quinta-feira, 17 de setembro de 2009

SOBRE O INDETERMINADO DO TEMPO PRESENTE


O tempo presente é, em indeterminados sentidos e sentimentos, algo que não cabe em qualquer conceito possível, um aprendizado da indeterminação do real. Talvez, o melhor modo de dizê-lo é a afirmação de que, em relação a ele, não cabem definições, apenas descrições do imediato e instantâneo ato de viver em palavras e imagens em dialéticas confusões...

O contemporâneo pressupõe uma identidade tão profunda entre pensamento e vida que a esvazia de todo sentido abstrato ou metafísico...

quarta-feira, 16 de setembro de 2009

KISS


Olho nos olhos

Da noite
Procurando no escuro
O brilho de um rosto
Que se perdeu em meu disperso olhar.

Talvez eu nunca o reencontre.
Talvez ele nem tenha de fato
Existido...
Mas guardo nítido seu gosto
E a vontade de me fazer parte
De sua paisagem
Através do mundo contido
Na aventura de um beijo....

UM FRAGMENTO DE LUDWIG WITGENSTEIN...

“ A arbitrariedade das expressões lingüísticas.Seria possível dizer: uma criança tem naturalmente de aprender a falar uma língua particular mas não tem de aprender a pensar, isto é, ela pensaria espontaneamente, mesmo sem aprender nenhuma língua?
Mas, a meu ver, se ela pensar, então ela forma para si figurações e, em certo sentido, estas são arbitrárias, isto é, na medida em que outras figurações poderiam ter desempenhado o mesmo papel. Por outro lado, a linguagem sem duvida surgiu naturalmente, ou seja, é de presumir que tenha havido um primeiro homem que, pela primeira vez, exprimiu em pensamento definido em palavras faladas. E, além disso, toda essa questão tem caráter arbitrário, porque uma criança, ao aprender uma língua, só a aprende ao começar a pensar por meio dessa língua. Começa repentinamente; quero dizer: não há nenhuma etapa preliminar na qual uma criança já usa uma língua, usa-a, por assim dizer, para a comunicação, mas ainda não pensa por meio dela.
O processo de pensamento do homem comum trabalha certamente com uma m,istura de símbolos, dos quais os símbolos propriamente lingüísticos constituem talvez apenas uma pequena parte.”
( Ludwig Witgenstein. Observações Filosóficas. Selecionadas entre seus escritos póstumos por: Rush Rhees. Tradução: Adail Sobral e Maria Stela Gonçalves. SP: Edições Loyola, 2005, p.39 )

segunda-feira, 14 de setembro de 2009

SOBRE A FILOSOFIA DE WITGENSTEIN II


A filosofia do segundo Wittgenstein pressupõe uma definição “complexa”... Segundo o próprio autor ela personifica a luta contra o enfeitiçamento de nosso entendimento pelos meios de nossa linguagem. Não possui, assim, uma função positiva, ou seja, a elaboração de uma concepção própria da existência ou do universo. Também não aspira a uma teoria da lógica ou da linguagem.
A filosofia, tão somente, coloca as coisas tal como são, não explica ou conclui nada. Assim, desempenha tão somente uma função terapêutica, ou seja, a de livrar os filósofos de seus problemas mediante a tomada de consciência dos seus preconceitos gramaticais.
Trata-se aqui, ao mesmo tempo, de uma retomada da filosofia critica de inspiração kantiana e de uma ruptura com o que convencionalmente se entendeu ao longo de toda tradição filosófica ocidental por filosofia...
Através da percepção de “ jogos de linguagem” Witgenstein tornou possível uma superação do método filosófico clássico assentado em definições, hipóteses, teorias e provas.
De certa maneira, sua filosofia é um sintoma da exaustão da tradição filosófica que se identifica, direta ou indiretamente com a tradição da modernidade e suas meta narrativas. A filosofia proposta pelo segundo Wittgenstein mais se aproxima da expressão artística e da experiência imediata da biográfica e socialmente vivida do que da racionalidade moderna configurada pelo modelo cognitivo das ciências naturais...













