A individualidade é uma totalidade complexa e um devir de imagens e símbolos.
Como observa JOLANDE JACOBI,
“Ao lado de símbolos venerados, que se formaram através de milênios no espírito humano, existem também os que nascem da capacidade formadora de símbolos em cada indivíduo; estes, no entanto, baseiam-se na sua totalidade, em formas arquetípicas fundamentais que, correspondendo à sua força de expressão e riqueza de conteúdo , são aceitos pela humanidade ou por grupos maiores ou menores.” 1
A psicologia da humanidade, como acreditava JUNG, corresponde a psicologia do indivíduo. Logo, seria uma lamentável precipitação querer reduzir a vasta problemática da individualidade humana a consecução identitária do ego ou a fantasia do individualismo abstratamente vislumbrado como pura antítese do coletivo. A individualidade não é um dado estático, mas um processo dinâmico onde o particular e o universal, o inconsciente e a consciência, a cultura e a natureza, dentre outros pares de opostos, se equacionam, incorporando-se mutuamente na definição sempre provisória do confuso e singular arranjo que é cada ser humano.
JOSEPH L. HENDERSON chama atenção para uma característica essencial do mito do herói que nos ajuda a melhor compreender esta intercessão entre o pessoal e o transpessoal, o objetivo e o subjetivo, na delimitação da individualidade :
“... uma outra característica relevante no mito do herói vem fornecer-nos uma chave para a sua compreensão. Em varias destas histórias a fraqueza inicial do herói é contrabalanceada pelo aparecimento de poderosas figuras ‘tutelares’- ou guardiaes- que se permitem realizar as tarefas sobre-humanas que lhe seriam impossíveis de executar sozinho. Entre os heróis gregos, Teseu tinha como protetor Poseidon, deus do mar; Perseu tinha Atenéia; Aquiles tinha como tutor Quiron, o sábio centauro.
Estas personagens divinas são, na verdade, representações simbólicas da psique total, entidade maior e mais ampla que supre o ego da força que lhe falta . Sua função específica lembra que é atribuição essencial do ,mito heróico desenvolver no indivíduo a consciência do ego – o conhecimento de suas próprias e fraquezas- de maneira a deixa-lo preparado para as difíceis tarefas que a vida lhe há de impor. Uma vez passado o teste inicial e entrando o indivíduo na fase de maturidade de sua vida, o mito do herói perde a relevância. A morte simbólica do herói assina-la, por assim dizer, a conquista daquela maturidade.”2
Para o autor, o herói define-se como tal na medida em que se envolve criativamente com a totalidade da psique. Neste sentido, como observa NAURO DE SOUZA VARGAS no breve prefácio elaborado para o terceiro volume da MITOLOGIA GREGA de JUNITO DE SOUZA BRANDÃO, sempre que algo novo e transformador vai se implantando em nossa consciência pessoal e coletiva algum dinamismo heróico é ativado. A imagem do herói cumpre, portanto, uma função intermediária entre o mundo da consciência e o inconsciente. Em outros termos, o herói é aquele que nasce para servir a um dado conteúdo inconsciente que busca integrar-se a consciência.
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