A imagem e realidade arquétipica do indivíduo, muito provavelmente, como sugere JUNG, irrompeu na consciência através do mito do herói cuja presença é indiscriminadamente identificada em inúmeras culturas do mundo arcaico. Ele representa, paradoxalmente, o próprio ser coletivo, “aquilo que é comum a todos” , ou ainda, a coesão primária da espécie ditada por suas raízes na natureza biológica e inconsciente. Por outro lado, em suas aventuras, o herói é também aquele ser transitório que superando inúmeras ameaças, obstáculos, provas e sofrimentos diversos, conquista e afirma sua singularidade frente a objetividade física e psíquica. Mas foram necessários séculos e séculos de história para que o indivíduo singular introjetasse uma pequena parcela da psicologia do herói.
Em SÍMBOLOS DA TRANSFORMAÇÃO JUNG afirma que,
“O homem como indivíduo é um fenômeno suspeito, cujo direito à existência poderia ser combatido sob o ponto de vista biológico, segundo o qual o indivíduo só tem sentido como ser coletivo, como elemento integrante da massa. Mas o espectro cultural lhe confere um significado que o separa da massa e que no decorrer de milênios levou a formação da personalidade, passo a passo com o qual se desenvolveu o culto do herói.”1
Em poucas palavras, a imagem do herói, em suas muitas variantes, parece sugerir no desenvolvimento da consciência diferenciada, uma tendência a afirmação do indivíduo singular como locus de transformação e de devir da experiência humana genérica. Poder-se-ia dizer que o desenvolvimento de qualquer forma de civilização ou cultura pressupõe, em alguma medida, um sacrifício do “homem natural” ou inteiramente submetido a lei da espécie e a segurança da orientação coletiva. Desta forma, o processo civilizatório fomenta tanto um progressivo desenvolvimento da consciência coletiva, quanto uma gradativa auto-consciência da individualidade, referencial simbólico e ontológico onde a diversidade de tudo o que existe toma a forma de uma unidade teleologicamente orientada para uma determinada finalidade. Em outras palavras, em qualquer sociedade, a vida individual, nossa essência singular e concreta, é aquele micro universo ontológico onde os fatos humanos e naturais adquirem realidade, significado e propósito. A atitude psíquica do indivíduo ante as condições externas da existência e do cânon simbólico de uma sociedade é um fator decisivo e crucial para o curso do desenvolvimento cultural.
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