segunda-feira, 29 de setembro de 2008

LIVE AND DEATH


Cotidianamente
Lutamos pela certeza
De cada manhã de vida
Com a simplicidade dos animais.

Survival...
Live and death


Qual destino, afinal,
É mais digno
Que a realização
De mínimos objetivos
E pequenas necessidades?

Percorro rotinas sem grandes
Filosofias
Ou ideais de vida.

Basta-me apenas
A realidade,
Cada dia,
Cada silêncio
E alegria.

Aprendi a ser
Apenas eu mesmo
Entre as brutalidades
Serenas
E severos rigores
Das suaves guerras humanas.


Survival,
Live and death...
The weapons, gentlemen!

FATALIDADE

Talvez nada exista
Além da incerteza
Que me conduz ao vazio,
Ao acontecer sereno
De todas as coisas vivas
Em desafio
A gritar um novo
Que não percebo
Ou se quer existe
Na rotina fria
De todos os dias.

domingo, 28 de setembro de 2008

IMEDIATO IDEAL

Meu ideal imediato
É ser capaz de viver
Do provisório
E instável de cada dia
Sem pensar metas
Futuros
Ou grandes objetivos.

Não quero ser
Mais do que posso
Ou querer de volta
Aquilo que nunca tive.

Meu ideal imediato
É viver abaixo da superfície
Do rosto que me define entre as coisas.

ESPECULAÇÕES POS MODERNAS


Todos os discursos, sistemas de signos, significações conscientes e inconscientes, que definem a metaficção que é o próprio mundo real, já não são tão essenciais a existência individual. Na medida em que a experiência da individualidade e singularidade humana se desloca do referencial coletivo, das abstrações de uma “Humanidade”, afirmando-se como auto-consciência e finitude, os referenciais coletivos ou históricos deslocam-se do centro das vivências culturais abrindo caminho para uma "desfamililidade ontológica" que passa a mediar a experiência sensível do mundo.
Através de uma abertura maior a tudo aquilo que não cabe na palavra, da desconfiança dos poderes dos enunciados, nos tornamos despudoradamente "irracionalistas", egocêntricos e infantilmente vorazes no jogo de nossos desejos e sentimentos de mundo. A Vida tornou-se tão complexa, hostil e incerta, que nos faz duvidar da aplicabilidade do conceito de sociedade e coletivo ao complexo conjunto de redes de sociabilidades em que estamos inseridos e fazem o mundo acontecer em seus protocolos cotidianos.

quarta-feira, 24 de setembro de 2008

PEQUENAS ESPECULAÇÕES CONTRA A FÉ E VERDADE

A vida não possui a regularidade e previsibilidade de um calendário. É um acontecer de mundo sem sentido, aleatória inventabilidade humana a fazer-se no caótico do mundo, um fluxo ininterrupto de diversidades e pluralidades de coisas que se dissolvem no nada de virtuais totalidades. Contra as teleologias e meta-narrativas religiosas ou laicas, escrevo-me na anti verdade do silêncio, do minimo inteligível de minhas construções pessoais de vazios e abstrações cruas na invenção livre de cada dia em matéria e forma.

TEMPO PRESENTE

Sei que é tempo
De fazer algo
Do vento
Que me sopra por dentro
No acontecer dos dias
Em diversas direções de existência.

It is time...

As memórias do mundo
Apavoram rotinas
No fazer-se de horas
Em auroras de segundos
De puro desejo.

It is time...

Futuros arranham
Presentes,
Portas
Inventam novidades e destinos
enquanto janelas abertas de possíveis
Dias seguintes ou imprevisíveis
Revelam paisagens jamais vistas
Em risos de ébrio e ousado pensamento.
.

Talvez nada exista
Além da incerteza
Que me conduz ao vazio,
Do acontecer sereno
De todas as coisas vivas
Em desafio
A gritar um novo
Que não percebo.

terça-feira, 23 de setembro de 2008

O DESAFIO DO VENTO

Um vento adentra curioso
A janela aberta
Buscando a suave música
Que neste instante povoa
O quarto, a alma
E as coisas.
Trata-se de um vento
Antigo e sem nome
Onde tudo
Permanece e passa
Como a imagem de um segredo
Diante da magia de um espelho.

Sou esse vento
Que sinto e vejo
No confortável frio
E ritmo de carne
Na canção que vivo
Em abstrato mundo
E vazio de céu fechado.

CRÔNICA RELÂMPAGO XXXVI

Nada é tão estranhamente misterioso quanto aquilo que conhecemos como passado. Afinal, se só o sabemos através de fragmentos de memória, é porque seu pleno domínio e acontecer nos escapa em presentes. Coisa que acontece até o ponto de torná-lo tão aberto e incerto quanto o futuro no complexo jogo que existe entre a memória, o esquecimento e o relativo desconhecido que define a distância ou ausência do que se foi.
Em certas circunstancias, redescobrir “coisas perdidas” revela-se uma curiosa forma de construir futuros a partir da redefinição De nossas experiências guardadas no fundo do tempo vivido.
Em poucas palavras, o passado esta longe de afigurar-se como uma modalidade morta de tempo no perpetuo se fazer de nós mesmos até nos reduzirmos ao próprio passado e a ausência.

