Publicado em 1765, o Prefácio a Shakespeare do crítico e dramaturgo Samuel Johnson ( 1709-1784), apesar de polêmico, permanece sendo uma referência para uma leitura e avaliação do universo literário Shakespeariano.
Com o declarado propósito de examinar sob a perspectiva do tempo as virtudes e os defeitos da obra do grande bardo, Johnson recusa o convencional caminho da apologia e afirmação fácil do inegável talento de Shakeapeare. Sua preocupação maior é com a afirmação de uma universalidade ética através da arte, com a qualidade moral de uma obra, coisa que ele deixa bem claro ao considerar as deficiências e limites do autor, que atribui em parte a rudeza do tempo e da sociedade para a qual escrevia e, em parte a displicência de sua escrita.
Independentemente de concordarmos com Johnson, sua critica ainda nos dias de hoje é incontornável. Seguem dois significativos fragmentos da comentada obra:
"A Inglaterra, à época de Shakespeare, ainda estava lutando para sair da barbárie. A filologia tinha sido transplantada para cá no reinado de Henrique VIII e as línguas eruditas haviam sido cultivadas com êxito por Lilly, Linacer e More; por Pole, Cheke e Gardiner e depois por Smith, Clerk, Haddon e Ascham. O grego era agora ensinado aos meninos nas principais escolas, e quem aliviava o requinte à instrução lia com grande empenho os poetas italianos e espanhóis. Mas a literatura ainda estava restrita aos eruditos notórios ou a homens e mulheres de alta posição. O povo era rude e ignorante, e saber ler e escrever era uma qualidade ainda valorizada Por sua escassez.”
( Samuel Johnson. Prefácio a Shakespeare/ tradução, estudo e notas de Enid Abreu Dobránszky, SP: Iluminuras LTDA, s/d, p.54)
“ Shakespeare, tanto quanto qualidades, possui defeitos, e defeitos suficientes para obscurecer e superar qualquer outro mérito. Eu os explorei conforme me vinha a mente, sem malícia invejosa ou veneração cega. Nenhum assunto pode ser discutido de maneira mais inofensiva do que as aspirações de um poeta morto à celebridade, e não merece atenção o fanatismo que eleva a inventividade acima da verdade.
Seu primeiro defeito é aquele a qual pode ser imputado a maioria dos males nos livros e nos homens. Ele sacrifica a virtude à conveniência, e sua preocupação em agradar é tão maior do que em instruir que ele parece escrever sem nenhum objetivo moral. De suas obras, sem dúvida, pode-se compor uma ordem de deveres sociais, pois quem raciocina com sensatez necessariamente pensa segundo princípios morais; mas seus preconceitos e axiomas brotam casualmente; ele não distribui com justiça o bem e o mal nem cuida de mostrar no virtuoso a censura ao perverso; conduz seus personagens sem nenhum outro cuidado, deixando seus exemplos agirem ao acaso. Esse defeito a barbárie da sua época não pode justificar, pois o dever de um escritor é sempre tornar o mundo melhor, e a justiça é uma virtude independente do tempo e do lugar.”
( Samuel Johnson. Prefácio a Shakespeare/ tradução, estudo e notas de Enid Abreu Dobránszky, SP: Iluminuras LTDA, s/d, p. 45)
Com o declarado propósito de examinar sob a perspectiva do tempo as virtudes e os defeitos da obra do grande bardo, Johnson recusa o convencional caminho da apologia e afirmação fácil do inegável talento de Shakeapeare. Sua preocupação maior é com a afirmação de uma universalidade ética através da arte, com a qualidade moral de uma obra, coisa que ele deixa bem claro ao considerar as deficiências e limites do autor, que atribui em parte a rudeza do tempo e da sociedade para a qual escrevia e, em parte a displicência de sua escrita.
Independentemente de concordarmos com Johnson, sua critica ainda nos dias de hoje é incontornável. Seguem dois significativos fragmentos da comentada obra:
"A Inglaterra, à época de Shakespeare, ainda estava lutando para sair da barbárie. A filologia tinha sido transplantada para cá no reinado de Henrique VIII e as línguas eruditas haviam sido cultivadas com êxito por Lilly, Linacer e More; por Pole, Cheke e Gardiner e depois por Smith, Clerk, Haddon e Ascham. O grego era agora ensinado aos meninos nas principais escolas, e quem aliviava o requinte à instrução lia com grande empenho os poetas italianos e espanhóis. Mas a literatura ainda estava restrita aos eruditos notórios ou a homens e mulheres de alta posição. O povo era rude e ignorante, e saber ler e escrever era uma qualidade ainda valorizada Por sua escassez.”
( Samuel Johnson. Prefácio a Shakespeare/ tradução, estudo e notas de Enid Abreu Dobránszky, SP: Iluminuras LTDA, s/d, p.54)
“ Shakespeare, tanto quanto qualidades, possui defeitos, e defeitos suficientes para obscurecer e superar qualquer outro mérito. Eu os explorei conforme me vinha a mente, sem malícia invejosa ou veneração cega. Nenhum assunto pode ser discutido de maneira mais inofensiva do que as aspirações de um poeta morto à celebridade, e não merece atenção o fanatismo que eleva a inventividade acima da verdade.
Seu primeiro defeito é aquele a qual pode ser imputado a maioria dos males nos livros e nos homens. Ele sacrifica a virtude à conveniência, e sua preocupação em agradar é tão maior do que em instruir que ele parece escrever sem nenhum objetivo moral. De suas obras, sem dúvida, pode-se compor uma ordem de deveres sociais, pois quem raciocina com sensatez necessariamente pensa segundo princípios morais; mas seus preconceitos e axiomas brotam casualmente; ele não distribui com justiça o bem e o mal nem cuida de mostrar no virtuoso a censura ao perverso; conduz seus personagens sem nenhum outro cuidado, deixando seus exemplos agirem ao acaso. Esse defeito a barbárie da sua época não pode justificar, pois o dever de um escritor é sempre tornar o mundo melhor, e a justiça é uma virtude independente do tempo e do lugar.”
( Samuel Johnson. Prefácio a Shakespeare/ tradução, estudo e notas de Enid Abreu Dobránszky, SP: Iluminuras LTDA, s/d, p. 45)