quarta-feira, 27 de outubro de 2021

O FUGITIVO

Adivinho em cada momento um desvio,
em cada afeto uma fuga,
para tudo aquilo que avessa a vida
e me escravisa a banalidade.

Ir além da linguagem,
libertar o corpo da razão  e do humano,
é meu sublime objetivo.

Sou onde não faço sentido,
onde desisto,
e nada mais é possível. 
Penso e não sei
se realmente existo.

domingo, 24 de outubro de 2021

A TOPOGRAFIA DA ESCRITA

Um texto é uma geografia,
um ecossistema.
Habitamos palavras
e através delas penetramos em um território existencial.
O eu do texto é um ente que arruma letras arquitetando moradas e ausências.
Para ele a realidade é pura ficção, Visto que viver é um ato de imaginação criadora. 
Assim, a verdade é qualquer ilusão que nos move como uma necessidade corpórea. É aquilo que nos leva a dançar,  o texto como movimento, percurso, onde o caminhar cria o caminho. Não há texto que não contenha em si uma dimensão não verbal, que conforma uma ação no mundo. O texto é um modo de enxergar, de estar na paisagem e experimentar.

quinta-feira, 21 de outubro de 2021

A ARTE DE PENSAR

O pensar não está na cabeça.
O pensar é corpo, presença,
intensidade e movimento.
Não é  palavra que se sustenta,
é gesto e silêncio. 
É natureza,
e não está no sujeito que acha que pensa
o pensamento que o inventa.
Pensar não cabe nos livros,
mas no verbo livre
que transfigura o mundo
como imagem em movimento
que através de nós
afirma a natureza.

quarta-feira, 20 de outubro de 2021

A INTUIÇÃO DO CAOS

Há algo ausente que nos define a presença,
algo que virtualmente persiste
em tudo que fazemos,
que é dito, pensado, ou sabido.

Este algo insiste em um silêncio  estridente.
Mas é impertinente e ausente.
É uma intuição de vertigem,
um brilho ofuscante e distante.

É um isso, um aquilo.
Algo que nós dissolve,
ou qualquer forma de caos.

O INIMIGO DA VERDADE

Confesso minha nulidade,
minha impaciência,
e má vontade com o mundo.

Adimito minha falta de objetivos,
meu desprezo pelos humanismos,
meu incorrigivel niilismo.

Não tenho vocação para fanatismos.
Recuso toda confissão  de fé,
ou vontade de verdade.

Sou nulo, sou livre,
e sem vaidade.
Não advogo qualquer poder
sobre a realidade.





domingo, 17 de outubro de 2021

MUNDO HUMANO

O mundo humano é um artificio anti natural de sobrevivência,  uma maquina metafísica, orgânica e simbólica, produtora de verdades em movimento,   na circulação alucinada de signos e símbolos e criação de valor, afetos e apetites. Trata-se aqui de algo pior do que qualquer Leviatã.

sábado, 16 de outubro de 2021

SER LIVRE

Liberdade é uma palavra 
desconfortável 
em qualquer frase.
Pois sua realidade é o corpo em ato.
Só é livre aquele que cria,
que confia na imaginação,
e quase não sabe de si,
na invenção do mundo.

Liberdade não se define,
e nos livra de toda definição. 

sexta-feira, 15 de outubro de 2021

O PARADÓXO DO PARTO

Hoje lembram o dia

do parto da minha mãe

como se eu fosse

o feto que alí se apresentou

atônico e abismado

quando  desabrigado e lançado ao mundo.

 

Mas tal trauma não  deixou memória.

Não era eu aquele princípio de gente,

aquele feto indigente.

Mas nele já estava contido este corpo,

objeto de  afetos e experiências.

Corpo que soube gradativamente  de si no acumular dos anos,

além de toda ilusão  de consciência,

E ainda contém aquele feto

que  nunca terminou de nascer,

enquanto o corpo

aprendia a morrer.



 

 

quinta-feira, 14 de outubro de 2021

SOBRE A EXISTÊNCIA

Os anos passam e não  me definem.
Sou o que se perde,
o que desaparece,
o que definha,
em  corpo que reinventa o espaço enterrado na cidade. 

Tenho todas as idades
nos afetos que me transformam,
que me apagam do mundo
na alucinação do momento.



sábado, 9 de outubro de 2021

PRÁTICA DE EXISTÊNCIA

Prática de existência como um inventar-se permanente nas desarrumações do tempo. Individuar contra o próprio rosto, corpar a vida no movimento da memória, esculpindo o tempo presente, contra os imediatismos do agora.
Prática de existência como silêncio e fala, pausa e escrita de si, musicalidade sem notas ou, simplesmente, movimento de quase ser, na inconstância de um devir outro sempre atualizado em suas metamorfoses.
Pratica de existência como borboleta que passeia entre as flores de um jardim,
como verbo/acontecimento.