terça-feira, 14 de janeiro de 2020

TEMPO E REVOLUÇÃO


Depois de maio de 1968
o tempo abandonou a história.

O devir acordou o absurdo
no pesadelo da eternidade
enquanto o instante explodia o século
derrubando a ditadura do  calendário.

Já não há mais antes,
nem depois.
A Historia perdeu a Razão.
Hegel foi decapitado!
Tudo transborda
No eterno retorno do  agora!

segunda-feira, 13 de janeiro de 2020

PALAVRAS AVULSAS




Palavras avulsas decoram o quarto.
Sei o ritmo da escrita fácil,
As velocidades das letras em combinado
E a harmonia do sentido
que suja o espaço em branco.

Tais palavras nunca são  profundas.
Apenas beliscam a consciência 
Tentando provocar um sorriso,
Desdizer a realidade,
No mais que  real 
Da imaginação e do risco
De transmitir o silêncio de ser
simulando melodias.







A POTÊNCIA DE QUASE SER




“Os homens, dizia em essência Kant, não são feitos destas madeiras duras e retilínias, com as quais fazemos mastros. Se as vezes, para alguns, existe ao longo da vida uma espécie de fidelidade a si mesmo, uma coerência, outros conhecem rupturas improváveis. Estes tornam-se irreconhecíveis a si mesmos e aos outros, cabendo-lhes varias vidas diferentes. Mas, em princípio, cada existência, mesmo a mais tranquila, contem um numero infinito de possibilidades que a cada instante reorganiza suas virtualidades.”

David Le Breton in Desaparecer de si: Uma tentação contemporânea

O ego, enquanto complexo psicológico que opera como centro da consciência, esta longe de  ser uma realidade continua, unitária. Constitui, ao contrário, um campo instável, sujeito a permanentes rearranjos e rupturas cujo desenrolar quase não percebemos.

Nunca permanecemos os mesmos.  Há em nós  um virtus (força ou potência) que nos impõe o possível como uma sombra de incerteza e transformação projetada em um porvir sempre renovado. 

O ego segue sempre a frente de sua auto manifestação concreta. É como uma miragem, como um duplo de si mesmo. Nunca se apresenta como identidade fixa. Manifesta-se,  ao contrario, como virtualidade e inacabamento que  nunca  se adéqua ao rosto.

A criança que fui um dia, por exemplo,  não esta contida naquele que sou hoje. Ela simplesmente desapareceu como manifestação circunstancial de um eu no qual nunca me reconheci por inteiro.

O eu, portanto, só existe como possibilidade, só é em si no movimento de tornar-se. Existe, portanto, na indeterminação de um quase ser, no complexo deslocamento de coisas dentro de coisas, através do movimento de corpos dentro de corpos, que não cabem na ilusão da homogeneidade e continuidade de um pensante e sensível eu que faz do mundo espelho da sua auto ilusão .





quarta-feira, 8 de janeiro de 2020

A SOMBRA DO FUTURO



Busco um futuro livre de qualquer passado,
limpo do peso morto das humanidades,
das ilusões da razão na história.

Um futuro que  transborda sempre o presente
através da potência do virtual,
da indeterminação do inatual,
que recusa toda teleologia racional,
todo pragmatismo.

Busco um futuro onde a vida
evite o agora
e se faça sempre presente
através do inatingível,
do inacabamento  de viver na margem
de qualquer miragem de posteridade.


MEU NÃO SER



Meu não ser
é saber terra,
viver animal,
desfeito em natureza
e afeto.

Meu não ser
é devir
contra a história,
eterno retorno,
cosmovisão redentora,
impessoal.

Meu não ser
é um existir natural.

A PALAVRA MOVENTE


Sou escravo desta palavra torta que me liberta de mim mesmo, que nega o mundo e  se escreve no corpo, como afeto, movência, que alimenta imaginações profundas na superfície da consciência que rasga livros. 

Esta palavra que não respeita a gramática de qualquer moral ou verdade, é  expressão radical da vida impossível latente no vento de enunciados aberrantes. Ela é a intimidade de um niilismo que não  reconhece qualquer autoridade e nasce no ventre das agonias mais cotidianas e urgentes como abstrata e existencial paisagem.

terça-feira, 7 de janeiro de 2020

O BÁRBARO



O bárbaro é por definição o estrangeiro,
O outro que recusa o jogo de nossa gramática, do nosso sistema de signos, colocando-se do lado de fora do nosso mundo, da história, e da significação corrente das coisas. 

Ele é o avesso de nossa identidade,  aquele que nega o sentido,  o verdadeiro e o falso.

O bárbaro é  quem nos ignora, quem não  nos reconhece como destino, quem expressa o informe da natureza primordial de uma existência nua.


segunda-feira, 6 de janeiro de 2020

PALAVRAS EM MOVIMENTO



Palavras espalham vertigens,
organizam verdades, certezas,
ilusões e duvidas.
Criam divindades, autoridades,
inventam seus próprios sujeitos.

Algumas palavras invocam respeito,
outras debocham, ensinam,
ou, simplesmente, informam.
A palavra é signo, símbolo e simulacro.

Mais do que qualquer outra coisa,
entretanto,
palavras alimentam o silêncio,
transbordam significados,
moldam nosso comportamento
revelando tudo que existe
como simulacro.

Palavras dizem sempre prisões.

quarta-feira, 1 de janeiro de 2020

NÃO HÁ TEMPO

Não há tempo.
Apenas extensão, 
Corpos em movimento,
Corpos dentro de corpos,
Espaço vivo concreto e abstrato,
Pleno de afetos, vazios
E metamorfoses. 

NÃO 
há  tempo.
Tudo é  movimento,
Encontros.

É sempre o mesmo momento
Transfigurado
Desde o início dos tempos.

Partículas dançam dentro de tudo
Através do mundo.
Só não  escutamos a música
Que nos desfaz no movimento.



sexta-feira, 27 de dezembro de 2019

DESEDUCAÇÃO EXISTENCIAL

Renunciei a mim mesmo para realizar o improvável, para me banhar no absurdo, até  tornar possível todos os meus desvios e transgressões. 
Ousei sondar o desconhecido que me fita do fundo dos  abismos das imaginações aberrantes.
Soube o sabor de paradoxos e dissonâncias. 
Soube intensamente um mundo no qual nunca acreditei,
Onde tudo é  impossível.
Aprendi o nada e a contra razão dos fatos.
Desaprendi tradições e convenções,
Soube o não ser
Através de tudo que existe.