sistir em ex-sistir é uma forma de presença em indeterminação e devir contra todo sedentarismo narcisista do social.

sexta-feira, 23 de julho de 2021

VIDA MOVIMENTO

A vida não  é  um projeto,
não tem qualquer meta.
Ela é  devir,
quase acontecimento,
um movimento que supera a inércia, 
a fantasia do ser e da verdade,
no indeterminado e sempre renovado instante
do abandono de si
na breve coincidência do mundo e do eu.

segunda-feira, 19 de julho de 2021

CORPO-COISA

Não quero ser o outro dos seus enunciados,
nem o herói dos meus discursos.
Não pretendo ser sequer mais um humano.
Pretendo me desaprender como ente
no saber do corpo-coisa
em natureza e ato
de desaparecer no correr do tempo do meu desapego.

domingo, 18 de julho de 2021

SOBRE LIVROS

Cada livro é um acontecimento.
Alguns me inventam contra o mundo,
outros me roubam o rosto,
mas poucos guardam enunciados
que se escrevem na minha pele
vestindo meus pensamentos.

CONTRA IDENTIDADE

Conformar-se a qualquer identidade diminui a criatividade subjetiva, estabelece o conformismo e a norma de um sujeito marginal de direito que busca novas formas de poder e não  o inédito  da liberdade como criação ou arte de inventar a si como experimentação.
É preciso pensar/fazer um novo asceticismo.

quinta-feira, 15 de julho de 2021

NEO PRIMITIVISMO

Cansei de ser narciso,
de fazer da vida biografia,
aventura de um eu capenga,
efêmero, 
imagem e semelhança 
do ser de um homem sem fundamento.

Cansei de fazer sentido,
de habitar discursos,
conformismos e estruturas.

Daqui pra frente serei natureza.
Seguirei errante,
sem explicações e soluções,
em intensidades e imanência.

quinta-feira, 8 de julho de 2021

CULTO A PROMETEU

 

Devir contra as certezas do homem

nas mutações do inumano assignificante

é o que nos resta contra todos os deuses,

contra toda moral e valor sedentário.



O intempestivo brilha como relâmpago

no peito da tempestade

iluminando a natureza selvagem.



Apaga-se o brilho da velha razão.

Acende-se o fogo primordial.


 

ULISSES PÓS MODERNO

 

Nunca em seus olhos as lágrimas secavam, e ia-se sua doce vitalidade, chorando pelo retorno…
(Canto V – A Odisseia)



A dor de perder-se

do lar e dos outros,

de seguir sozinho

na contramão dos anos,

sem jamais retornar

a casa antiga,

fez dele

um Odisseu pós moderno.



Itaca está morta

e a terra gira.

Não há mais origem

para o navegante nômade.

Sua vida agora

é um trabalho da morte.




quarta-feira, 7 de julho de 2021

VIDA

Toda vida é  pública,
participativa, impessoal,
e perecível
em sua singularidade.

Toda vida é  finita,
intangível,
desconhecida,
em sua abissal banalidade.

Vida é  um atributo da espécie
alheio a nossa pessoal mortalidade.
A vida não tem rosto,
é corpo,
que não se mede no espaço do tempo. 
 
Vida é matéria.
 



terça-feira, 6 de julho de 2021

DAS NUVENS NO CÉU

A arquitetura das nuvens na amplidão azul do vazio do céu  fere meus olhos .

Percebo-me subtraido de mim mesmo diante do firmamento.

Sei que o céu é ateu e debocha em silêncio  da nulidade do humano.

Ele nos assombra com a indiferença da natureza,
com a insignificância da vida,
frente a imanência da imensidão silenciosa.

A imaginação  das núvens não  tem limites
e não sabe nenhuma razão.
Pois o céu é o domínio do caos e do vento
e as nuvens um brinquedo do acaso.

As halturas das asas dos pássaros
não  sabem o mais profundo do céu. 

 



quinta-feira, 1 de julho de 2021

A IMPORTÂNCIA DO INÚTIL

Interessam-me, demasiadamente,
as coisas que não  levam a nada,
que são gratuitas e ridiculas.

Gosto de me perder do mundo
na superfície do ordinário
sem me importar com a vida.

Gosto do inumano,
de tudo que é  estranho ao pensamento e convenções.

Não  reconheço a soberania do eu,
a causalidade ou a necessidade
como matriz da realidade.
Não  sou seduzido por convicções 
verdades prontas e coletivas.
Detesto pactos sociais.

Sou livre de humanismos
e não domestico a natureza
com a teleologia da razão  e do sentido.

É nas sensações que existo,
que me desfaço e persisto
contra a consciencia das coisas,
alheio as modas e modos da sociedade.

Discontínuo e inconcluso
duvido de mim mesmo
e desacredito no mundo.
Sou sempre um outro que me olha, 
que me sabe do lado se fora
Moranda dentro de mim.

Não tenho objetivos.
Tudo em mim leva a nada.
Como neste instante em que me misturo com uma folha
que agora a pouco
caiu de um galho de àrvore. 






A PALAVRA

É  certo que a palavra é  signo,
símbolo,
imagem.

Mas ela também  é  som,
garganta, boca, língua e ouvido
que escapa ao texto
contra o livro,
contra o poder e o saber de dizer,
fazer , sofrer,
domar e escrever o real
que nos lê em silêncio.

Ela é  antes de tudo delirio,
imaginação, lugar e corpo do ser.

A palavra é  ação, 
verbo, criação, 
guerra e destruição
de um "eu"que existe sempre
como um "nós"
e contra tudo.

A palavra é  paradoxo, 
simulacro,
duração 
real ilusão.