SOBRE A FILOSOFIA DE WITIGENSTEIN I


O pensamento de Wittgenstein constitui um dos mais representativos exemplos da nova concepção de filosofia emergente a partir da primeira metade do século XX inspirada pelo pragmatismo.
O desenvolvimento de suas reflexões compreendem duas fases distintas: a primeira representada pelo seu Tractatus Lógico- Philosophicus, originalmente publicado em 1921, e a segunda representada por suas Philosophical Investigations, publicada postumamente em 1953.
Em ambas as fases a preocupação central do autor é a compreensão das estruturas e limites do pensamento através da critica filosófica da linguagem. Mas enquanto o Tractatus nos oferece numa filosofia sistemática da linguagem fundada na análise logica do discurso factual, as Investigações, ao contrário, abandonam a posição segundo a qual a filosofia é uma investigação de um sistema objetivo, passando a compreende-la como uma luta contra a fascinação que certas formas de expressão exercem sobre nós. Assim, as palavras só tem significações na corrente diária do pensamento e da vida através das práticas dos jogos de linguagem.
Nas Investigações, portanto,Wittgenstein ocupa-se dos fundamentos do conhecimento factual de um ponto de vista epistemológico/ ontológico em detrimento do ponto de vista lógico/formal adotado no Tractatus.
Através dos jogos de linguagem o significado torna-se indeterminado, transcende a simples análise da expressão lingüística, diluindo-se nos múltiplos contextos de uso da prática concreta e social da linguagem, suas regras de uso cotidiano.


HUMAN CONDITION





Existimos
No pensar das palavras,
Submersos na diversidade
De imagens que traduzem
Em significados
O ilegível do mundo.
Buscamos atônicos
Migalhas de verdade,
Qualquer mínima certeza,
Ou inequívoco sentimento
De nos mesmos
Na fluida experiência
De todas as coisas
Em atos e pensamentos...
Mas nada
É suficientemente real...



domingo, 13 de setembro de 2009

SHAKESPEARE BY F.E. HALLIDAY


A bibliografia sobre Shakespeare é praticamente infinita, sendo impossível a um não especialista construir um satisfatório panorama dos temas e questões que envolvem o estudo de sua obra e biografia.
Aqueles que como eu fascinam-se com seu teatro e buscam mergulhar em seu universo como humildes diletantes, podem contar apenas com a sorte de esbarrar em algum titulo confiável que lhe sirva de guia em tão difícil empreitada.
Pessoalmente acredito que o volume da coleção “Vidas Literárias” sobre o velho bardo, de autoria de F. E. Halliday, é uma das mais competentes introduções ao complexo universo shakespereareano.
A principal característica deste ensaio biográfico é a sobriedade e rigor da narrativa que equilibra com maestria a experiência do mito, da obra e do homem nos oferecendo um convincente retrato do biografado. Neste sentido, certa passagem do aqui comentado ensaio me é particularmente significativa:
“Embora Shakespeare seja tão fugidio, porque tão multiforme, sempre mudando de um personagem para outro, seu espírito permeia as peças, e nós a lemos não só por sua poesia ou pelos personagens que nelas encontramos, mas pelo homem que ele foi. É isso, mais do que qualquer outra coisa, que as torna tão consoladoras. Nós as lemos por sua amável sabedoria, sua avassaladora e meridiana iluminação da vida, sua alegria e seu espírito, sua sanidade essencial: porque ele era o homem idealmente normal, cujas abrangentes faculdades estavam sempre perfeitamente afinadas e sintonizadas. Lemos Shakespeare porque ele é o homem que todos nós gostaríamos de ter como amigo.”
( F.E. Halliday. Shakespeare/tradução de Bárbara Heliodora. RJ: Jorge Zahar Editor, 1990, p. 120 )

THE BACK TO THE FUTURE

Sou compelido a voltar,

Retornar as origens
Em buscas de significações
Perdidas
Que de algum modo
Conduzam meu eu
Á profundeza
De algum distante futuro...
Sou compelido a buscar
Entre meus tantos passados
Um traço de perspectiva
E destino
Em labirinto
Que me guarde ou aguarde
Além de mim mesmo
Em escuro canto e encanto
De mera existência...

sábado, 12 de setembro de 2009

ENCONTRO


Toda pessoa humana

Define-se
Por sua exterioridade,
Pelo não lugar de sua essência
Na permanente desconstrução
Da existência
Em sensações coletivas.

