terça-feira, 1 de abril de 2008

Shakespeare, as Nornas e o Destino


Mesmo não se tratando da leitura de um especialista em cultura popular européia, a tese defendida por Michael Howard em sua obra “ A sabedoria das Runas” em torno da presença da Imagem das Nornas, as antigas deusas do destino da mitologia nórdica, no imaginário ocidental e, mais especificamente, na obra de Shakespeare, é digna de consideração apesar de alguns limites.
Segundo ele:

“Malgrado sua supreção pela Igreja, as Nornas emergiram na cultura popular, revestidas das mais estranhas formas. Aparecem como fadas madrinhas, equipadas com uma roda de tear, que se materializam por ocasião do nascimento dos infantes reais. Nos contos de fadas da “Bela Adormecida” e “ Branca de Neve e os sete anões, as Nornas tornam-se madastras perversas. Os contos de fadas que lemos hoje para nossos filhos encerram símbolos pagãos, que sobreviveram na literatura folclórica muito tempo depois de terem perdido seu significado religiosos.
O exemplo mais notável de ressurgimento das Nornas do inconsciente coletivo como imagens arquetipicas é talvez sua aparição na figura das três bruxas da peça clássica Macbeth. Shakespeare, ou quem quer que tenha escrito as peças a ele atribuídas, era muito versado no ocultismo e nas crenças populares da onglaterra elizabethana. Parece ter tido também um conhecimento considerável do paganismo clássico. Suas bruxas, em Macbeth, não invocam o demônio quando estão agachadas em torno do caldeirão na charneca açoitada pelos ventos, mas sim a deusa grega de três cabeças, Hécate. Numa época em que a imagem corrente das bruxas era a de adoradoras satânicas do demônio, essa interpretação radical delas como seguidoras da Velha Religião pagã deve ter causado alguma surpresa entre os freqüentadores de teatro que afluíam para ver a peça.
Shakespeare chama as três bruxas de Irmãs Weird. A palavra do inglês antigo” weird” deriva do radical “wyrd”. No Oxford English dictionary o termo “weird” está consignado em dois verbetes separados. O primeiro confere-lhe o significado de “fado” ou “destino”. O segundo se refere à sua conexão com o destino, mas atribui-lhe também os sentidos secundários de “sobrenatural”, “misterioso”, “estranho” ou “ incompreensível”. Essa diversidade do segundo significado vincula a palavra à velha crença pagã no poder do Destino. Ao chamar suas bruxas de Irmãs Weird, o dramaturgo elizabethano estava dizendo a quem quer que conhecesse alguma coisa sobre os mitos pré- cristãos que elas eram as Nornas sob forma humana.
Em Macbeth, as três Irmães Weird são dotadas do poder sobrenatural de predizer o futuro. É evidente, considerando suas fórmulas encantatórias e os comentários crípticos que dirigem ao nobre escorces, que eram igualmente capazes de controlar as forças do destino. Isso também estabelece uma conexão entre as bruxas e as Nornas. Não deixa de ser interessante conjeturar que a superstição teatral segundo a qual Macbeth é uma peça aziaga originou-se da antiga crença terivel do Wyrd de afetar a vida dos mortais.”

(Michael Howard. A sabedoria das runas/ tradução: Antonio Danesi. SP: Editora Pensamento, s/d, 173 et seq.)

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