segunda-feira, 23 de outubro de 2017

A ESCRITA COMO LABIRINTO

"...Se fosse um escritor, só falaria a partir da minha própria linguagem e no encantamento de sua existência hoje. Não sou nem uma coisa nem outra, estou nessa distância entre o discurso dos outros e o meu. E meu discurso nada mais é do que a distância que tomo, que meço, que acolho entre o discurso dos outros e o meu. Nesse sentido, meu discurso não existe, e é por isso que não tenho de modo algum a intenção nem a pretensão de fazer uma obra. Sou o agrimensor dessas distâncias, e meu discurso não é mais que o metro absolutamente relativo e precário por meio do qual meço todo esse sistema de afastamento e de diferença. Medir a diferença com aquilo que não somos, é nisso que exerço minha linguagem e é por isso que lhe dizia agora há pouco que escrever é perder seu próprio rosto, perder sua própria existência. Não escrevo para dar à minha existência a solidez de monumento. Tento antes reabsorver minha própria existência na distância que a separa da morte e, provavelmente, por isso mesmo, a guia para morte."
Michel Foucault in O Belo Perigo. Conversas com Claude Bonnefoy

Escrever sempre foi para mim uma forma de me perder através da abstrata geografia deste estranho artifício humano chamado linguagem. Aprendi desde cedo a viver um desencontro sempre renovado entre o dizer e o ser lidando com o tempo e a morte no acontecer de mim mesmo.
O ser da linguagem nos absorve quando nos rendemos a escrita, torna-se extra territoriedade onde a imaginação inventa seus próprios fatos futucando a nervura do real. Escrever é uma estratégia de estranhamento do cotidianamente dado, do ordinário dos signos e símbolos.
Não posso ser naquilo que escrevo ou penso, pois todo meu discurso reinventa velhas leituras na transpessoalidade da existência onde as coisas transfiguradas em linguagem se dobram sobre si mesmas.
Ninguém inventa seus próprios discursos, apenas se perde em um labirinto de significados e enunciados se tornando instancia de significação ao vestir a persona autoral. Mas aquilo que ´é próprio da linguagem sempre nos escapa através dos significados....

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