As ilusões do outro
Nos vestem de profundidade
Enquanto extrapolamos
Os limites do rosto
Nas auto representações
De nós mesmos
Vomitadas em um beijo...



segunda-feira, 7 de setembro de 2009

BEATLES E POS MODERNIDADE: O EFEITO NOWHERE MAN

A crise de representação que configura a cultura contemporânea afeta especialmente o pensamento critico, esta tendência filosófica que busca a partir do modelo das ciências naturais a construção de conceitos e definições cada vez mais “precisas”, um esforço reflexivo em permanente auto superação analítica de si mesmo inspirada no mito de um “saber absoluto” a ser alcançado.
Tal metafísico objetivo, que conduziu muitos filósofos e pensadores a balburdia e confusão de indagações, definições e explicações infinitas sobre “O que é o mundo, as coisas e o pensamento”, definitivamente exauriu-se...
Já não há nenhum objeto que seja legível ao conhecimento... apenas a performance lingüística como estratégia de livre representação de um real que absolutamente nos escapa e sobre o qual não temos nada a dizer.
No tempo presente pensar identifica-se com a desconstrução do próprio pensamento... ou com a arte ou o jogo de codificar a própria imaginação...
Um dos ensaios mais interessantes da coletânea The Beatles and Philosophy BY Michael Baur and Steven Baur, é o de James Crooks “ PEGUE UMA CANÇÃO TRISTE E FAÇA-A MELHORAR: OS BEATLES E O PENSAMENTO PÓS MODERNO. Uma determinada passagem deste ensaio me é particularmente cara por definir com precisão o significado da contra cultura que os Beatles representaram e ainda representam através de uma leitura pós moderna através do “efeito Nowhere Man”, diga-se de passagem uma de minhas canções prediletas dos Beatles:
“ As palavras “deixe-me de fora!” exprimem alienação -um tema central para os Beatles do começo do fim. As vozes narrativas de “Misery”, I call Your Name”, “You Can’t Do That, “I’m a Loser”, “I’m a Loser”, “I’m Down”, “Run for Your Life”, e “I’m Looking Throught You” pertencem a amantes alienados. As mulheres retratadas em “Eleanor Rigby”, “Lady Madonna” e “She’s Leaving Home” são amigas e parentes alienadas. As pessoas Em Paperback Writer, “A Day in the Life”, “Taxman” e “Piggies” são consumidores ou trabalhadores alienados. Cantar esse tema não é, em si, algo particularmente notável. Os grupos de rhythm’n’blues que deram origem ao rock e suas conseqüências já eram, de forma coletiva,uma cultura de reclamação nutrida e sustentada por um elenco de personagens que foram deixados de fora, ou se excluíram, de relacionamentos, famílias e da corrente principal da sociedade. A quantidade de variações é impressionante. A antologia “ deixe-me de fora” dos Beatles parece incluir todos os modos de alienação- incluindo aquele audível com clareza nas obras de Heidegger ( 1889-1976), Foucault ( 1926-1984) e várias gerações de seguidores dedicados à critica minuciosa do pensamento moderno e suas instituições. Ela é reproduzida de maneira simples e elegante na letra de “Nowhere Man”.
Segundo a explicação de Jonh, essa canção nasceu de sua frustração com seu próprio bloqueio criativo ( “Não me vinha nenhuma inspiração. Eu fiquei aborrecido e fui me deitar; tinha desistido., Então, pensei em mim mesmo como o “homem de lugar nenhum” [“nowhere man”]- sentado em sua “terra de ninguém” [“nowhere land”] ). Uma breve reflexão sobre o dilema que apresentei a pouco, no entanto, revela uma referência mais ampla. Se o pensamento moderno e todas suas instituições já são, em essência, revolucionários, se o mundo moderno é definido por uma série de crises e reformas, então, um critico minucioso- que seja absolutamente sério no que diz respeito à dissensão- não tem onde se colocar. Parta Heidegger, Foucault e espíritos semelhantes, o problema com a modernidade é que, como os borgs da série Jornada nas Estrelas: A Nova Geração, ela assimila toda oposição-ou, em termos mais técnicos- “totaliza” seus próprios valores e métodos. Sérios pensadores pós modernos, precisamente para ser sérios, devem reportar-se ao estado do mundo como se tivessem um status de refugiados em algum outro lugar-asilo, em um tipo de “nowhere land” filosófico.”

( James Crooks. Peguem uma canção triste e faça-a melhorar: Os Beatles e o pensamento pós moderno, in Os Beatles e a Filosofia: Nada que você pensa que não pode ser pensado/tradução de marcos Malvezzi. SP: Madras,2007 p.182-3 )