domingo, 12 de junho de 2011

LINGUAGEM E REALIDADE



“A linguagem corrente é parte do organismo humano, e não menos complicado que ele.”
Ludwig Wittgenstein in Tractatus Logico-Philosophicus

A figuração da realidade em linguagem é sua própria definição como uma presença na consciência, como um fato que em si mesmo já é um significado e uma premissa do entendimento.
Isso significa que nossa percepção de uma exterioridade objetiva não é em si a realidade. Mas apenas  um dado irracional dos sentidos em si mesmo ilegível...

A ESTRADA ( FREE WAY) COMO METÁFORA



Conduzir um carro por uma estrada erma é talvez a mais perfeita metáfora  para o acontecer humano. Pois pressupõe o movimento como devir teleológico na superposição de paisagens selvagens objetivamente dadas; paisagens estas que representam o mundo, enquanto a estrada nossa própria individualidade rasgada nele como um artifício contra natural cuja premissa é avançar de um ponto ao outro do tempo sem uma clara percepção de onde se esta... em suas nuanças, bifurcações e atalhos, a estrada é a soma de tudo aquilo que vivemos no movimento do carro que é figuração da consciência...

A MATERIALIDADE DO PENSAMENTO


A vida se faz
Em palavras
Tão abstratas,
Vagas e sinuosas
Quanto às imaginações.
Os pensamentos
 Ao contrário
Não passam de mera
Atividade física e cerebral...


sábado, 11 de junho de 2011

GRAMÁTICA DE UMA MANHÃ CHUVOSA



Entre as desengonçadas palavras
Que decoram a manhã de chuva
Escondem-se às vezes
Pequenas razões de mundo,
Frases inúteis de sentimentos quebrados
Que inutilmente buscam abrigo
Em qualquer pensamento,
Em qualquer grito mudo
De maltrapilhas e cruas palavras
Que meramente desenham
E celebram o nada...

segunda-feira, 6 de junho de 2011

MORNA MEMÓRIA URBANA


Neste familiar espaço



Não mais encontro


Aquela cidade que nos conheceu


Enquanto nos perdíamos


Em seus vivos labirintos de embriaguês.






Já não vejo vestígios de nossos passos


Naquelas estreitas ruas


Que nos eram tão intimas


Nos vívidos dias em que


Brindávamos a esperança.






Percebo, então,


Que as coisas sofrem o passar do tempo


Tanto quanto as pessoas;


Apenas não o lamentam


Ou se escondem


No frágil abrigo de etéreas memórias


Como as que agora


Nos levam a acontecer


No eco de quem


Um dia fomos...

O SUBTERRANEO DO DIA


Enterrado nas horas



E rotinas


adivinho um céu


rasgado em vontades


reciclando o sentimento


dos fatos,


reinventando as vazias certezas de mundo,


no mais destilado desejo


de explorar os subterrâneos


desta manhã de outono


mergulhando mudo


nas sombras das coisas


abandonadas ao sol.

domingo, 5 de junho de 2011

MEMÓRIAS DE JOHN LENNON by YOKO ANO



Originalmente publicado em 2005 nos USA, a coletânea MEMÓRIAS DE JOHN LENNON, editada por Yoko Ono e reunindo testemunhos diversos de pessoas que conheceram o ex beatle, como Pete Townshend, Elton John, Jean Baez, Jello Biafra, Mick Jagger e Carlos Santana, apenas  para citar alguns nomes do universo do rock, pode ser considerada mais do que uma mera compilação de pequenos ensaios biográficos ou simples homenagem póstuma.
Nas páginas desta cândida brochura é a contemporaneidade do legado de Lennon que se esboça em múltiplas vozes, desenhando sua imagem como um mito do nosso tempo, como a personificação do “grande indivíduo”, ou herói mitológico que nos inspira a ação e a individuação. Lennon personifica um arquetípico constelado na cultura ocidental, o eterno rebelde em sua melhor definição, ou, simplesmente, nossa incapacidade enquanto singularidade para adaptar-se as situações coletivamente estabelecidas no plano privado e social.
Dentre as várias narrativas reunidas uma das que mais me fez pensar foi a de Townshend, do the Who, em sua “cela de compor”. Reproduzo-a aqui em fragmento:

“... Mais tarde eu vi Yoko, a quem eu conhecia por sua ligação com o meu mentor na escola de artes, Gustav Mentger, que, com Malcom Cecil- tinha me inspirado a usar a destruição como parte do meu manifesto artístico no palco. Ela estava realizando “happenings” nem vários locais do entorno de Londres em 1967. Ela era chocante, desafiadora, inspiradora e aparentemente insana. Foi uma das primeiras terroristas da arte, combinando uma profunda moralidade com o confrontamento e o impacto. Ela também era envolvente e profundamente erótica.
Não me surpreendeu que ela e John descobrissem um ao outro. Ela e eu não nos encontramos cara a cara até 1993, ou por ai, quando Bob Dylan foi homenageado pela CBS em uma cerimônia em Nova York. Ela estava com o filho, Sean, que agora é meu amigo. Lembro que fiquei impressionado de ver como Yoko parecia ainda tão jovem e como tinha se tornado particularmente bonita.
O papel social e artístico de John foi acentuado pela parceria que acabou tendo com Yoko. Acho muito difícil imagina-lo sem uma mulher independente, poderosa e eficiente em sua vida.
Yoko nunca desviou John de sua atividade principal. Ele esteve entre os principais de nós a perceber que, em 1967, as composições pop, para serem especiais, exigiriam mais do que a habilidade de entreter e fazer refletir: as musicas  tinham que mudar o mundo e aguçar nossas percepções sobre ele, sua maravilha e suas falhas. Nada de novo, talvez para Bob Dylan, escorado como discípulo de Pete Seeger, mas para jonh e seus colegas, como eu, aquilo era uma coisa para a qual não tínhamos sido preparados nem treinados. A musica era “pós-guerra”, para dançar e como ajuda para esquecer. Nós dois tínhamos freqüentado a escola de artes é claro, e tenho certeza de que isso ajudou. Um dos professores de arte de John foi Donald Pass, o pintor visionário de anjos e da “colheita de almas”, algo que Donald afirma ter testemunhado. Essa inspiração e ambição ( de recriar uma revelação divina) deve ter inspirado o jovem John quase tanto a  noção de vestuário de alguns de seus amigos de  Hamburgo- a roupa supercool da Rive Gauche, influenciada pelo Elvis.
Ao ouvir “Strawberry Fields” pela primeira vez, e depois “ A Day in the Life” de Sgt. Pepper e “I Am Walrus” de Magical Mistery Tour, eu soube que John era também um gênio tocado pela mesma revelação. Ele tinha encontrado um caminho para se comunicar comigo em charadas, abstrações e vinhetas divinas bde impressionismo musical. Foi quando ele começou a trabalhar com Yoko que sua composição se tornou mais específica, inclinando-se menos para o alucinógeno poético de Alice no Pais das Maravilhas e mais para consciência social de  Woody Guthrtie. No caso de John, a reconciliação desses dois mundos gerou uma das mais incríveis musicas pop já compostas.”

Yoko Ono. Memórias de John Lennon/ editado e apresentado por Yoko Ono; tradução de Peine e Dalroney  Nóbrega. SP: Spiringer Publicações 2010, pg. 250-251