segunda-feira, 27 de fevereiro de 2012

STEPHEN HAWKING E O GRANDE PROJETO: UMA LEITURA INTERDICIPLINAR


Um intelecto que em umcerto momento pudesse conhecer todas as forças que estabelecem a natureza em movimento, e todas as posições de todos os temas que essa natureza compõe, se esse intelecto fosse também tão suficiente para apresentar esses dados em uma análise, que pudesse unir em uma simples fórmula os movimentos dos grandes corpos do universo e o muito pequeno do átomo; para esse tipo de intelecto nada será incerto e o futuro como o passado seria o presente para esses olhos
— Essai philosophique sur les probabilités, introdução. 1814

O GRANDE PROJETO de Stephen Hawking e Leonard Mlodinow é um interessante trabalho de divulgação científica cujo grande tema são as questões últimas da própria condição humana, como por exemplo, “porque existimos”, “O que é o universo, a natureza e a própria realidade como a conhecemos”.
Cabe esclarecer preliminarmente que o “grande projeto” ao qual  os autores se referem é uma imagem legada  pela física teórica do sec. XX : a possibilidade de uma “teoria de tudo”, ou seja,  a hipotética Teoria da Grande Unificação, da reunião  em uma única estrutura teórica da teoria da relatividade e da mecânica quântica ou, em termos bem simples, da  “macro” e da “micro física” como proposto na epígrafe desta resenha.
 Desviando-me, entretanto, da imagem central do livro, principalmente por ser um leigo no assunto, julgo pertinente chamar atenção para algumas peculiaridades de sua narrativa e implicações multidisciplinares.
Pertinente neste sentido observar que na obra em referência as grandes formulações do saber científico confundem-se com os grandes temas da tradição filosófica ocidental em um tempo em que, segundo seus autores, a filosofia está morta, pois “ não acompanhou os desenvolvimentos modernos da ciência, em particular da física. Os cientistas passaram a portar a tocha da descoberta em nossa busca do conhecimento.”
Justamente por isso, seu principal fundamento teórico  e, vale sublinhar, seu ponto forte, é o conceito de “determinismo cientifico” paulatinamente formulado pela ciência moderna através da revolução cientifica dos secs. XVI-XVIII que, desconstruindo a tradição aristotélica e escolástica, deriva as leis naturais da observação criteriosa da natureza e não de premissas logicas inspiradas por uma “racionalidade abstrata”. Tal paradigma cientifico conduziu no século XX a uma radical ruptura epistemológica ao, através da teoria da relatividade e, principalmente, da teoria quântica, por em xeque a premissa elementar da objetividade do real, estabelecendo a possibilidade de diversos “quadros de realidade”, formulação que conduz os autores a conclusão de que “Não há  conceito da realidade independente de um quadro  ou de uma teoria”.
As implicações desta formulação que sustenta a narrativa para o amplo cenário da ciência e do conhecimento contemporâneo encontram-se resumidas na seguinte passagem :

“Na época em que primeiro se propôs o determinismo científico, as únicas leis conhecidas eram as leis newtonianas do movimento e da gravitação. Descreveremos como essas leis foram entendidas por Einstein em sua teoria da gravidade geral, e como outras leis foram descobertas, governando outros aspectos do universo.
As leis naturais nos dizem como o universo se comporta, mas elas não respondem às questões colocadas no inicio deste livro:
Por que há algo em vez de nada?
Por que existimos?
Por que este conjunto particular de leis e não outro?
Alguns poderiam assegurar que a resposta a estas questões é que há um Deus que escolheu criar o universo desse modo. É razoável se perguntar quem ou o que criou o universo, mas se a resposta é Deus, então a questão é apenas deslocada para quem ou o que criou Deus. Segundo esse ponto de vista, concebe-se a existência de alguma entidade que não necessita de criador, e essa entidade é chamada de Deus. Esse é o conhecido argumento da primeira causa em favor da existência de Deus. Sustentamos, contudo, que é possível responder a essas questões inteiramente dentro do reino da ciência, sem apelar para quaisquer seres divinos.
De acordo com o realismo dependente do modelo, introduzido no capitulo 3, nossos cérebros interpretam as informações vindas de nossos órgãos sensoriais construindo  um modelo do mundo exterior. Formamos conceitos mentais de nossa casa, das arvores, de outras pessoas, da eletricidade que sai das tomadas, dos átomos, das moléculas e de outros universos. Esses conceitos mentais constituem a única realidade que conhecemos. Não há teste da realidade independente do modelo. Daí decorre que um modelo bem construído cria sua própria realidade.” ( p. 126)

Os autores definem aqui uma “resposta cientifica” a certas questões filosóficas despindo-as de suas roupagens “metafisicas” e conduzindo a narrativa cientifica a um patamar que transcende seu próprio campo em um esforço interdisciplinar no mínimo muito interessante. Creio que essa é a maior contribuição da obra aqui comentada enquanto  esforço de divulgação de descobertas cientificas consagrada a um público mais amplo do que dos especialistas. Seu questionamento radical da teologia, que gerou certa polêmica por ocasião do lançamento do livro, parece-me exagerada. Afinal, o que há de estranho em uma formulação cientifica excluir qualquer “dialogo” com fundamentos teológicos?

quinta-feira, 23 de fevereiro de 2012

NOVIDADE

INTEIRAMENTE OUTRO



NA MESMICE DE MIM MESMO


PROCURO O DIA


NÃO DITO NO CALENDÁRIO,


PROCURO O CALOR


DE UM CIGARRO


E A BRISA FRESCA


DA MADRUGADA ABERTA


E SEM SIGNIFICADOS


QUE ACONTECE LÁ FORA.

