segunda-feira, 5 de maio de 2008

OS LIMITES DA SOCIEDADE E OS DIREITOS DO INDIVIDUO

“Os seres Humanos devem uns aos outros ajuda para distinguir o melhor do pior, e encorajamento para escolher o primeiro e evitar o ultimo.
Eles devem estar para sempre estimulando um aos outros para um mesmo exercício cada vez maior de suas mais elevadas faculdades, e uma direção cada vez maior de seus sentimentos e metas em direção ao sábio ao invés do tolo, elevando ao invés de degradar, objetos e contemplações.
Mas nem uma pessoa, nem qualquer numero de pessoas, tem permissão de dizer a outro ser humano de idade madura, que ele não deve fazer com sua vida para seu próprio benefício aquilo que escolhe fazer com ela.
Ela é a pessoa mais interessada em seu próprio bem estar: o interesse que qualquer outra pessoa, exceto em casos de forte relação pessoal, possa ter nele, é superficial, comparado com aquele próprio que tem; o interesse que a sociedade tem nele individualmente ( exceto em relação a sua conduta com os outros) é fracional, e completamente indireto: com respeito a seus próprios sentimentos e circunstâncias, o homem ou mulher mais comum possui meios de conhecimento que imensuravelmente excedem aqueles que possam ser possuídos por qualquer outra pessoa.”

John Stuard Mill. On Liberty/ Ensaios sobre a Liberdade. Tradução: Rita de Cássia Gondim Neiva. SP: Editora Escala, s/d, p.109.

Este primeiro fim de semana de maio foi consagrado em várias cidades da Europa e da América a manifestações globais a favor da descriminalização da maconha, tradição iniciada faz alguns anos em New York. Longe de uma apologia inócua e infantil ao uso de drogas ilícitas, tal iniciativa, obscuramente reprimida pela miopia das autoridades institucionais locais, entre as quais o caso grego tornou-se um exemplo emblemático, constituíram um esforço simbólico no sentido da redefinição do espaço público e do lugar do individuo na sociedade através de uma nova concepção de privacidade.
O que esta em jogo, no final das contas, é nossa preciosa liberdade individual e a garantia da diversidade ou pluralidade de opções contemporâneas frente ao unilateralísmo de estruturas jurídicas e institucionais fundamentadas na inércia de um arcaico “bem comum” construído pelos “nacionalismos republicanos” e identidades coletivas caducas fundadas, em ultima instância, sob idealizações de um modelo familiar partriacal ou tradicional. Tais referências já não são hoje compatíveis com as culturas da contemporaneidade e as novas realidades societárias que elas ensejam em um mundo cada vez mais marcado pelo hibridismo cultural e pela imprecisão identidária. Podemos viver com o risco de sermos nós mesmos no alem das tutelas coletivas, aprender com nossas incertezas na aventura do futuro. Isso nos difere dos opositores a comentada iniciativa ...
Não é exagero dizer que a luta pela descriminalização da maconha aproxima-se da luta pela descriminalização do aborto ou pelo reconhecimento legal da união homossexual como expressão radical e contemporânea da liberdade individual frente à opacidade autoritária e massificada de uma imagem defasada de sociedade e identidade coletiva que hoje em dia desafia cada vez mais a dinâmica da vida e existência contemporânea.
Não se trata, portanto, em um ou outro caso, de uma manifestação particularista de gays, lésbicas, promíscuos e maconheiros contra os pseudo-sagrados valores da sociedade judaico/cristã estabelecida, mas de uma afirmação do livre direito de cada individuo decidir por si mesmo suas opções e destinos no além das imposições coletivas.
Em poucas palavras, frente ao individuo, a sociedade também tem seus limites; e conviverá com crimes e aberrações infinitas na medida em que nega a pertinência do caminho próprio de cada um e, diga-se de passagem, a decorrente responsabilidade e desafios inerentes ao exercício da subjetividade .
Mesmo sendo atualmente muito conservador em minha vida privada, não posso ficar indiferente a esse grito de liberdade que a marcha pela maconha representa em sociedades que projetam sua própria sombra em seus clássicos estereótipos dos “excluídos culturais” ou pseudo-marginais, do que assumir seus próprios limites e abrir-se a discussões e duvidas tão elementares sobre os rumo das coisas de todos os dias.


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