terça-feira, 18 de janeiro de 2011

SONHOS E ILUSÕES



Quando um sonho
Beija a realidade
Torna-se algo além
De um sonho,
Transforma-se
Em qualquer coisa
Que vivemos como verdade
Iludindo desejos
Que agora perdidos
Gritam em algum princípio
O desespero de ingenuidades...

O DESTINO COMO SILÊNCIO

Sei que o destino não existe.



Pois tudo é aleatório


No se fazer dos dias,






Não há qualquer sentido


A tirar das coisas,


Nenhuma filosofia...






Nada sustenta


Meu desejo de propósitos


E finalidades


Para justificar a existência,






Nada me prende


A qualquer premissa


Ou certeza...



segunda-feira, 17 de janeiro de 2011

NOTA SOBRE O IRRACIONAL DA EXISTÊNCIA



“...Eu  e meu destino, porém, não falamos ao ‘hoje’ e tampouco ao ‘nunca’. Temos paciência para falar ao tempo, muito tempo, para isso. Porque ele há de chegar um dia e não de passagem.”
                                                                                   F Nietzsche in Assim Falava Zaratustra

O acaso se manifesta com absurda  astúcia, como aleatório encadeamento louco de fatos e sensações que nos despertam teleologias, leituras provisórias  do real em  discreto acontecer de  caoticidades borradas nas  cores das imaginações mais profundas que configuram a existência...  

TEDIO


Como posso ainda



Imprimir nos dias


Qualquer arbitrário significado


Quando tudo me parece opaco?






Que palavras sustentam


Meus pensamentos


Quando tudo que tenho


É preguiça e sono?






Rasgaria agora


Todos os relógios


E calendários


Se pudesse


Apenas para me cobrir de noite


Inerte entre meus silêncios...

NOSTALGIA


Queria poder ter agora



O acalanto


De meus incompletos momentos


De fútil alegria...


Retomá-los como um sonho bom


A desbotar a realidade


Desabotoando ansiedades


Até deixar no tempo


Qualquer gosto bom de existência


Que compense o constante


perder-se


De todas as coisas ...

domingo, 16 de janeiro de 2011

ESPERANÇAS



Viver a vida
Pura e simplesmente
Como quem corre no
Sentido da corrente d’agua
Do acontecer de um rio...

Assim tenho buscado
Meus dias e destinos
No  gratuito ato                     
De estar
Em uma nova paisagem de dia a dia
esperando qualquer amanhã de gratuito riso...

sexta-feira, 14 de janeiro de 2011

ENTRE LEMBRANÇAS E ESQUECIMENTOS


O passar do tempo me ensinou a organizar a vida em lembranças...

Sei hoje que tudo que sou são minhas memórias, o caótico amontoado de fatos, pessoas, sensações e sentimentos que me povoam; todas as perdas acumuladas de mim mesmo no constante movimento de me fazer nos dias.

Em cada ato e sentimento vivido percebo-me nômade e provisório desaprendendo o valor ilusório das situações vividas ...

Tudo que agora me importa é a arte de me esquecer em descartáveis vislumbres de futuro...





EVASÃO

Apertado entre um momento e outro do dia, procuro respirar meu próprio nome, saber de mim mesmo no além dos fatos e coisas que me povoam e dissolvem entre os outros...



Procuro-me nos pequenos prazeres de fim de dia, nos inúteis pensamentos escritos no nada consta dos jornais...


Procuro-me nos silêncios caídos pelas ruas imundas, até o limite ...


Ciente de que não estou em parte alguma, que minha busca é uma ingênua estratégia para me perder, não saber de tudo... quando nada mais me importa.



The Who - Tommy Can You Hear Me?

quinta-feira, 13 de janeiro de 2011

MERLIN: O FILHO DO DIABO by Maria Nazareth A. de Barros

A obra “Merlin: O filho do Diabo” de Maria Nazareth Alvim de Barros, é mais do que uma arbitrária compilação contemporânea de antigas narrativas medievais que a partir do sec. XI e XII, inspiradas na chamada “matéria da bretânha” , gradativamente construíram o ciclo arthuriano.

