quarta-feira, 15 de setembro de 2010

Stephen Hawking e Star Trek


Uma das mais saborosas passagens do livro O Universo em uma casca de Noz de Stephen Hawking, compreende às especulações do autor, sobre as expectativas de futuro da humanidade, inspiradas por certa leitura do universo ficcional da série Jornada nas Estrelas. Tomo a liberdade de reproduzi-la parcialmente aqui:   
“O motivo da popularidade de Jornada nas estrelas á a visão segura e confortante do futuro. Também sou fã de Jornada nas estrelas, de modo que fui facilmente convencido a participar de um episódio em que joguei  pôquer com Newton, Einstein e o Comandante Data. Eu ganhei de todos eles, mas infelizmente um alerta vermelho me impediu de receber minha bolada.
Jornada nas estrelas mostra uma sociedade bem mais avançada do que a nossa em ciência,  tecnologia  e organização política. ( Esta  última não deve ser muito difícil.) Deve ter havido grandes mudanças, além das tensões e transtornos que as acompanham, desde os dias de hoje até essa época, nesse futuro, porém, espera-se que a ciência, a tecnologia e a organização da sociedade tenham atingido um nível quase de perfeição.
Quero questionar esse quadro e perguntar se chegaremos a atingir um estado estacionário final em ciência e tecnologia. Em nenhuma época, durante aproximadamente dez mil anos desde a última Era Gracial, a raça humana vivenciou um estado de conhecimento constante e tecnologia fixa. Houve alguns retrocessos, como a Idade das Trevas, após a queda do Império Romano. Mas a população mundial, que é um indicador de nossa capacidade tecnológica de preservar a vida e nos alimentar, tem crescido constantemente, com apenas alguns contratempos como a Peste Negra.
Nos últimos 200 anos, o crescimento populacional tornou-se exponencial; ou seja, a população cresceu a uma mesma porcentagem a cada ano. Atualmente, a taxa é de cerca de 1,9 por cento ao ano. Isso pode parecer pouco, mas significa que a população mundial dobra a cada 40 anos.
Outros indicadores do progresso tecnológico nos últimos anos são o consumo de eletricidade e o numero de artigos científicos. Eles também mostram um crescimento exponencial, dobrando em menos de 40 anos. Não há sinal de que os progressos  cientifico e tecnológico diminuirão e pararão em um futuro próximo- certamente não na época de Jornada nas estrelas, que deve existir em um futuro não muito distante. Mas se o aumento da população e do consumo de eletricidade continuarem no ritmo atual, em 2600 as pessoas ficarão ombro a ombro, e o consumo de eletricidade deixará a Terra incandescente.
Se você dispusesse todos os novos livros um ao lado do outro à medida que fossem sendo publicados, teria de correr a 145 quilômetros por hora  apenas para acompanhar o fim da fila. Claro que, em 2600, as novas  obras artísticas e cientificas virão em formas eletrônicas, e não como livros e artigos físicos. Contudo, se o crescimento exponencial prosseguisse, surgiriam dez artigos  por segundo no meu ramo da física teórica, e não haveria tempo para lê-los.
Evidentemente o atual crescimento exponencial não pode durar para sempre. Então o que acontecerá?  Uma possibilidade é nos exterminarmos completamente por algum desastre, como uma guerra nuclear. Os pessimistas dizem que o motivo por que não fomos contatados por extraterrestres é que, quando uma civilização atinge o nosso estágio de desenvolvimento, torna-se instável e destrói a si mesma. Contudo, sou um otimista. Não acredito que a raça humana tenha chegado tão longe simplesmente para se extinguir  justo quando as coisas estão se tornando interessantes.  
A visão do futuro de Jornada nas estrelas- de que atingiremos um nível avançado, mas essencialmente estático- pode concretizar-se quanto ao nosso conhecimento das leis básicas que governam o universo.  Como descreverei no próximo capitulo, pode haver uma  teoria final que descobriremos naquele futuro não muito distante . Essa teoria final, se existir, determinará se o sonho da propulsão de dobra de Jornada nas estrelas poderá se concretizar. De acordo com as idéias atuais, teremos de explorar a galáxia de maneira lenta e tediosa, em espaçonaves viajando mais lentamente que a luz. Mas, por não dispormos ainda de uma teoria unificada completa, não podemos descartar a propulsão de dobra.
Por outro lado, já conhecemos as leis válidas em todas as situações, exceto nas mais extremas: as leis  que governam s tripulação da Enterprise, se não a própria espaçonave. Mas não parece que chegaremos a atingir um estado estacionário nas aplicações dessas leis ou na complexidade dos sistemas que podemos produzir com elas.”
 (Stephen Hawking. O Universo numa Casca de Noz/ tradução de Ivo Korytowski, SP: Arx., 2001; p.157 et seq. )

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