DEVANEIO NOTURNO

Em algum impreciso ponto
De sonho e encanto
Vislumbro mil mundos
Nas dez mil coisas
De um dia aberto
Em diversas realidades.
Nele não imperam verdades
Apenas a sombra
De palavras e fantasias
Que me oferecem
Um sol na noite
Em embriagues de vida
E fome de sonho.

domingo, 21 de setembro de 2008

JUNG E O ULISSES DE JAMES JOYCE


Uma das mais criativas interpretações do significado do Ulisses de James Joyce foi ao meu ver a realizada por Jung em um breve ensaio literário originalmente publicado em Berlim no ano de 1932. Nele o autor de modo realmente instigante explora os significados desta verdadeira obra prima da literatura universal enquanto expressão dos dilemas humanos de sua própria época, dos desafios existenciais dos quais de muitas formas ainda nos são contemporâneos Afasta-se, entretanto, de muitos dos seus outros interpretes ao não rotulá-la como uma obra simbólica frisando assim seu caráter consciente/racional. O que poder-se-ia ser explicado pelo fato de Ulisses definir-se acima de tudo como uma fascinante experiência discursiva onde o falar, o dizer e o pensar se distanciam do cognoscível e dos nossos usos convencionais da linguagem na invenção dos significados... Trata-se da construção de uma nova mitologia, paradoxalmente secular e niilista.

Seja lá como for, para JUNG:

“... O artista é s em querer o porta voz dos segredos espirituais de sua época e, como todo profeta, é de vez em quanto inconsciente como um sonâmbulo. Julga está falando por si, mas é o espírito da época que se manifesta e, o que ele diz, é real em seus efeitos.
Ulisses é um documento humano de nosso tempo, e mais, é um segredo. É bem verdade que ele pode libertar os que estão presos espiritualmente e que sua frieza consegue congelar, até a medula, não só o sentimentalismo, mas o próprio sentimento normal. Mas estes efeitos salutares não esgotam a sua essência. Dizer que foi o próprio diabo quem apadrinhou a obra é uma observação espirituosa interessante, mas não satisfaz. Há vida na obra, e a vida nunca é apenas má e destrutiva. Na verdade, tudo o que de imediato podemos apreender neste livro é negativo e solúvel, mas pode-se pressentir algo intangível, uma intenção secreta que lhe dá sentido e, portanto, valor. Seria este mosaico colorido de palavras e imagens “porventura” simbólico? Por Deus, não estou me referindo a uma alegoria, mas ao símbolo como expressão de uma essência inatingível. Neste caso deveria ao menos bruxulear um sentido oculto em algum lugar nesta tecidura estranha. Aqui e acolá deveriam ressoar sons já ouvidos em outros tempos e em outros lugares, talvez em sonhos raros ou nas obscuras sabedoria de raças esquecidas. Não se pode contestar esta possibilidade. Mas eu, pessoalmente, não consegui encontrar a chave. Pelo contrário, o livro me parece ter sido escrito no estado de mais plena consciência; não é sonho, nem revelação do in consciente. Penso até que mostre um propósito mais forte e uma tendência mais exclusiva do que o Zaratustra de NIETZSCHE ou a segunda parte do Fausto de GOETHE. Talvez por isso Ulisses não possua a característica de obra simbólica. ( ...) Pois “simbólico” significa que uma essência poderosa e inconcebível reside oculta no objeto, seja espírito ou mundo; e que o homem faz desesperados esforços para enquadrar numa expressão o segredo que lhe escapa. Para tanto deve-se dirigir ao objeto com todas as suas forças mentais e penetrar todos os véus reluzentes, a fim de trazer a superfície o outro que jaz oculto nas desconhecidas profundezas.
Mas o que perturba no Ulisses é que, atrás de milhares e milhares de véus, nada existe. Não se dirige ao espírito e nem ao mundo. Frio como a lua, observando de uma distância cósmica, permite que a comédia da criação, da existência e do desaparecimento siga o seu curso. Espero sinceramente que Ulisses não seja simbólico; pois do contrário não terá atingido seu objetivo. Qual o segredo tão ansiosamente guardado e encoberto com cuidado impar durante essas intoleráveis 735 páginas? Melhor não despender energias e tempo com infrutíferas caças ao tesouro. Nada pode haver atrás disso, pois do contrário a nossa consciência estaria novamente comprometida com o espírito e o mundo, perpetuando para sempre os Srs. Daedalus e Bloom e enganados pelas dez mil aparências. É exatamente isso que Ulisses quer evitar: ele quer ser um olhar lunar, uma consciência desligada do objeto; não escravizado por deuses , nem pela luxuria; não preso por amor ou ódio, por convicção ou preconceito. Ulisses não diz isto, mas age assim: o despreendimento da consciência é a meta que começa a se manifestar por trás da cortina nebulosa deste livro. Este é certamente o verdadeiro segredo da nova consciência cósmica que não é revelada aquele que leu conscienciosamente as 735 páginas, mas àquele que durante os 735 dias contemplou o seu mundo e a sua própria mente através dos olhos de Ulisses.”
( C G JUNG. Ulisses um Monologo/ tradução de Maria de Moraes Barros, in Obras Completas de C G Jung Vol. XV. O espírito na arte e na ciência. Petrópolis: Vozes, 1985, p.107-8)