quinta-feira, 1 de abril de 2021

LINHAS DE FUGA PARA FLORESTA LABIBIRINTO


 

  Todas as tecnologias, dispositivos, táticas, estratégias e instituições de saber poder que moldam a subjetividade moderna em sua dimensão não discursiva, extrapolando o sujeito jurídico, confundindo-se com o cotidiano exercício de si mesmo, como corpo e consciência, expressam que não há um lado de fora das relações de poder ou do ordenamento social. Estamos presos a um campo restrito de possibilidades de experimentar e saber a realidade.

Lembrando Deleuze e Guattari, em Mil Platôs, poderíamos ainda dizer que,

(...) “somos feitos de linhas. Não queremos apenas falar de linhas de escrita; estas se conjugam com outras linhas, linhas de vida, linhas de sorte ou de infortúnio, linhas que criam a variação da própria linha de escrita, linhas que estão entre as linhas escritas.” (1)

Mas há sempre entre as segmentações duras a suavidade de tênues linhas de fuga ( outros modos de vida e experimentação), através das quais os pés fogem da terra no sopro de algum devir, de um viver outro no vislumbre do assignificante de alguma experimentação outra de pele e aparência.

As linhas sempre são outras em suas velocidades, espessuras, enquanto desorganizam o espaço-corpo, enquanto escrevem o mundo dizível e visível.

É preciso, portanto, passear pelo ponto até que se faça a curva, o risco, um riso, nas conversões de uma linha em outra.

É preciso antever o desenho, imaginar, no encadeamento dos signos… des-pensar o pensamento para pensar o impensado.

É assim que a vida acontece, que tudo se mistura em infinitas composições de formas e afeccções no se fazer de um labirinto onde não existe centro ou saída possível, pois nada nunca é idêntico a si mesmo e todo lugar é o meio de tudo.

(1) Deleuze, G. & Guattari, F. (2012). Mil Platôs: capitalismo e esquizofrenia 2, v. 3. São Paulo: Editora 34, p. 72)


TEMPO VERBAL

 

O tempo do quando

é o agora.

É a urgência da sobrevivência,

a invenção clandestina

de um outro dia,

de uma outra chave de existência.

A vida é ação, VERBO,

dizer-movimento,

transformAÇÃO.


terça-feira, 30 de março de 2021

ATEMPORAL

 

Tenho me tornado o indeterminado,

o que não cabe em qualquer canto de mundo

ou que caiu em algum momento

de um passado que nunca aconteceu.


Não sou deste instante.

Sou do tempo das estrelas mortas

que ainda vejo brilhando no céu.


Meu corpo tem a idade dos sonhos

e é composto de imaginações

da matéria.

Meus pensamentos tem o perfume e cores

das flores.

sábado, 27 de março de 2021

A PERDA DO MUNDO

Exploramos o território do vazio,
nossa ausência  de mundo,
desenhando um mapa de angustias,
que se confunde com a sombra
de nossos próprios corpos.

 Aprendemos o tempo dos mortos
através  da geografia do caos primevo 
que ainda nos habita
intempestivo.

Nossos pés  não tem mais alma.
Não encontram chão. 
Escapamos a natureza e a vida
embriagados por tecnologias,
ambições doentias de dominação. 

Agora estamos fora de tudo,
desespacializados e enganados pelo absurdo de uma razão celeste.

Mas se viver se fez nosso lado de fora, 
é  porque buscamos nossa propria ausência,
inventamos em nós
um avesso de natureza,
um vazio de mundo,
um sem futuro dos pés,
através  da utopia do pensar verdade.







terça-feira, 23 de março de 2021

MUDAR O MUNDO

É  certo que escrever não muda o mundo. 

Mas produz acontecimentos que transformam

a vida
 
naquilo que a gente é.
 
Mudar o mundo é  muito pouco
 
quando permanecemos sendo
 
o que ele nos faz ser.
 

segunda-feira, 22 de março de 2021

AMBIÇÕES

 


 

 

Faço planos de desmundar o mundo

e des-ser minha existência

contra a vida cotidiana.


Pois não me basta respirar.

Quero desvivenciar todas as palavras pré ditas,

ser corpo sem tempo através da invenção das coisas.


Faço planos de me tornar água

e pensar como fogo

para me sentir terra e ar.


Faço planos de viver o nada,

no nivelamento da vida e da morte.

Tenho expectativas para minha a-existência.

domingo, 21 de março de 2021

FORA DO EU

Do lado de fora do eu
meu corpo era outro.
um outro animal, inorgânico 
e intenso acontecimento.

Contra o tempo e o mundo
meu sentir era intenso,
impreviso.

O ser em mim era puro movimento
no vivo infinito do instante 
que passa e fica
dentro de tudo
que me faz multiplo
e fugaz.




sexta-feira, 19 de março de 2021

ALMA TERRA

A alma não  é  um atributo dos homens,
mas um modo de ser da materia.
A alma é  o corpo,
a intensidade da experiência. 

A alma é  o mundo como consciência,
é  a natureza que pensa.

No avesso do platonismo
a alma é Terra.



quinta-feira, 18 de março de 2021

PALAVRA ESCRITA

A escrita veste o corpo.
É  uma segunda pele,
um modo  de ser visto,
de acontecer   aos outros, 
como uma presença 
que transcende qualquer distância 
entre a palavra e o ato.

O dizer extrapola o pensamento,
torna-se potência na produção  de um sentido 
que ressignifica o mundo
através  da palavra 



quarta-feira, 17 de março de 2021

DA LETRA AO CORPO

 


Não me acomodo ao raso significado

das palavras arrumadas na brancura da tela.

Não me deixo enganar pela ordem gramatical,

pelas intencionalidades rasas

de consensos argumentativos e formalismos.

Dentro do dito há sempre um abismo

que diz o invisível do corpo negado.

Ele fala, grita, registra-se,

entre as linhas,

contra todo logocentrismo

e tédio de narrativas bem comportadas.

Toda comunicação pragmática

me provoca vertigens.

Cada leitor deveria

Rasgar a si mesmo

no dizer comum do mundo.

Ler no espelho das letras

a nudez de seu próprio corpo.