Em linhas gerais, este belo texto contemporâneo procura antes de tudo, diferentemente de suas fontes medievais, que dado o contexto histórico, reproduzem uma tensão estrutural entre a intencionalidade de “espiritualização”/ “cristianização” dos códigos cavaleirescos de alguns de seus autores, como Robert de Boron, que vinculou de forma definitiva Merlin ao graal e a mitifica figura do rei Arthur, e sua contra partida através da vinculação de tal gênero literário ao universo fantástico de suas origens célticas e à tradição trovalesca e a problemática do amor cortes, que na pena de Christian de Troyes,se materializaria na introdução da personagem de Lancelot do Lago.

Maria Nazareth , bebendo em ambas as fontes, procura a partir da justaposição de vários elementos e diversas versões da lenda, procura criar um todo coerente, onde as tensões estabelecidas sob os textos no passado pelo esforço de cristianização da “matéria da Bretânha” são suprimidas em favor de uma leitura inspirada no feérico de sua matriz céltica diluído na matriz cultural de nosso imaginário contemporâneo.

Não por acaso, a personagem de Merlin lhe serve mais do que qualquer outro como protagonista da narrativa, dado que, se nas versões cristianizadas, enquanto filho de um diabo ( incubus) e uma virgem pura, ele surge como mentor da távola redonda, estando seu destino profundamente associado ao do graal, que também desaparece deste mundo. Por outro lado, Merlim também personifica de modo muito particular o ideário cortes pois, mesmo sem ser propriamente um cavaleiro ou um nobre, ele abre mão de tudo para entregar-se completamente aos braços de sua dama, Viviane, tornando-se seu prisioneiro em um castelo do ar. Em poucas palavras, Merlim é a personagem que articula os diversos projetos narrativos de construção do ciclo arturiano.

Na versão de Maria Nazareth, Merlin expressa de modo realmente comovente, quando de seu aprisionamento por Vivianne, a imagem de mundo que subterraneamente perpassa toda narrativa como sopro de sua própria atemporalidade e tragicidade latente:

“Nada é Tudo. Tudo é nada! Você já viu neste mundo alguma coisa ter sentido? Ser jamais ou para sempre?”

Por derradeiro cabe observar “o encantamento” do passado que a narrativa propõe logo de inicio aos seus leitores:

“Há muito o sol se havia posto. Da janela do meu quarto, eu contemplava o céu, enebriava-me com o desenho irregular das estrelas que pintavam de prata o firmamento anoitecido. A lua, em todo seu esplendor, caminhava silenciosa, imperceptível a olhos em brutecidos, narcotizados pela rotina da vida, quando um manto translúcido, embora negro como o breu, apagou por instantes seus reflexos. Uma fria rajada de vento envolveu o mundo visto da minha janela, sacudiu a folhagem das árvores que empinavam envaidecidas seus troncos e galhos, quebrou as mais orgulhosas. Mergulhou tudo em trevas e sortilégios. A tempestade surgiu do nada, aguou e encharcou a terra. Emanando do silencio e da total escuridão, ouviu-se o uivo dos lobos, seus movimentos excitados, nervosos. Depois, vieram as vozes. Murmurantes, soturnas, confundidas ao vento e à chuva. Logo, porém, tornaram-se poderosas, ensurdecendo a terra com gritos, risos de escárnio, blasfêmias, lamentos e choros.

Paralisado pelo terror, enrijecido pelo deslumbramento, a tudo assisti e ouvi. Depois, o silencio envelopou o céu e a terra, a névoa se desfez, as estrelas voltaram a brilhar, a reforçar o luziluzir lunar. E não fosse o cheiro da terra molhada que penetrava em meu quarto e em minhas narinas, poderia jurar que havia sonhado.

Um cansaço incomum retirou-me da janela, recostou-me no leito. Prostrado, apesar de lúcido, compreendi, imediatamente, que aquelas vozes não eram deste mundo e que os deuses, adormecidos por entre as dobras da terra, tentavam romper amarras, expulsar intrusos, entronizar seus reis, reunificar a ilha da Bretanha e fixar no grande livro do mundo sua história.”

Maria Nazareth A. de Barros. Merlin : O filho do diabo. SP: Editora Planeta do Brasil, 2005, p.6)