NEWS

Há tantas coisas agora



Acontecendo em silêncio,


Escapando a qualquer registro


Ou palavra


No lado escuro do tempo,


Que me perco dos fatos


No abismo de um momento


Que me desfaz sem motivos


Na liberdade do vento.

segunda-feira, 20 de fevereiro de 2012

NOTA SOBRE A FALÊNCIA DOS SIGNIFICADOS

Quanto mais nos damos conta da ilusão dos significados, melhor percebemos sua condição de codificações, de referencias arbitrarias e funcionais, ou simples coordenadas arbitrarias da consciência, sem as quais a realidade não seria possível ou concebível...
Apenas a Verdade deixou de ser uma questão relevante... 

SOBRE O POR VIR

O por vir de cada dia seguinte
Não se escreve no tempo
Mas nos atos,
Nas tarefas inadiáveis
Que nos impõem a existência.

O porvir é essencialmente
Labor,
A respiração das coisas
Escritas em pensamento e teleologia.

UM HOMEM E SEU GUARDA CHUVA

Sei que sou menos que nada em um universo em permanente expansão e em grande parte desconhecido... justamente por isso me busco profundamente em tudo aquilo que me acontece no provisório de cada instante.
Sou apenas um homem de guarda chuva dentro d’agua em fluido pensamento...

O PASSADO E O AGORA

Jogue fora a escada
Depois de subir
Por ela.

Pois nunca é possível
Voltar atrás,
Escapar ao passado
Como um abstrato abismo
Que nunca para de crescer...

sábado, 18 de fevereiro de 2012

AFORISMAS SOBRE VOCÊ E SEU CÉREBRO

Tudo aquilo que você faz na vida resume-se na simples questão de como você “ajuda” seu cérebro a funcionar. Pois tudo que somos é um cérebro em complexo funcionamento.
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Sopro de vida, alma, outras vidas são conceituações vazias da realidade concreta criadas  para negar o obvio de nossa finitude.
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Nunca conheci um crente que aceitasse agora e imediatamente abrir mão da vida e ir para sua fantasia de céu...
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Sou feliz por  não ter um cérebro do tamanho do que tem minha gata. Mas sei que a realidade que ela percebe e define sua existência, não é melhor ou pior do que a minha.

quarta-feira, 15 de fevereiro de 2012

DESCONTRUINDO A REALIDADE

A exteriorização é o que define melhor o fenômeno da consciência. Isso faz dela um algo que nos possui e não propriamente um atributo de nossa subjetividade ou algo que possuímos.

Mas considera-la, assim, como este algo projetado nas coisas, implica em um deslocamento do “eu” do centro de nossa experiência, pois ele mesmo acaba por ser reduzido também a condição de uma projeção da consciência que, por definição, é sempre consciência de algo externo a ela própria, algo que paradoxalmente torna-se “real” através dela, o que significa que somos em todos os sentidos “consciência”, sendo impossível inferir a existência de uma objetividade das coisas, uma realidade objetiva fora dela.

A diferença entre o aqui proposto e o solipsismo de Max Stiner é que a abstração de um eu pensante ou consciente de si mesmo no aqui e agora do tempo presente também é questionada. Há de se duvidar da ilusória e frágil unidade e organicidade deste eu, principalmente quando percebemos o quanto o comportamento humano está mais condicionado a reações instintivas e impulsivas do que a orientação racional de um eu consciente. Isso sem dizer que o que entendemos ou percebemos como eu é na verdade uma abstração de sermos um corpo cuja materialidade e dinâmica também controlamos bem menos do que gostaríamos.

Esta objetivação da consciência as custas de um esvaziamento da subjetividade não conduz a um ceticismo absoluto e imobilizador. Apenas nos inspira prudência diante de qualquer convicção “forte” de realidade e identidade.

Na pior das hipóteses ela pode apenas alimentar uma postura hedonista diante da existência que, particularmente, considero bastante saudável.

O fato é que podemos viver sem precisar pensar um mundo de “realidade/verdade” onde a substancialidade das coisas condiciona nossas codificações Do real através de débeis convicções ontológicas.

Constatado o paradoxo de que o sentido das coisas é que elas não fazem sentido nenhum , nada nos impede de continuar “imaginando” a realidade, inventando significados e sofrendo nossos eus como se de tão “irreais” eles realmente existissem...














VAZIO

Tenho vivido o vazio



De tudo aquilo


Que entre nós


Nunca aconteceu,


Sofrido os desvios do destino


E descaminhos da sorte


Até o limite de surpreender


Nosso passado triste


As margens de um por do sol.