quarta-feira, 22 de outubro de 2008

BARUCH ESPINOSA E A RADICALIDADE DA RAZÃO


“Os supersticiosos, que sabem mais censurar os vícios que ensinar as virtudes e que não procuram conduzir os homens pela Razão mas contê-los pelo medo de tal maneira que evitem mais o mal que amem as virtudes, não pretendem outra coisas que tornar os outros tão infelizes como eles; e, por conseguinte, não é de admirar que eles sejam, a maior parte das vezes, insuportáveis e odiosos aos homens.”


Baruch Espinosa in Ética- Parte IV- Da servidão Humana ou Das forças das afecções
Excomungado em 1656 pela comunidade judaica de Amsterdan, Baruch Espinosa está entre as grandes referências filosóficas da modernidade.
Combatendo o “irracionalismo” e o “obscurantismo” de seus contemporâneos produziu obras originais como o Tratado da correção do Intelecto, o Tratado Teológico Político e uma Ética cujo conteúdo constitui um radical questionamento as representações do Estado e a Religião hegemônicas no século XVII.
Sua filosofia pode ser muito sumariamente definida como uma critica a escolástica então decadente, tanto quanto a filosofia de Decartes, assentada na formulação e aplicação de dois métodos: O histórico/critico, que destinou a uma leitura racional e secular da Bíblia, e o genético, segundo o qual, o conhecimento de determinada coisa é o conhecimento de suas causas, premissa por exemplo de seu Tratado da Correção do Intelecto.
Espinosa em seu racionalismo radical acreditava que a verdade é imanente ao próprio conhecimento, não condicionando-se a qualquer adequação entre a idéia e a coisa dado que uma coisa só pode ser conhecida através da causa que a produz e não pelos seus efeitos.
É esse primado do intelecto e da razão, a ênfase na “auto-produção” do real que desafia a tese em sua época em voga da criação das coisas por Deus que constitui um dos mais interessantes legados da sua filosofia.

Reproduzo em seguida uma pequena e significativa epistola do autor escrita erm Rijnsburg em março de 1663:

Ao jovem mui sábio Simon de Vries
“Caro amigo,

Tu me perguntas se precisamos da experiência para saber se a definição de um atributo é verdadeira. Respondo que nunca precisamos da experiência, a não ser para aquilo que não podemos concluir da definição da coisa. Como, por exemplo, a existência dos modos, pois esta não podemos concluir da definição da coisa.Mas nunca precisamos da experiência para aquelas coisas cuja existência não se distingue da essência e que, portanto, se conclui de sua definição. Mais ainda, nenhuma experiência pode ensinar-nos isto, pois a experiência nunca nos ensina a essência das coisas- o máximo que pode fazer é determinar nossa mente a pensar apenas acerca de certas essências das coisas. E assim como a existência dos atributos não difere de sua essência, nenhuma experiência poderá fazer com que a aprendamos.
Perguntas, ainda, se as coisas reais e suas afecções são verdades eternas. Digo que o são sob todos os aspectos. Se retrucares: por que, então, não as chamas de verdades eternas? Respondo: para distingui-las, como todos costumam fazê-lo, daquelas que não explicam coisas e afecções das coisas, como por exemplo, “nada vem do nada”. Tais proposições, e outras semelhantes, são chamadas verdades eternas num sentido absoluto, e com isto o que se quer dizer é que só tem morada no intelecto.”
Baruch de Espinosa

(Benedictus de Espinosa. Os Pensadores/ seleção de textos de Marilena de Souza Chauí; tradução de Marilena de Souza Chauí... (et al.). SP: Editora Abril Cultural, 1983, p. 372)

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